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Quinta da Lapa – Na terra de Pina Manique, com bons vinhos

Texto José Silva

Tem quase 300 anos esta propriedade ribatejana e diz-se que por ali poderá ter passado Pina Manique. Foi comprada pelo empresário Canas da Costa e foi um amor à primeira vista para a sua filha Sílvia, arquitecta de profissão. Para além da recuperação impecável da casa senhorial, onde agora funciona um belíssimo turismo rural com 11 suites, Sílvia apaixonou-se completamente pelas vinhas.

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Casa Senhorial – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

E assim nasceu um projecto vitivinícola de sucesso, com a contratação do enólogo Jaime Quendera e a sua enorme experiência. São vinhas que têm entre 15 e 25 anos, com algumas castas autóctones mas também de outra regiões e mesmo estrangeiras, que ali encontraram solos e clima a que se adaptaram muito bem: arinto, tamarez, trincadeira das pratas, tincadeira preta, touriga nacional, tinta roriz, merlot, syrah, cabernet sauvignon e alicante bouschet.

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As vinhas – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Graças aos solos predominantemente argilo-calcários, mas onde a influência das águas do rio Tejo, nas suas ancestrais cheias em que invadia as margens, é enorme, estes vinhos adquirem não só acidez mas até alguma mineralidade que os torna também apetecíveis. No turismo rural fazem-se também eventos, onde se bebem os vinhos da casa e onde são servidas refeições confeccionadas na enorme e bem equipada cozinha, ou então preparadas por um amigo da casa, o sr. Afolfo Henriques, o conhecido homem da aldeia da Maçussa.

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Uma das suites – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

As 11 suites são todas diferentes, algumas delas a recuperação de espaços já existentes e com muitas peças de mobiliário que foi também recuperado, de grande beleza. O edifício central, de forma quadrada, encerra um enorme terreiro, com árvores frondosas, de belo efeito. À volta da casa estão as vinhas e algum olival, a moldar a paisagem de toda a quinta. No conjunto de edifícios da quinta está a adega, pequena, simples mas bem equipada, incluindo a sala de barricas, fundamentais para estagiar alguns dos tintos que tanto apreciamos.

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A sala das barricas – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Desta vez foi uma refeição que culminou a apresentação das novas colheitas da Quinta da Lapa. Em primeiro lugar o pão, da Maçussa, que o próprio Adolfo Henriques coze, estaladiço por fora, fofo por dentro, a rescender, saboroso, irresistível. Depois alguns petiscos: melão com presunto, apaladado e fresco, ovas de bacalhau com tomate seco, requintado, salmão fumado, aveludado e de paladar sofisticado e, claro, o queijo chèvre da Maçussa, nas versões ao natural e panado com rúcula e compota. Uma maravilha.

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Melão com presunto – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Salmão fumado – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Chèvre Cheese – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

O prato principal foi um delicioso cabrito assado no forno, com arroz de cogumelos e batatinha assada e, à parte, uma simples mas soberba salada de alface e cebola roxa.

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Cabrito assado – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Salada – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Terminou-se com um bolo de chocolate em boa companhia, uma gulodice pegada.

E provaram-se as novas colheitas da Lapa, a começar pelo espumante Quinta da Lapa Bruto Natural preparado só com Arinto, com muita frescura e elegância, acidez sempre bem presente, um belo espumante.

O Quinta da Lapa Branco Reserva 2014, feito com Arinto e Tamarez, é muito fresco no nariz, com algumas notas tropicais mas também cítricas e uma boca cheia de frescura e acidez equilibrada.

Há vários vinhos mono casta, a começar pelo Quinta da Lapa Touriga Nacional 2012, casta que se adaptou francamente bem ali, com muita intensidade aromática, floral e elegante. Na boca é persistente, intenso, com muito boa fruta, óptima acidez e final prolongado.

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Quinta da Lapa Bruto Natural – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Quinta da Lapa Reserva branco 2014 – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Quinta da Lapa Touriga Nacional 2012 – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

O Quinta da Lapa Merlot 2013 apresenta-se autoritário, fugoso, frutos pretos bem maduros e algumas notas de chocolate, com belo volume, taninos bem casados e acidez intensa, um conjunto muito equilibrado.

O Quinta da Lapa Syrah Reserva 2012 apresenta aromas de frutos pretos e algumas especiarias, complexo, intenso. Na boca tem grande volume, é poderoso mas ao mesmo tempo equilibrado, com taninos sedosos e um belo final.

Finalmente o Quinta da Lapa Cabernet Reserva 2012, com aromas complexos de frutos selvagens, plantas do monte, algumas notas vegetais e especiarias com muita elegância. Na boca aparecem frutos pretos muito maduros, uma óptima acidez, taninos bem domados, muito complexo e intenso.

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Quinta da Lapa Merlot 2013 – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Quinta da Lapa Syrah Reserva 2012 – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Quinta da Lapa Cabernet Reserva 2012 – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

O Quinta da Lapa Reserva 2011, talvez o mais complexo de todos, tem aromas de fruta muito madura, especiarias, notas de fumo e chocolate. Na boca é bastante harmonioso, persistente, sedoso, com final longo, um vinho cheio de finesse. Vieram então os dois vinhos especiais desta casa ribatejana.

O Quinta da Lapa Nana Reserva 2011 é uma sentida homenagem da produtora à sua mãe. Apresenta-se com muita fruta, algumas notas de especiarias, muito fresco. Na boca é muito elegante, persistente, aveludado, com fragrâncias de frutos vermelhos e algum floral e final longo e seguro.

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Quinta da Lapa Reserva 2011 – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Quinta da Lapa Nana Reserva 2011 – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Quinta da Lapa Reserva 2013 Homenagem 500 anos Santa Teresa d’Ávila – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Finalmente o Quinta da Lapa Reserva 2013 Homenagem 500 anos Santa Teresa d’Ávila – um vinho de comemoração, cheio de fruta e especiarias no nariz, muito elegante, altivo. Intenso e equilibrado na boca, simples mas ao mesmo tempo autoritário, um vinho especial, de homenagem a Teresa de Ahumada, e cujo poema de fé se encontra eternizado numa lápide existente na Quinta da Lapa:

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Lápide – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

“Nada te perturbe, nada te espante,
tudo passa, Deus não muda.
A paciência tudo alcança.
Quem a Deus tem, nada lhe falta.
Só Deus basta.”

Do Ribatejo, com carinho…

Contactos
Agrovia, Sociedade Agro-Pecuária, SA
Quinta da Lapa
2065 – 360 Manique do Intendente
Tel: (+351) 263 486 214
Mobile: (+351) 917 584 256
Email: geral@quintadalapa-wines.com
Website: www.quintadalapa-wines.com

Ao sabor da história: Frasqueira Soares Franco

Texto João Pedro de Carvalho

Nas aventuras e desventuras de um enófilo há momentos que marcam de certa forma o nosso percurso, a origem é quase sempre um ou vários vinhos inesquecíveis. Não haverá nada mais empolgante que literalmente dar de caras com uma preciosidade e desbravar caminho até descobrir a sua história. Foi isso que aconteceu com dois exemplares raríssimos pertencentes à Frasqueira de António Porto Soares Franco, cujos vinhos fazem parte do espólio familiar da família Soares Franco localizado no quartel general da José Maria da Fonseca mais propriamente na Adega dos Teares Velhos. Recuamos ao tempo de António Porto Soares Franco, que era na altura sócio da Companhia de Aguardentes da Madeira, as ligações à ilha abriram muitas portas e oportunidades de negócio, é aqui que entra o nome Abudarham. Consultando o livro “Madeira: The islands and their wines by Richard Mayson”, ficamos a saber que José Abudarham tinha dupla nacionalidade, Inglês e Francês, e que chegou à Madeira na primeira metade do séc. XIX. Ali se estabeleceu no negócio do vinho, com acesso ao que de melhor se produzia na altura, mas também do empréstimo de dinheiro, que mais tarde iria dar origem à Companhia de Seguros Aliança Madeirense. O seu negócio do vinho era centrado em vinho engarrafado, vendido essencialmente para França e Alemanha, após a sua morte em 1869 a firma passou a chamar-se Viúva Abudarham & Filhos acabando por na passada do tempo ser vendida à Madeira Wine Association que é hoje a Madeira Wine Company. Sabendo a origem e o seu comerciante, restava apenas reparar nos detalhes que a pequena fita colada à garrafa tinha, a tinta permanente que já mal se vislumbrara no rótulo surgia ténue e a indicar 1795. Após alguma pesquisa e cruzamento de dados chega-se à conclusão que o vinho em causa é um Terrantez 1795 do qual há vários de garrafas que foram a leilão. A rolha saiu à força das lâminas, intacta e com a marca José Maria da Fonseca, sinal de que as rolhas são mudadas de x em x anos, o que foi confirmado pelo próprio produtor.

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Adega dos Teares Velhos – Foto Cedida por José Maria da Fonseca | Todos os Direitos Reservados

A segunda garrafa conta uma história diferente e que nos remete para o Vinho do Porto, também ostenta o nome Frasqueira Soares Franco cujo rótulo apenas mostra R.M 187X. Dada a idade das duas garrafas o tempo encarregou-se de comer grande parte dos rótulos e com eles a sua preciosa informação, no Madeira salvou-se a data numa fita de papel e neste Vinho do Porto ainda lhe resta algo de contra rótulo. Confirma-se posteriormente que as iniciais remetem para Ramiro Magalhães, um antigo comerciante de Vinho do Porto que morava no Bombarral. Ramiro Magalhães foi homem importante na sua terra, grande negociante de vinhos que para o seu tempo teria sido dos primeiros a ter automóvel e motorista. No contra rótulo consegue-se vislumbrar que o número que falta ficando o ano completo deste Vintage de 1878, o último ano pré filoxera. Neste caso não haverá muito mais a dizer, a informação restante apenas nos remete para o ano em causa que foi considerado ano clássico de Vintage.

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Um dos vinhos provados – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

Frasqueira Soares Franco – Abudarham – Terrantez 1795: É impressionante a capacidade que este vinho tem em perfumar toda uma sala. Mal cai no copo ficamos hipnotizados pelas tonalidades que brilham no copo, um vinho com 221 anos a mostrar a razão pela qual mesmo depois de todos os vinhos servidos ao jantar, chega o Madeira e é o rei da festa. Neste caso o vinho é arrebatador e inesquecível, antes de tudo um ligeiro pico de volátil para depois ir conquistando com um tom morno e aconchegante de caramelo, baunilha, toffee, que nos preparam para o embate seguinte, uma enorme frescura. É essa mesma frescura que nos domina e deixa de mãos presas ao copo, um uau sai de imediato, é tipo aquelas montanhas russas que quando acaba queremos repetir. Aqui é igual, um vai e vem de sensações, aromas presos no tempo vão saltando do copo, fica a sensação de ligeira untuosidade carregado de frescura, no fundo algo que recorda o cheiro de cinzas de charuto. No palato é outra luta, uma conquista que nos prende com caramelo e açúcar queimado, arredonda ligeiramente num ponto que quase se trinca para depois disparar numa espiral louca de acidez com ligeiro amargo no final de boca. Inesquecível.

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Frasqueira Soares Franco – Abudarham – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

Blend-All-About-Wine- At the flavour of history Frasqueira Soares Franco-Vinho do Porto

Frasqueira Soares Franco – Ramiro Magalhães – Vintage 1878 – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

Frasqueira Soares Franco – Ramiro Magalhães – Vintage 1878: Um Vintage com 138 anos de vida, sim disse vida porque apesar de a tonalidade lembrar um tawny velho é notável a frescura e a definição aromática. Muito preciso e delicado, enorme elegância com aromas a fazer lembrar tabaco doce, especiarias finas, casca de laranja cristalizada, fruta em passa com tâmaras, conjunto acolhedor e ligeiramente untuoso. No palato entra guloso, untuoso e com bom volume de boca, ligeiro vinagrinho, é quase como um berlinde doce e fresco que se vai desfazendo no palato até que apenas resta um fino e prolongado final de boca. Majestoso.

Snob do vinho

Texto João Barbosa

Quem é chato é chato! Quem quer ser chato consegue ser chato. Provavelmente, ser-se chato é das poucas coisas em que não é necessário ter-se um estudo adequado, educação familiar ou genes. O talento em se ser chato não implica ter talento.

Já ser-se snob é diferente! Se o chato é um especialista, o snob é um chato com doutoramento. Um snob pode levar horas a perorar acerca dos matizes dos fígados dos pescados, da evolução da estética das jantes dos Maserati ou da importância do verde na cultura islâmica. Para um snob, as Variações de Goldberg por Glenn Gould são corriqueiras.

Acima de tudo… ou abaixo de tudo… um snob é um arrogante. Nenhum cavalheiro amesquinha ou se vangloria. Por isso, é alguém sem nobreza – sine nobilitate, expressão latina donde surgiu o vocábulo inglês.

Isto porque no vinho há chatos e snobes… os chatos são divertidos nas tabernas e os snobes insuportáveis nos salões. Sem escândalo mudamos de lugar na taberna ou fugimos, já a etiqueta impede tais movimentos em ambientes mais formais.

Parece simples, mas vou complicar. Penso que ninguém tem o direito de impor os seus gostos e conceitos. Porém, as diferenças entre as pessoas podem ser grandes e a ruptura torna-se inevitável. Nem outros têm de achar que a touriga franca é a melhor do mundo, como não sou obrigado a gostar de antão vaz.

Há uns dias provei vinhos com pessoas de diferentes nacionalidades e percebemos que, além das banalidades que estabelecem os padrões de qualidade, nada fazia convergir narizes e bocas. O problema não estava no reconhecimento da qualidade ou da sua falta, mas da divergência nos atributos que distanciam um vinho bem feito doutro bom ou de um excelente.

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A provar Rosé in fm.cnbc.com

Um rosado deve ser doce? Um rosado deve ser doce e sem acidez? Um rosado deve ter sobretudo acidez? Podem parecer questões tolas, mas o assunto colocou-se. Nem sou dono da razão nem os oponentes são tolos ou desconhecedores. Eram pessoas habituadas a provar e justificavam as afirmações.´

Temos, os portugueses, a mania de elogiar os nossos vinhos, porque acompanham bem a comida, porque têm acidez. Isso é uma vantagem? Dizemos que sim… e se quisermos ficar só na conversa e sem um amanhã para os mandar para a cama, vamos insistir na obrigatoriedade da acidez? Porém, um xarope é feliz na amenização dum diálogo?

Temos, os portugueses, a mania de elogiar muito o carácter frutado dos nossos vinhos… mas… é uma vantagem? Sinceramente, frequentemente a fruta cansa-me e se é para saber a fruta, então que bebo sumo – dá-me vontade de gritar.

O meu citado debate não se ficou pelos rosés. Esse episódio tornou-se apenas na melhor ilustração do que o berço, latitude, longitude e cultura (sentido étnico) se podem traduzir. Mas posso acrescentar com informação vinda doutra conversa.

Quando valorizamos ou penalizamos um vinho pela cor estamos a ser justos ou correctos? Vou contornar tintos e brancos… um rosado é melhor ou pior se for cor-de-rosa, salmão ou alaranjado? É importante a cor ou não? Ou o vinho dá prazer através dos sentidos do olfacto e do paladar e apenas gostamos de acrescentar aspectos que não estão ligados?

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Cores do Rosé in characterspub.com

Até ouvi dizer, mais do que uma vez, que o vinho é fantástico, porque agrada a todos os sentidos. Olfacto? Certo! Paladar? Certo! Tacto? Sim, na boca mostra rugosidade e macieza… Visão? Tem cor, vê-se se tem bom aspecto. Audição?… Ouve-se o saltar da rolha.

Juro! Ouvi essa proeza mais do que uma vez. Tenho a declarar que nem caibo em mim de feliz e contente quando oiço o som duma rolha a sair da garrafa… sou eu com a rolha e o cão de Pavlov com a sineta! Francamente! E a cor? Sinceramente, só me interessa enquanto servir para indicar a saúde do vinho. Debater tons de cor é tão útil como saber de cor as referências Pantone.

Ah! A cor dos pinot noir… de quais? Da Borgonha ou do Tejo? O vinho é para o nariz e para a boca! Penso que debater a cor do vinho – excluo a avaliação visual que permite saber da sanidade – é como discutir tons de pele.

Não tenho conhecimento nem pachorra para debater as diferenças ou variações das castas conforme a sua localização. Nem para certezas acerca da imutabilidade das características dos vinhos de cada região. O chato sabe tudo, incluindo aquilo que não sabe. O snob sabe e pensa que sabe tudo ou, pelo menos, mais do que os outros.

No final só me basta um resultado: prazer. Ou tive ou não. Felizmente, as conversas citadas não foram com chatos nem snobes. O que poderia ter sido um pesadelo foi aprendizagem. A verdade não muda, mas porque os pontos de vista variam o conhecimento é diverso.

Continuo sem gostar de rosados doces sem acidez. Porém, agora sei que se comparado com um refrigerante açucarado esse vinho pode ser fantástico.

PS: Snob era eu antigamente, agora sou apenas chato!

Arundel, pelas terras de Pavia com Joaquim Arnaud

Texto João Pedro de Carvalho

Joaquim Arnaud, é um nome que existe desde 1883 e que tem vindo por tradição, a passar de geração em geração. É descendente de uma família Alentejana, de Pavia, ligada à Terra, e aí documentada desde 1515. A referida família, desde sempre se dedicou, ao montado, olival, vinha, cultivo de cereais e criação de gado (porcos, vacas, ovelhas e cavalar). As suas herdades situam-se nos concelhos de Mora e Arraiolos, distrito de Évora. Em 2010, como forma de potenciar estes recursos, Joaquim Arnaud, decide criar a sua marca personalizada, à qual atribui o seu próprio nome. O seu objectivo de negócio, assenta em apresentar ao mercado produtos seleccionados e de pequenas tiragens, em que se conjuga o artesanal com o sofisticado. É desta maneira que se apresenta o produtor Joaquim Arnaud, os vinhos que cria na sua adega falam por si, numa prova onde apenas me centrei nos exemplares oriundos do Alentejo, mais propriamente de Pavia.

Os seus vinhos exprimem uma vontade e um ideal, são ao seu gosto o que o levou a afastar-se do crivo da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana. Desta maneira não se sente apertado nem julgado, cria de forma livre os seus vinhos oriundos do terroir de Pavia. A sua gama de vinhos tem vindo a ser ampliada, nota-se que por ali não há pressa de lançar novidades nem novas colheitas, os vinhos apenas são dados a conhecer quando Joaquim Arnaud entende que é o momento. Por isso mesmo durante a prova oscilamos entre a força da juventude e os exemplares com os taninos já educados. Dos cinco vinhos apresentados decidi separar em três grupos:

Arundel Young 2013 e Arundel Petit 2012 são o exemplo da juventude e da força da fruta, ambos com aquela dose de austeridade a conferir muito boa energia ao conjunto. Ambos partilham o mesmo lote composto por Aragonez, Syrah, Trincadeira e Alicante Bouschet sendo que depois apenas varia o estágio em barrica, sendo de 6 meses para o Young e de 9 meses para o Petit. Vinho de perfil carnudo, denso, Alentejo bem presente com bouquet de qualidade a apresentar notas ameixa, amoras, especiarias, compota, boa frescura e pureza de aromas num conjunto que conquista e arrebata facilmente ao primeiro contacto. Vinhos que pedem comida por perto, carnes grelhadas são no momento o par ideal.

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Os Vinhos – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

Mais recentes são as edições resultantes da parceria com a Trienal do Alentejo, a primeira edição é o Arundel 36 2009 que resulta de um vinho que ficou literalmente esquecido na adega, muito pouca quantidade da qual apenas resultaram cerca de 500 garrafas e cujo estágio total foi de 36 meses. Conjunto sério que mostra um misto de fruta doce com notas de mirtilo vermelho com morango e amoras, tudo fresco, perfume floral ligeiro com especiaria de fundo. Grande harmonia de conjunto, com uma boa passagem de boca, aqui num perfil mais aberto e menos concentrado mas a vincar todo o palato com sabores de fruta e especiarias. Termina amplo com ligeira secura na faceta gastronómica que é apanágio desta casa.

A segunda edição dá por nome de Arundel T&T 2012 de lote com base nas castas dos dois vinhos anteriores, apenas o estágio passa para 12 meses de barrica. O T&T para os mais curiosos são as iniciais da Trienal e da Terranagro (empresa produtora dos vinhos de Joaquim Arnaud). Mais um exemplar que conjuga finesse, frescura com a fruta neste caso menos presente dando lugar a um lado mais floral e especiado. A fruta vermelha e ácida, em tons de framboesas e mirtilos, surgem em segundo plano ao lado de um ligeiro terroso/grafite. Boca cheia de sabor, ligeira secura no fundo, muito cacau, folha de tabaco e fruta.

O culminar é o Arundel Great 2008, 400 garrafas com direito a um estágio de 12 meses em barricas mais 24 meses em garrafas num lote 100% Alicante Bouschet. Um tinto arrebatador ao primeiro contacto tal a finesse e lascividade com que se mostra. Pura classe, muita harmonia num vinho adulto e pronto a dar prazer, muito perfumado com a fruta sumarenta e fresca, inserida num bouquet de enorme qualidade onde tudo se mostra bem definido, nada beliscado pelo tempo apenas a mostrar que tem sabido evoluir para o melhor dos lados. Tal como todos os vinhos do produtor mostra um carácter bem Alentejano, a pedir mesa por perto, brilhando muito alto com umas perdizes albardadas.

Vinho Português – Moda ou Justiça?

Texto João Barbosa

Não parece haver dia em que não surja uma notícia positiva para a gastronomia portuguesa, seja referente a comida ou a vinho – sobretudo à bebida. Perante tal, como me devo sentir como português? Não sei e a razão é porque desconheço se tal acontece por moda ou justiça.

Quem lê dirá:

– Como não sabe? Tem obrigação de saber. Se escreve sobre vinho, tem de saber, obrigatoriamente.

É verdade! Mas há sempre um erro de paralaxe, resultado dos afectos e da memória. A subjectividade que dita que a comida da mãe seja a melhor do mundo ou que a selecção portuguesa mereça, logo desde o primeiro jogo, ganhar o campeonato de futebol.

Não sou um fanático, mas tenho em Portugal as raízes. É claro que penso que o destaque que o país está a ter na gastronomia tem mais de justiça do que de moda. Há certamente erro de avaliação, embora espero que reduzido.

Estar na moda é bom! Ajuda ao ânimo, puxa auto-estima para cima, dá notoriedade. Contudo, é passageira. Se alguma coisa está sempre na moda é porque não se trata de moda, mas de qualidade em abundância.

A moda é conjuntural e a qualidade estrutural. Por isso, quem está bafejado pelo reconhecimento só tem de insistir na procura da qualidade e na diferenciação. Desse modo irá ganhar valor.

É por isso que não gosto da sentença de que algo tem uma boa relação entre o preço e a qualidade. Não vejo que tal seja elogioso, embora a generalidade das pessoas considere que significa boa oportunidade ou justiça.

Pagar um hectolitro com dez cêntimos é uma boa relação entre a qualidade e o preço? É! É porque, independentemente da qualidade, quem conseguir aproveitar vai ganhar dinheiro. Mas isso não significa que o vinho tenha qualidade… claro que não, mas o postulado não é esse, mas o de um suposto equilíbrio entre uma coisa e outra.

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Wine in tasteportugal-london.com

Quero que o vinho português ganhe a reputação do francês ou do italiano – só para citar dois casos. Produzir bem está ao alcance de quem se empenhe e barato de quem consegue trabalhadores aflitos.

Obviamente que caro não significa qualidade. Acresce que ninguém gosta de se sentir estúpido, pelo que pagar 50 euros por 0,75 litro de zurrapa será episódio único. A justiça está no ponto em que um produto é vendido a preço idêntico ao de outro com qualidade comparável.

Ter uma «boa relação entre a qualidade e o preço» pode ajudar no início e aliviar a pressão sobre a tesouraria. A médio prazo torna-se injusta. Se ainda não convenci o leitor, penso ter o argumento derradeiro:

Portugal factura mais com hortofrutícolas do que com vinho. Isto significa que o valor-acrescentado não é pago com justiça. Generalizando e partindo do princípio que o custo da terra é comparável e que os factores de produção estão equiparáveis, mais vale fazer couves do que vinho. Não há encargos com enologia nem com armazenamento mais longo e empate de capital é muito menor.

Voltando ao início, o vinho português tem sido reconhecido e de modo variado. De todas as notícias, valorizo aquelas que não versam o factor preço. Reporto-me às avaliações da crítica, com pontuação qualitativa apenas, ou a vitórias em concursos de prestígio.

Dir-se-á que os grandes vinhos, aqueles que custam quase o mesmo que um pequeno automóvel citadino, não vão a concurso, pelo que as vitórias são relativas. Claro, quem tem a perder não vai a jogo. Compete a quem chega mostrar merecimento. Os jovens cavaleiros desafiam os grandes senhores.

Diz-se que «quem canta, seus males espanta», mas a música tem sido madrasta para os portugueses. Em 48 edições do Eurofestival da Canção, em que Portugal falhou apenas quatro edições, nunca músicos portugueses conseguiram ir além do sexto lugar – Lúcia Moniz, em 1996, com «O meu coração não tem cor».

A culpa foi da ditadura, mas a jovem democracia não foi premiada. Porque Portugal compra poucos programas de televisão, mas outros pequenos países compram o mesmo e venceram. Porque a língua portuguesa é difícil, mas o Brasil é uma superpotência musical… quase qualquer coisa serve para justificar os desaires.

Enquanto a música portuguesa não ganha o Eurofestival da Canção e a literatura lusófona não alcança o mais do que justo segundo Prémio Nobel, o vinho vai dando alento, consolando mágoas.

Que venha o reconhecimento duradoiro. E estou quase certo que, quando os vitivinicultores portugueses conseguirem solidificar a reputação, a gastronomia de comer (já vão surgindo sinais) vai tornar-se «obrigatória», o que levará os críticos do livro vermelho – não o do Maoísmo, mas o dos pneus – a afixar estrelas em casas que as merecem há muitos anos.

Escondido 2012 – um cavalheiro lisboeta

Texto João Barbosa

Há pessoas que precisam de várias vidas. Uma delas é Aníbal Coutinho, que não se satisfaz com uma só tarefa. Canta no Coro Gulbenkian, é vitivinicultor, enólogo, consultor na área dos vinhos do Continente, crítico e autor de roteiros enogastronómicos, além de ter trabalhado como escanção, no restaurante Jacinto, em Lisboa. Todas estas actividades permitem-lhe uma visão ampla sobre o vinho.

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Aníbal Coutinho – Foto Cedida por Aníbal Coutinho | Todos os Direitos Reservados

Agora importa o seu vinho mais pessoal. Mais pessoal, porque as videiras que dão a fruta estão na propriedade familiar onde passa as férias. O primeiro Escondido a ser revelado foi o da colheita de 2006. Este é o quarto a mostrar-se ao mundo.

A razão de em dez anos só terem sido mostradas quatro edições prende-se com o facto deste vinho ser um projecto que, não sendo uma brincadeira, vive em torno da família e do tempo possível para os trabalhos agrícolas.

Não é uma brincadeira! Aníbal Coutinho leva-o muito a sério, em investimento pessoal, profissional e obviamente financeiro. Por outro lado, trata-se de um vinho de grande qualidade. Se a agricultura, a meteorologia e o dia-a-dia laboral não cooperarem, o Escondido fica em casa.

Além da família, há dois outros contribuidores importantes: Vera Moreira e António Ventura, enólogos do Grupo Parras. Aqui tenho de pôr um sinal! António Ventura é dos enólogos portugueses por quem tenho maior respeito. É um Senhor que lida com muitos milhões de litros. A enologia de ourives impressiona sempre, mas o trabalho de grande volume exige um rigor e concentração que nem todos saberão fazer.

A vinha, com 15 anos, situa-se no campo da bola usado nas brincadeiras familiares… um campo de futebol que não tem as dimensões máximas, que rondam um hectare. Tem as mínimas, 0,4 hectares. Mas Aníbal Coutinho garante que nem chega para futebol de salão.

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As vinhas – Foto Cedida por Aníbal Coutinho | Todos os Direitos Reservados

Não cabem 22 jogadores e quatro árbitros, mas encaixam-se as castas cabernet sauvignon, merlot, syrah e touriga nacional. A escolha das castas relaciona-se com as características atlânticas do clima da propriedade. Aníbal Coutinho inspirou-se em Bordéus e na sua viticultura, conta. A penúltima casta citada, oriunda das Côtes du Rhône, está plantada no interior da vinha, de modo a conseguir abrigo.

O terreno, com solo argilo-calcário, situa-se em Olelas, entre Sabugo e Almargem do Bispo, no Concelho de Sintra, na região de Lisboa. Em linha recta, o mar fica entre dez e 15 quilómetros, diz Aníbal Coutinho. Esta proximidade oceânica tem causado dissabores… uma desatenção e fica sem uvas. Acresce que não são feitos tratamentos, o que a torna ainda mais vulnerável. Eis a razão de em dez anos só terem vindo a público quatro colheitas.

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As vinhas – Foto Cedida por Aníbal Coutinho | Todos os Direitos Reservados

O Escondido 2012 estagiou 24 meses em madeira, divididos numa barrica usada de carvalho francês, uma barrica usada de carvalho americano, durante 15 meses, e uma barrica nova de carvalho americano, nos nove meses restantes do segundo ano.

Por razões históricas e, certamente também, por influência religiosa, os portugueses têm medo da palavra luxo. Mas as coisas são o que são. O Escondido é um vinho de luxo! Recebe todos os cuidados para que o seja, tem grande qualidade obrigatória e a quantidade é diminuta. Se o ano agrícola se perdeu ou se a qualidade não atinge o patamar que o produtor deseja, o vinho fica para ser bebido apenas pela família e amigos. O Escondido 2012 teve uma produção de 500 garrafas de 0,75 litros e 100 garrafas magnum.

A frescura do local sente-se no copo. É um vinho que quer que nos sentemos com ele à mesa, à volta de um prato substancial. É para ser bebido muito lentamente. O Escondido 2012 foi-me apresentando, no restaurante Jacinto, acompanhado por um cozido à portuguesa. Uma combinação muito feliz, pois trata-se duma refeição vasta em diversidade de carnes e de vegetais, que se não deixa comer em cinco minutos.

Um aspecto de notar é que, embora se bata na perfeição com um prato pesado, o Escondido 2012 não é um vinho de Inverno. Não o beberia com uma salada, mas não obriga a que tenha de ser servido quando a comida gorda reina nas mesas. É um vinho fresco e complexo, com grande elegância e com um final longo. Evolui muito bem com o passar do tempo em que decorre a refeição.

Tem tempo para viver, tem tudo o que é necessário para uma longa vida em garrafa. Não arrisco prazos, mas quanto a longevidade, Aníbal Coutinho pensa que poderá crescer até aos 20 anos.

Blackett – Portos datados ou o caminho da tentação

Texto João Pedro de Carvalho

Sofro a bem sofrer uma valente paixoneta por Vinho do Porto e mais especificamente por Tawny datados. A escada ou caminho da tentação e também da perdição que representam os 10, 20, 30 ou mais de 40 anos é para mim um paraíso sem fim. Admito que a minha carteira não me permite gozar dos celestiais prazeres e de toda a exclusividade com que um +40 anos nos presenteia. Mas também digo que fico bastante satisfeito com os prazeres mais terrenos e acessíveis que os 10 e 20 Anos apresentam. Ora neste campo cabe trazer à conversa os mais novos exemplares do recente produtor já aqui abordado, Blackett. Na verdade, torna-se complicado ter de descer a escada, pois uma vez aqui em cima tudo parece mais bonito e airoso, são outros os luxos de um Porto 30 Anos e quem é que gosta de abdicar deles?

A apresentação do produtor foi a modos que feita no anterior artigo quando me foquei no Blackett 30 Anos. Desta vez troquei as voltas ao jogo, se é que o era, e comecei a prova pelo Blackett 10 Anos num estilo onde se esperava ser a fruta a surgir em grande quantidade como noutras casas, mas aqui não, a fruta surge mas nota-se que a evolução e mesmo todo o blend que por ali foi construído tem um bouquet ligeiramente mais evoluído e isso é bom, muito bom. Temos portanto um 10 Anos que aparenta ser um bocadinho mais velho, bem guloso e fresco, com uma grande envolvente e definição dos aromas. A fruta sim está presente nos seus retoques mais macerados, fruta passa, uma boa untuosidade que combina com os frutos secos e o toque amanteigado. No palato mostra-se muito fresco, complexo, belo equilíbrio entre a fruta/untuosidade/frescura/doçura num longo final. É a chave de ouro para terminar em beleza uma refeição de amigos, família ou mesmo aquele final de serão com a calma já instalada.

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Port Blackett 10 years – Foto Cedida por Alchemy Wines | Todos os Direitos Reservados

Terminando em beleza com o 20 Anos, onde me atrevo a dizer o que mais gostei da trilogia dos Porto Blackett, mais ainda que do 30 Anos. Balanço perfeito entre a energia da juventude e a sabedoria que só a idade sabe trazer, com tudo isto o resultado só pode ser muito bom. Maior presença dos frutos secos com toque de caramelo, amplo e untuoso, bem fresco, tudo a mostrar capacidade de nos cativar mais e mais. Conquistador no palato pela harmonia que mostra, ligeiramente mais seco embora com uma presença mais duradoura. É um Porto 20 Anos de grande nível que entra para o lote dos meus favoritos. É daqueles vinhos criados para acompanhar aqueles momentos só nossos, no sofá a ouvir o nosso cd favorito ou a ler o livro que nos agarra e que só o conseguimos largar quando termina, até à série que acompanhamos religiosamente ao final da noite.

Contactos
Alchemy Wines
Avenida da Boavista, nº2121 – 4º Sala 405
4100-130 Porto
Portugal
Website: www.alchemywines.pt

A nova imagem da Churchill’s

Texto José Silva

Uma empresa de produção de vinhos do Douro que existe apenas há 35 anos, fundada em 1981 por John Graham, mas que atingiu já a maioridade, produzindo vinhos de mesa e do Porto de grande qualidade, com características muito próprias e uma imagem aguerrida que não deixa ninguém indiferente.

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John Graham – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Em 1999 a Churchill’s comprou a Quinta da Gricha, no Douro, na zona de Ervedosa do Douro, perto de S. João da Pesqueira. São vinhas com alguma altitude, algumas delas muito velhas e com uma enorme variedade de castas, mesmo algumas dezenas, que dão origem a vinhos cheios de complexidade e elegância e uma frescura e acidez só possível com vinhas com aquela localização. Para os vinhos brancos de mesa compram uvas na outra margem do rio, na região de Murça, beneficiando, para além da altitude, de alguns solos graníticos.

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Centro de Visitas – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Em Vila Nova de Gaia têm um simpático Centro de Visitas, resultante da recuperação de instalações antigas, onde funciona um espaço para provas e loja de venda, mas onde também se podem apreciar tonéis de grande volume, onde envelhecem paulatinamente alguns dos vinhos do Porto da empresa. Foi ali que recentemente apresentaram à imprensa um novo vinho tinto, o Quinta da Gricha 2013. E que decorreu num almoço informal elaborado pelo chefe Victor Sobral.

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Directora Comercial Maria Emília Campos – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Enólogo Ricardo Nunes – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Antes disso, os CEO da empresa, John Graham e Maria Emília Campos, e o enólogo Ricardo Nunes, fizeram uma apresentação da empresa e dos vinhos que estavam a ser provados, onde se incluía o novo vinho tinto.

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Vista soberba – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Na sala superior deste delicioso espaço em Gaia, com uma vista soberba sobre as duas margens do rio e a ponte de D. Luís, provaram-se sete vinhos, começando com a curiosidade dum rosé, de que apenas fazem 2.000 garrafas, com screw cap. Um vinho jovem, muito fresco e com excelente acidez, sem grandes pretensões, mas muito agradável, mesmo para acompanhar alguns petiscos simples. Esgota num ápice! Depois foi o branco, composto por rabigato e viosinho, muito elegante, cheio de frescura e com uma acidez persistente que o torna muito gastronómico, um belo vinho. Seguiu-se o primeiro tinto, o Churchill’s Estates 2013, um entrada de gama composto por Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz, elegante, simples e equilibrado. O Churchill’s Estates Touriga Nacional apresentou-se cheio de estrutura, perfumado, volumoso, muito elegante, com óptima acidez, muito característico, um belo tinto. Provou-se depois um Churchill’s Grande Reserva poderoso, resultante de vinhas velhas, com muitas, mesmo muitas castas da região, de várias propriedades, a dar-lhe complexidade, profundidade, uma boca ao mesmo tempo volumosa e exótica, um vinho para durar ainda muitos anos em garrafa.

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Os vinhos provados – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Veio então o novo vinho, o Quinta da Gricha 2013, também com origem em vinhas muito velhas, mas apenas da Quinta da Gricha, que se apresenta como a expressão máxima do terroir desta quinta. Muito mineral, com notas de frutos pretos,, cheio de corpo, com uma acidez fantástica, exuberante, um grande vinho tinto do Douro.

Finalmente provamos o Porto Quinta da Gricha Vintage 2013, um vintage clássico cheio de estrutura, com notas de cravinho, amora, figo, ameixa preta, chocolate preto e casca de laranja, muito complexo. Volumoso e com uma acidez incrível, muito freso, notas de especiarias, mirtilos, ainda jovem, vai ser muito interessante prová-lo daqui a alguns anos.

Seguiu-se então o almoço servido pelo chefe Victor Sobral, que começou com um robalo marinado com verduras, muito fresco, delicioso, que aguentou muito bem um surpreendente Dry White Port, cheio de frescura e levemente especiado.

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Robalo marinado – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Bacalhau – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Chocos – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Depois serviu-nos um naco de bacalhau sobre cama de grelos e puré de grão, com cebola caramelizada, muitíssimo bem conseguido, que casou muito bem com o vinho branco.

E depois a surpresa dum prato do litoral alentejano de que é originário, chocos com tinta e favas, fantástico. E que aguentou com galhardia os tintos Touriga Nacional 2012 e Grande Reserva 2011. A fechar a refeição beberam-se um Tawny 20 Anos e um Vintage de 1997, ambos já a um nível muito elevado. Lá em baixo, o Douro passava, pachorrento…

A apresentação de um antigo produtor – Quinta Dona Matilde

Texto João Barbosa

A cada curva do Douro parece haver uma quinta ou um recanto particular. É um rio com carisma, um vale em que a natureza e o homem se juntaram na criação. Nas curvas e contracurvas, alturas e margens, modo de encarar o Sol e ampla variedade de castas escreve-se um livro grande. Nem tudo merece ser personagem ou capítulo, mas é um calhamaço.

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Quinta Dona Matilde – Foto Cedida por Quinta Dona Matilde | Todos os Direitos Reservados

A Quinta Dona Matilde tem direito a entrar na estória. Se vou buscar a imagem de livro é porque existe enredo acerca desta propriedade. Este domínio pertenceu, durante quatro gerações, à família Barros, que a comprou em 1927.

Em Maio de 2006, Manuel Ângelo Barros vendeu o Grupo Barros ao Grupo Sogevinus. A Quinta Dona Matilde foi agregada com os restantes activos. Contudo, o vinho é um diabrete e cedo começou a importunar o empresário que vendera a propriedade.

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Quinta Dona Matilde – Foto Cedida por Quinta Dona Matilde | Todos os Direitos Reservados

Assim, Manuel Ângelo Barros e família decidiram que tinham de regressar ao vinho. Tantas voltas deram que acabaram por recomprar a Quinta Dona Matilde, no final de 2006 – os restantes activos permaneceram na Sogevinus.

A quinta situa-se em Canelas, entre Peso da Régua e o Pinhão, dentro do espaço demarcação inicial do Douro, estabelecida em 1756. Todo o domínio vinícola, 28 hectares, está classificado como Letra A – a mais alta da tabela de pontuação a cargo do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto. Além das uveiras, a Quinta Dona Matilde tem olival tradicional, pomar, onde se destacam limoeiros e laranjeiras, jardins e terra deixada à natureza. Tudo isto soma 93 hectares.

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Quinta Dona Matilde – Foto Cedida por Quinta Dona Matilde | Todos os Direitos Reservados

O Vinho do Porto foi sempre o destino das uvas desta quinta. Uma pequena parte ficava por fortificar, mas apenas para consumo da família. Na década de 60, a firma produziu um rosé e, na de 90, branco – mas sempre marginais. Na reencarnação familiar, a produção de vinho do Douro está a par da de Vinho do Porto. Actualmente vende uvas ao grupo The Fladgate Partnership.

Manuel Ângelo Barros afirma que não tem pressa em pôr os vinhos à venda, decisão raríssima em Portugal. Agora apresentaram a vindima de 2011, referente a tintos. Já o branco anunciado é o de 2015. A tradição da casa era a de fazer tawnies e assim será, embora a fabricação de néctares com indicação de idade esteja, para já, afastada. Decidido está a aposta na família dos rubis, nomeadamente vintages. A viticultura é competência de José Carlos Oliveira e a enologia é da responsabilidade de João Pissarra.

O Dona Matilde Branco 2015 é um lote feito com as castas arinto, gouveio, rabigato e viosinho. As uvas foram prensadas e a fermentação decorreu em cubas de inox.

Pela natureza montanhosa e com um rio a cortá-la, a região do Douro é generosa em variedade de características. Porém, este vinho surpreendeu-me, pois nunca diria tratar-se de um néctar daquela demarcação.

Não gosto muito de enumerar descritores sensoriais, mas justifica-se fazê-lo agora, para que conte por que não encontro o Douro neste branco. É um vinho em que predominam os perfumes de fruta tropical, especialmente de maracujá e ananás, associado a anis, uma pitada de erva-doce, tangerina e um pouco de limão. Na boca, o carácter tropical impõe-se. Vai indo e indo e com frescura.

E isto que acabo de escrever é bom ou é mau? É um vinho bem feito – bom! Em termos de gosto pessoal não me preenche. Seguidamente pergunto-me se este carácter tropical e imprevisível é dele ou foi uma vontade do enólogo e do produtor. Se é resultado apenas da natureza, calo-me já. Se é intencional, digo que vejo razão para o Douro produzir vinhos com este perfil.

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Os vinhos – Foto Cedida por Quinta Dona Matilde | Todos os Direitos Reservados

O Dona Matilde Tinto 2011 é claramente um Douro e exemplar do ano. Trata-se dum lote de tinta amarela, touriga franca e touriga nacional – todas vinhas velhas, indica o produtor. Parte das uvas foi pisada em lagar. O vinho estagiou um ano em madeira. É guloso sem ser doce, suave, fresco e com bom tempo de boca. Tem aroma mentolado, um muito fino fumado de lenha de azinho. Belo!

O Dona Matilde Reserva Tinto 2011 é um lote, em que a touriga nacional representa metade. Somam-se touriga franca (30%) e um ramalhete de várias outras, misturadas numa vinha velha, em que predomina a tinta amarela. Parte das uvas foi pisada em lagares de granito. O vinho estagiou 18 meses em barricas novas de carvalho francês.

É o Douro bem mostrado: esteva, menta, madeira e fumo de lenha de azinho, ameixa preta, doce de amora, geleia de morango (calma e mansa), figo, um pouco de tabaco loiro e xisto – tudo bem casado. Na boca continua duriense, ocupa o espaço plenamente, suave, com taninos a rirem-se (sem trincarem a pele), fresco e seco, longo e fundo.

Antes de passar aos generosos, quero referir que estes três vinhos pedem mesa. Os tintos dão esperanças de boa evolução em garrafa.

O Quinta Dona Matilde Porto Colheita 2008 é um tawny diferente do comum, a meio caminho do rubi. É resultado de um estágio em madeira menos demorado. Três anos em tonéis de carvalho e quatro em pipas de 600 litros.

É um vinho feliz e agradável surpresa. Tem o que se espera de um tawny e lembra um rubi. Lá estão os frutos secos, o caramelo, baunilha e uma pitadinha de iodo. A par das compotas de amora, ameixa, cereja, morango… É fundo e denso, longo.

O Quinta Dona Matilde Vintage 2011 é mais uma prova de que o ano foi muito generoso para com os vitivinicultores portugueses. É um lote de tinta amarela, tinta barroca, rufete, touriga franca e touriga nacional. O vinho estagiou dois anos em tonéis de carvalho, tendo sido depois passado para garrafa. Lá estão as muitas compotas que animam os vintage, do nariz à boca – profundo e longo.

Os vintage novos são o que são, mas também serão uma outra coisa. Devem beber-se já ou guardar-se? Sei lá! Sei lá se estou vivo amanhã. Sei que, se me mantiver acordado por mais anos, estará mais acima. Quem puder que o beba e guarde.

Contactos
Quinta D. Matilde
Bagaúste
5050-445 Canelas PRG
Portugal
E-mail: info@donamatilde.pt
Website: www.donamatilde.pt

Quintas de Melgaço – QM Homenagem Reserva 2014

Texto João Pedro de Carvalho

Rumamos à belíssima região dos Vinhos Verdes onde a casta rainha é a Alvarinho.

Video by QM – Todos os Direitos Reservados

É no terroir de Monção e Melgaço que nascem os melhores exemplares de Alvarinho e muito recentemente pela mão das Quintas de Melgaço foi lançado um desses exemplares de se tirar o chapéu. Por ali tudo começou há cerca de 20 anos pelo amor à terra natal (Melgaço) de um minhoto de gema de seu nome, Amadeu Abílio Lopes, fundador da Quintas de Melgaço e que foi recentemente homenageado com o lançamento deste QM Homenagem Reserva 2014. A Quintas de Melgaço junta paixão e tradição, são mais de 500 produtores da região que fazem chegar as suas uvas à adega. Das melhores uvas de Alvarinho do ano 2014 nasceu este precioso e raro vinho, que teve direito a passagem por madeira, com produção final a rondar as mil unidades.

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A Quinta – Foto Cedida por Quintas de Melgaço | Todos os Direitos Reservados

Correndo o risco de me repetir, há que chamar a atenção dos consumidores para a qualidade actual dos vinhos brancos criados nesta região de excelência. As provas no que diz respeito à qualidade e mesmo longevidade estão mais que dadas ano após ano. Um aviso que serve para os vinhos de todas as gamas, porque até nos vinhos ditos mais baratos as surpresas estão ao virar da esquina. A verdade é que a virtuosidade com que os brancos minhotos brilham à mesa é fantástica, mais ainda se tivermos em conta como acompanhamento de tudo o que é peixe ou marisco. Têm como que o toque de midas e há que salientar o facto de que a região não se ter deixado canibalizar por castas vindas de fora face às suas nativas Alvarinho, Loureiro, Trajadura, Avesso… pois souberam entender que é ali que elas brilham e nos sabem conquistar com toda a sua energia e perfume.

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QM Homenagem Reserva – Foto Cedida por Quintas de Melgaço | Todos os Direitos Reservados

Façamos pois a vontade a um vinho tão especial como este QM Homenagem Reserva 2014, que goza de uma fantástica energia e frescura. A casta faz-se mostrar com garbo e alguma ousadia, acutilante na acidez com uma boa austeridade mineral em pano de fundo. A madeira por onde passou confere aquele extra de complexidade, serena-lhe ligeiramente o espírito, de resto é daqueles brancos que precisa de tempo no copo mas essencialmente na garrafa para crescer ainda mais. Foi acompanhado por uma cataplana de cherne com amêijoas e mexilhões, de beber e chorar por mais.