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Escondido 2012 – um cavalheiro lisboeta

Texto João Barbosa

Há pessoas que precisam de várias vidas. Uma delas é Aníbal Coutinho, que não se satisfaz com uma só tarefa. Canta no Coro Gulbenkian, é vitivinicultor, enólogo, consultor na área dos vinhos do Continente, crítico e autor de roteiros enogastronómicos, além de ter trabalhado como escanção, no restaurante Jacinto, em Lisboa. Todas estas actividades permitem-lhe uma visão ampla sobre o vinho.

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Aníbal Coutinho – Foto Cedida por Aníbal Coutinho | Todos os Direitos Reservados

Agora importa o seu vinho mais pessoal. Mais pessoal, porque as videiras que dão a fruta estão na propriedade familiar onde passa as férias. O primeiro Escondido a ser revelado foi o da colheita de 2006. Este é o quarto a mostrar-se ao mundo.

A razão de em dez anos só terem sido mostradas quatro edições prende-se com o facto deste vinho ser um projecto que, não sendo uma brincadeira, vive em torno da família e do tempo possível para os trabalhos agrícolas.

Não é uma brincadeira! Aníbal Coutinho leva-o muito a sério, em investimento pessoal, profissional e obviamente financeiro. Por outro lado, trata-se de um vinho de grande qualidade. Se a agricultura, a meteorologia e o dia-a-dia laboral não cooperarem, o Escondido fica em casa.

Além da família, há dois outros contribuidores importantes: Vera Moreira e António Ventura, enólogos do Grupo Parras. Aqui tenho de pôr um sinal! António Ventura é dos enólogos portugueses por quem tenho maior respeito. É um Senhor que lida com muitos milhões de litros. A enologia de ourives impressiona sempre, mas o trabalho de grande volume exige um rigor e concentração que nem todos saberão fazer.

A vinha, com 15 anos, situa-se no campo da bola usado nas brincadeiras familiares… um campo de futebol que não tem as dimensões máximas, que rondam um hectare. Tem as mínimas, 0,4 hectares. Mas Aníbal Coutinho garante que nem chega para futebol de salão.

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As vinhas – Foto Cedida por Aníbal Coutinho | Todos os Direitos Reservados

Não cabem 22 jogadores e quatro árbitros, mas encaixam-se as castas cabernet sauvignon, merlot, syrah e touriga nacional. A escolha das castas relaciona-se com as características atlânticas do clima da propriedade. Aníbal Coutinho inspirou-se em Bordéus e na sua viticultura, conta. A penúltima casta citada, oriunda das Côtes du Rhône, está plantada no interior da vinha, de modo a conseguir abrigo.

O terreno, com solo argilo-calcário, situa-se em Olelas, entre Sabugo e Almargem do Bispo, no Concelho de Sintra, na região de Lisboa. Em linha recta, o mar fica entre dez e 15 quilómetros, diz Aníbal Coutinho. Esta proximidade oceânica tem causado dissabores… uma desatenção e fica sem uvas. Acresce que não são feitos tratamentos, o que a torna ainda mais vulnerável. Eis a razão de em dez anos só terem vindo a público quatro colheitas.

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As vinhas – Foto Cedida por Aníbal Coutinho | Todos os Direitos Reservados

O Escondido 2012 estagiou 24 meses em madeira, divididos numa barrica usada de carvalho francês, uma barrica usada de carvalho americano, durante 15 meses, e uma barrica nova de carvalho americano, nos nove meses restantes do segundo ano.

Por razões históricas e, certamente também, por influência religiosa, os portugueses têm medo da palavra luxo. Mas as coisas são o que são. O Escondido é um vinho de luxo! Recebe todos os cuidados para que o seja, tem grande qualidade obrigatória e a quantidade é diminuta. Se o ano agrícola se perdeu ou se a qualidade não atinge o patamar que o produtor deseja, o vinho fica para ser bebido apenas pela família e amigos. O Escondido 2012 teve uma produção de 500 garrafas de 0,75 litros e 100 garrafas magnum.

A frescura do local sente-se no copo. É um vinho que quer que nos sentemos com ele à mesa, à volta de um prato substancial. É para ser bebido muito lentamente. O Escondido 2012 foi-me apresentando, no restaurante Jacinto, acompanhado por um cozido à portuguesa. Uma combinação muito feliz, pois trata-se duma refeição vasta em diversidade de carnes e de vegetais, que se não deixa comer em cinco minutos.

Um aspecto de notar é que, embora se bata na perfeição com um prato pesado, o Escondido 2012 não é um vinho de Inverno. Não o beberia com uma salada, mas não obriga a que tenha de ser servido quando a comida gorda reina nas mesas. É um vinho fresco e complexo, com grande elegância e com um final longo. Evolui muito bem com o passar do tempo em que decorre a refeição.

Tem tempo para viver, tem tudo o que é necessário para uma longa vida em garrafa. Não arrisco prazos, mas quanto a longevidade, Aníbal Coutinho pensa que poderá crescer até aos 20 anos.

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