Posts Categorized : Vinhos Tranquilo (Vinhos de Mesa)

Papa Figos Branco 2015 e Papa Figos Tinto 2014

Texto João Barbosa

A repetição de palavras ou de rimas em latim faz-me sempre pensar tratar-se de magia. Não sei que livros andei a ler ou que filmes andei a ver. Bem, cá vai:

– Oriolus oriolus.

É o nome latino de papa-figos, um passarinho bonito comum na Europa e que pode ser visto até a uma parte da Ásia, voa até ao Cazaquistão e à Mongólia.

É um passarinho com ar simpático que os meus olhos de urbanita não conseguem identificar sem ajuda de quem sabe. Além de simpático é bonito. Não sou ornitólogo e fico por aqui, pois o tema não é acerca de aves.

Os Papa Figos fazem um par de vinhos do Douro. A Casa Ferreirinha (Sogrape) apresentou há poucos dias as novas edições. O branco é de 2015 e o tinto é de 2014. Se os papa-figos são uma alegria para os olhos, os Papa Figos dão bom prazer gastronómico.

Quando escrevo gastronómico não me refiro apenas à mesa, mas à globalidade do significado gastro. Palavra grega que significa estômago. Hoje pareço um sábio. Já escrevi latim e agora foi grego.

Ou seja, tanto o tinto quanto branco (sobretudo este) são apetecíveis no Verão. Mas tenho de fazer um aviso. O rubro apresenta uma graduação alcoólica de 13,5%. Nesta fase do ano em que se pedem comidas mais leves e que a praia pede mergulhos recomenda-se prudência.

É um tinto que tem frescura natural, o que já se sabe que nos pode enganar. Acresce que no calor, quando é fácil os vinhos se tornarem sopa, devem ser refrescados. Costumo deixá-los mais frios do que os normalmente recomendáveis 16 graus. Isto porque rapidamente aquecem. Ainda que a noite possa ser o momento do dia mais indicado, o Verão é muitas vezes injusto para os enófilos.

Voltando ao motivo por que disse que é globalmente gastronómico. É porque se bebe facilmente numa noite de conversa, daquelas sem tempo para acabarem. Nas férias, sempre que posso descontraio-me com amigos com quem nem sempre consigo privar, devido às horas curtas nas semanas de ofício.

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Papa Figos tinto – Foto Cedida por Sogrape | Todos os Direitos Reservados

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Papa Figos branco – Foto Cedida por Sogrape | Todos os Direitos Reservados

O branco é mais comedido em relação ao álcool. Tem saudáveis 12,5%. E pensar que nem há muitos anos os produtos deixavam derrapar as vindimas dos brancos. Não quero com isto afirmar que devam ter sempre baixo volume alcoólico, pois há néctares que estão bem.

Há mais uma razão por que este vinho me caiu no goto: a touriga franca, omnipresente, ou quase, nos tintos do Douro. Aqui representa 30% do lote. As tinta barroca representa a mesma percentagem e a tinta roriz está em 15%. A touriga nacional, que prefiro a do Douro à tão festejada do Dão, dá uma gulodice que aprecio, sem que se torne enjoativa. Está sóbria, representando 15%.

As uvas vieram do Douro Superior, cultivadas principalmente em encostas voltadas a Norte e mais acima na montanha. A maceração pelicular fez-se em depósitos de inox, assim como a fermentação alcoólica. Um quarto do lote estagiou oito meses em barricas de carvalho francês. O engarrafamento ocorreu um ano depois das vindimas.

O branco fez-se com uvas das castas rabigato (50%), viosinho (20%), arinto (18%) e moscatel galego (5%). A fruta veio igualmente do Douro Superior, de zonas altas. Um quinto do lote estagiou três meses em barricas usadas de carvalho francês. A parte restante foi mantida em depósitos de inox.

E é isto! Boas férias para quem vai e continuação de bom trabalho para quem fica.

Quinta dos Plátanos, na rota dos clássicos

Texto João Pedro de Carvalho

A Quinta dos Plátanos insere-se na Região Vitivinícola da Estremadura, com Denominação de Origem de Alenquer. Uma das Quintas mais antigas do concelho de Alenquer, pertence, à freguesia de Aldeia Galega da Merceana.

A principal actividade ao longo dos anos, desde o século XVII, tem sido a vitivinicultura. Sempre mantida no seio da mesma família, seria já no século XX que se dá uma renovação, inicialmente pelas mãos de Artur de Menezes Corrêa de Sá, como posteriormente pelo seu filho mais velho, José de Menezes Corrêa de Sá. Surgem então as primeiras vinhas aramadas e com compassos que permitem a mecanização dos trabalhos, primeiro com alfaias de tracção animal, depois mecânica e utilizando mesmo meios aéreos nos tratamentos sendo então apontada como pioneira nalgumas práticas. Na década de 50 é feita a total renovação da adega que permitiu nos anos 60 o aparecimento dos vinhos com a marca Plátanos. Apenas mais tarde com a criação da Região Demarcada, passam a ser denominados Quinta dos Plátanos. Já nos últimos anos se tem procedido á reestruturação das vinhas, com 16 hectares onde se inclui Touriga Nacional, Touriga Francesa, Tinta Roriz, Syrah e Cabernet Sauvignon. No total são 35 hectares de vinha entre castas brancas com destaque para o Arinto e o Fernão Pires e nas tintas para além das já referidas, Pinot Noir, Castelão e Alicante Bouschet.

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As vinhas – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

Hoje em dia é Artur Corrêa de Sá e a sua filha Luísa que gerem os destinos da Quinta dos Plátanos. A enologia está a cargo de Jorge Páscoa embora na prova dos vinhos se note uma clara distinção entre as gamas apresentadas, uma linha que separa a gama Quinta dos Plátanos e a Plátanos. Essa distinção deve-se ao marido de Luísa, o produtor Joaquim Arnaud. Enquanto os primeiros vinhos mostram o lado mais clássico e digamos, mais rústico da região, os vinhos Plátanos mostram-se na faceta mais elegante como é apanágio da linhagem Arundel (Pavia). Um local que transpira história, cheio de recantos fantásticos, que quanto a mim continua à espera de vinhos à sua dimensão, o que pelo provado parecem estar no bom caminho mas ainda com alguma distância a percorrer.

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As vinhas – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

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Os vinhos – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

Os dois Quinta dos Plátanos surgem com DOC Alenquer, o tinto de 2014 e o branco também de 2014. O tinto mostra-se com raça, muita fruta preta madura, frescura bem presente com um travo algo vegetal que lhe dá dureza e rusticidade. Na boca é focado na fruta, carnuda em corpo mediano, saboroso e com boa frescura. O branco vai buscar os encantos às castas Arinto e Fernão Pires, com grande frescura, aromas com alguma acutilância, muito citrino e alguma fruta de pomar, flores e rebuçado de limão no final. Boca a condizer, fresco, convidativo e apelativo para a mesa em tempo quente. Na gama Plátanos dois vinhos, Plátanos Arinto 2014, com a casta bem presente nos aromas de folha de limoeiro, lima e limão, grande frescura, tenso e com ligeiro floral algo tímido em segundo plano, num bom exemplar da casta embora lhe falte maior acutilância na prova de boca. O Plátanos Tou Noir 2010 é fruto das castas Touriga Nacional e Pinot Noir, mostra-se fresco e muito apelativo, com uma bonita capacidade de se ir alterando no copo e ajustando com o tempo. Torna-se guloso, fresco e terrivelmente gastronómico com aqueles nacos de vitela no carvão acompanhados com manteiga de alho. Muita fruta do bosque bem suculenta, madura e gulosa, carnudo e saboroso, cheio de especiarias, muita garra ao mesmo tempo que escorre guloso pelo palato, todo ele embalado por uma bela frescura que em momento algum o deixa esmorecer.

Prova vertical de Bafarela

Texto José Silva

A Casa Brites Aguiar está localizada muito perto duma das aldeias vinhateiras do Douro, Trevões, com as suas vinhas espalhadas pelas encostas do Rio Torto, beneficiando dum terroir fantástico, que é partilhado por olival, cerejal, nogueiral e souto, numa evolvente rural bem típica desta região duriense. Propriedade de uma família desde sempre ligada à terra, a partir de 2002 deixou de entregar as uvas à Adega Cooperativa, passando a trabalhá-las em adega própria. E assim as uvas produzidas nos 45 hectares de vinha, das castas Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Roriz, Tinta Amarela, Tinta Barroca e Tinta Francisca, passaram a produzir os vinhos desta casa, com marcas próprias, o “Brites Aguiar “e o “Bafarela”.

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António Domingos – Foto Cedida por Brites Aguiar | Todos os Direitos Reservados

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O Douro – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Sendo uma empresa familiar, é o irmão António Domingos (Tomi para os mais chegados) que abandona a ideia de ir para medicina e, há mais de 30 anos, se dedica por inteiro à terra e segue as pisadas do seu avô materno. Entre 1986 e 2004 reconverteu totalmente as vinhas para que pudessem ser tratadas mecanicamente. Fez a primeira vindima em 2003 e a partir de 2004 passou a trabalhar com a 2PR de António Rosas e Pedro Sequeira, o que se revelou acertado, pois têm tido bastante sucesso. Então, em 2004, aparece o primeiro Brites Aguiar e o primeiro vinho com 17%. Mas só a partir de 2008 é que surge o Grande Reserva Bafarela, com uma base de Touriga Franca e Touriga Nacional e uma ajuda de Tinta Roriz. Para o seu estágio são usadas barricas de 500 litros, de que se fazem três utilizações. Recentemente decidiram fazer uma prova vertical dos Grande Reserva Bafarela, que nunca tinha sido feita. E foi no ambiente do Douro que esta prova foi efectuada, com a presença do Tomi e mulher, e dos enólogos António Rosas e Pedro Sequeira.

O local escolhido, o D.O.C., não podia ser mais adequado, literalmente em cima do rio, com aquela paisagem arrebatadora, que enche os olhos, que nunca cansa. Os vinhos abertos atempadamente e à temperatura recomendada, apresentaram todos uma cor vermelha carregada, intensa mas elegante.

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O perfil dos vinhos – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

E têm um perfil comum, são elegantes mas consistentes com deliciosas notas químicas que lhes dão alguma rusticidade.

Iniciou-se a prova com o Grande Reserva Bafarela 2008, que apresenta 14,5% de álcool. Nariz com notas ligeiras de evolução, algumas especiarias e laivos de fruta vermelha. Na boca apresenta uma boa acidez, é elegante e tem estrutura simples mas consistente. Nota-se a idade, mas bebe-se muito bem.

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Grande Reserva Bafarela 2008 – Foto Cedida por Brites Aguiar | Todos os Direitos Reservados

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Grande Reserva Bafarela 2009 – Foto Cedida por Brites Aguiar | Todos os Direitos Reservados

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Grande Reserva Bafarela 2010 – Foto Cedida por Brites Aguiar | Todos os Direitos Reservados

O Grande Reserva Bafarela 2009, também com 14,5%, é aveludado, cheio de elegância, com notas de plantas silvestres, esteva, muito fresco. Na boca tem volume, é fresco e tem óptima acidez, muito persistente. Apresenta notas de especiarias, os taninos bem presentes, secos e uma óptima complexidade. Um vinho sério.

Seguiu-se o Grande Reserva Bafarela 2010, ainda com 14,5%, muito suave, fino, boa fruta madura, muito elegante. Na boca é fresco, intenso, os taninos bem ligados, bela acidez, frutos vermelhos bem presentes, complexo e muito longo, já se bebe muito bem.

O Grande Reserva Bafarela 2011, com 15% de álcool, é muito suave, elegante, tem muita fruta e alguma frescura. Na boca apresenta o mesmo perfil, uma óptima acidez, fruta bastante madura, frescura, algumas especiarias e final muito longo. Não parece do ano que é.

Veio então o Grande Reserva Bafarela 2012, com 14% de ácool, um belo perfil aromático, algum floral, muito fresco. Notas suaves de especiarias, volumoso, boa presença de fruta madura, taninos intensos e belo final. Um ano que continua a surpreender, com belos vinhos como este.

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Grande Reserva Bafarela 2011 – Foto Cedida por Brites Aguiar | Todos os Direitos Reservados

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Grande Reserva Bafarela 2012 – Foto Cedida por Brites Aguiar | Todos os Direitos Reservados

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Grande Reserva Bafarela 2013 – Foto Cedida por Brites Aguiar | Todos os Direitos Reservados

Terminou-se com o Grande Reserva Bafarela 2013, o mais recente, com 14,5% de álcool. Muito elegante, sedoso, fruta bem madura, intenso, fragrâncias de plantas do monte. Na boca apresenta-se bem frutado, fresco, acidez bem ligada com os taninos, óptima estrutura, um vinho ainda jovem, a evoluir, só lhe vai fazer bem mais algum tempo de garrafa.

Seguiu-se o almoço, naquele ambiente tão acolhedor.

Depois dum aperitivo do chefe começou-se pelo excelente ravioli de sapateira com aipo e cogumelos, um prato muito fresco que foi muito bem acompanhado pelo novíssimo Bafarela Rosé 2015, cheio de frescura, seco, muito bom. É pena haver poucas garrafas!

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Ravioli – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Porco Bísaro – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Depois deliciamo-nos com as bochechas de porco bísaro com cevadinha francesa, cremoso, bem ligado, mesmo muito bom. A harmonização foi com o Bafarela Colheita 2014, jovem mas intenso, deu boa réplica à carne de porco.

Passamos então para o cordeiro de leite com tupinambo e jus de trufa, requintado, aromático, a carne muito tenra e saborosa, na companhia do Bafarela Grande Reserva 2013, que já tínhamos provado e que esteve à altura do prato.

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Cordeiro – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

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Sobremesa – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Com este mesmo vinho fomos para a sobremesa, de queijos e frutos vermelhos.

Que bem que se esteve no Douro, com a família Bafarela…

Vinhos Dona Berta, o perdurar de uma vontade

Texto João Pedro de Carvalho

Num pulo até ao Douro Superior, a Freixo do Numão, onde está sediada a adega dos vinhos Dona Berta. Durante anos a imagem de marca deste vinho foi o seu carismático produtor que recordo com saudade, o Engº Hernâni Verdelho. Foi com ele que conheci pela primeira vez a casta Rabigato, da qual era acérrimo defensor, e fiquei a conhecer os seus vinhos cheios de carácter, quer tintos quer brancos. As conversas duravam horas, sempre bem-disposto e com um carisma que conseguia transmitir como poucos para os seus vinhos. Era interessante notar que a raça e o toque por vezes até mais rústico que por vezes teimavam em mostrar de início, parecia que se vergava, qual vénia, aos pés do Engº Verdelho. Retomando as provas e o contacto com as novas colheitas, os vinhos sentem a falta do seu criador embora as linhas que os definem estejam presentes. Foram os herdeiros que deram continuidade ao projecto, fizeram perdurar o sonho de um homem, que de resto continua a ser alimentado pela fantástica mancha de vinhedo velho de onde nascem as variadas referências da adega. São vinhos que precisam de tempo em garrafa, cujo carácter bem vincado muda consoante o ano de colheita. É essa maneira de ser que procuro e gosto num vinho, que nos transmita a forma de estar durante um ano, que não seja igual ano após ano como se de um produto feito em série se tratasse. Estes que agora falo são vinhos com potencial de envelhecimento, que foram sabiamente educados e preparados para a vida pelo enólogo e professor Virgílio Loureiro. Desta forma não se estranhe que passados dez anos, quer tintos quer brancos, se mostrem com uma invejável saúde.

Uma prova com dois momentos, o primeiro com o vinho Dona Berta Vinhas Velhas Reserva branco 2015 a mostrar um 100% Rabigato cheio de frescura com a raça que lhe é conhecida. O vinho abandonou os aromas intensos e mais frutados que de certa maneira faziam adivinhar a casta no imediato, para agora mostrar-se mais tenso e mineral. Muito boa a frescura com a fruta bem coesa e presente, sem exageros que nunca aqui fizeram a festa. Tenso e com nervo na boca, boa secura no fundo de corpo bem estruturado, tem tudo para evoluir favoravelmente na passada do tempo. Por agora pede pratos de peixe/marisco com bom tempero até porque a estrutura que mostra ter, dá-lhe essa capacidade de embate. Peixe grelhado no carvão fará uma bela companhia.

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Dona Berta Vinhas Velhas Reserva branco 2015 – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

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Dona Berta Reserva tinto 2012 – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

O segundo momento coube ao Dona Berta Reserva tinto 2012, onde mais uma vez o tinto leva o seu tempo a entrar para o mercado. Muito carácter num vinho com raça e cheio de energia, muita fruta (bagas e frutos silvestres) mas também uma ligeira austeridade quer a nível de aroma como faz intensão de o confirmar no palato. Tudo muito compacto e bem coeso, apertado de tal forma que só com tempo é que se vão poder descortinar melhor os aromas. Por enquanto é um tinto cheio de vida e energia, capaz de fazer um brilharete com um bife de novilho no carvão com molho alioli.

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Esporão – Monte Velho Tinto 2015 e Quinta dos Murças Reserva 2011

Texto João Barbosa

As regiões do Alentejo e do Douro são duas das mais reconhecidas regiões vitivinícolas portuguesas. Mais do que olhar para os números das vendas, que podem esconder argumentos acerca das preferências, a viva voz diz muito acerca das razões das escolhas.

São duas regiões onde se produzem vinhos fáceis de agradar, não motivando isso qualquer motivo de censura… sim, como em quase tudo, há defensores de que só as coisas difíceis, angulosas, complicadas ou excêntricas é que são boas. Portanto, para mim, a facilidade de agrado não é sinónimo de falta de qualidade nem incompatível do prazer.

Porque as empresas existem para dar lucro, naturalmente várias firmas produzem nestas duas regiões ou, pelo menos, comercializam com marca própria vinho que adquirem numa delas. O Esporão é das companhias que avançou das planícies para as montanhas.

O Esporão é um projecto de antecipação, em que Joaquim Bandeira percebeu o potencial da região, à época, muito centrada na produção cerealífera e corticeira. José Roquette compreendeu a visão e alinhou.

A fundação aconteceu em 1972 e o empreendimento acabaria adiado devido à Reforma Agrária, de inspiração marxista, que decorreu após a Revolução do 25 de Abril de 1974. Passado o período revolucionário e a entrada na então Comunidade Económica Europeia (1986), veio a acalmação que permite à economia decorrer sem sobressaltos.

A Herdade do Esporão, em Reguengos de Monsaraz, foi restituída em 1979. A adega só ficou pronta em 1985, ano em que foi lançado o primeiro vinho, cujo rótulo apresenta uma pintura de João Hogan.

Desde esse primeiro vinho que a firma ilustra cada colheita com obras artísticas. O princípio tem sido seguido desde a primeira edição da Quinta dos Murtas, situada no Douro, em que a fotografia é a arte escolhida.

A arte não é a única excentricidade do Esporão. A firma adoptou uma política de agricultura sustentável, com recuperação de cursos de água, solos, flora e fauna – o que tem permitido também poupar em fitofármacos.

Outra loucura foi a nova adega, construída no sistema tradicional de taipa, que permite a climatização do edifício sem ter de recorrer a exigentes e dispendiosos aparelhos de refrigeração.

Outra bizarria é o respeito pelo património histórico, com a preservação duma torre medieval, um arco e uma ermida renascentistas, e a escavação de uma vasta área arqueológica, com vestígios de até há 3.000 anos Antes de Cristo.

Estas maluquices – sinónimos que quis sem aspas para que vincassem mais – chamam-se respeito e inteligência. Respeito pela natureza e pela sabedoria ancestral e inteligência porque se traduzem em economia de custos.

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Monte Velho Tinto 2015 – Foto Cedida por Esporão | Todos os Direitos Reservados

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Quinta dos Murças Reserva 2011 – Foto Cedida por Esporão | Todos os Direitos Reservados

Apresentada que está a empresa do Esporão, avanço para os dois vinhos que justificam este texto. O Monte Velho Tinto 2015 (Regional Alentejano) e o Quinta dos Murças Reserva 2011 (Douro).

O Monte Velho Tinto 2015 assinala o 25º aniversário da marca e o rótulo está ilustrado com um padrão das mantas tradicionais alentejanas. Este vinho fez-se com uvas de aragonês, trincadeira, touriga nacional e syrah.

É um vinho para ser bebido descontraidamente. Não é um grande vinho, um néctar para ocasiões especiais. Pode classificar-se como aposta segura, pois vindima após vindima mantém-se num patamar de qualidade regular.

O Quinta dos Murças Reserva 2011 é mais exigente. Trata-se de um lote de tinta roriz, tinta amarela, tinta barroca, touriga nacional, touriga franca, sousão e mais algumas, que o produtor não refere especificamente. Uvas de vinhas com mais de 40 anos. A fruta foi esmagada a pé em lagares de granito e numa prensa vertical. Estagiou um ano em barricas de carvalhos francês e americano.

É um néctar que mostra o Douro e quer comida de se comer vagarosamente. É filho de 2011, ano de excelência no país e naquela região. Que se beba antes que venham as noites tremendas de calor de Verão ou que se espere por tempos mais frescos.

Contactos
Herdade do Esporão
Apartado 31,
7200-999
Reguengos de Monsaraz, Évora – Alentejo
Tel: (+351) 266 509 280
Fax: 351 266 519 753
Email: reservas@esporao.com
Website: www.esporao.com

Quinta da Gândara

Texto João Pedro de Carvalho

Da Sociedade Agrícola de Mortágua, sai este branco produzido na Quinta da Gândara, fundada em 1756. Dos solos graníticos por entre as serras do Caramulo e Bussaco nascem as uvas que dão origem aos dois vinhos agora provados, um branco a partir da casta Encruzado e um tinto de Touriga Nacional. À falta de informação mais detalhada e apurada, apenas de registar que ficam inseridos no “plantel” do produtor Caves da Montanha (Bairrada). Vinhos inseridos num perfil que não vira costas à região, notamos, porém, que tudo se faz notar com um cunho mais modernista e à imagem dos nossos dias.

Não que isso seja mau sinal, apenas sinais de que a região tem de sabido evoluir e recolocar-se face às exigências do mercado e nos novos consumidores. Sinal disto são os vinhos de cunho mais moderno, mais prontos a beber e de taninos mais afinados onde o estágio e a vida em garrafa é muitas vezes deixada de lado. Somos por isso mesmo confrontados com o prazer imediato e ficamos a perder aquele potencial de guarda que tanta fama deu a regiões como é o caso do Dão. Resta saber se este é o caminho a seguir ou se foi apenas um atalho que se escolheu na procura do sucesso precoce. Ora num registo mais actual e moderno, mas como já foi dito, onde a região se faz notar no perfil, ambos ostentam a designação Reserva, a passagem por madeira foi em madeira nova de carvalho Francês e teve a duração de sete meses para o Branco e dez meses para o Tinto.

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Quinta da Gândara Touriga Nacional Reserva 2011 & Quinta da Gândara Reserva Encruzado 2013 – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

Enquanto o Quinta da Gândara Reserva Encruzado 2013 se mostra de aroma rico, amplo com clara presença da madeira embrenhada na fruta madura com algum fruto seco a apontar numa nota de evolução precoce. No restante conjunto mostra-se fresco, médio porte, com fundo de recorte mineral a lembrar pederneira, baunilha, num perfil de peso médio com boa dose de frescura. Na boca conjuga a fruta madura com notas de tarte de limão, amplo e com secura final.

Já o Quinta da Gândara Reserva Touriga Nacional 2011 é o oposto do branco, um vinho cujos aromas remetem no imediato para o Dão. Num conjunto de boa frescura a mostrar uma Touriga Nacional fresca e madura, floral, casca de laranja com ligeira ponta de austeridade e exuberância. Tudo embalado num tom guloso com notas de cacau, especiarias, geleia de frutos do bosque, embrulhado em frescura com boca coesa, muita energia com austeridade de fundo, carnudo e cheio de sabor.

Quinta de Foz de Arouce e Buçaco – Duas batalhas e dois vinhos

Texto João Barbosa

Há bastante tempo que tenho esta crónica prometida a mim mesmo. Por lhe faltar uma data que lhe dê emergência, foi ficando e chegou o momento em que se tornou urgente. O assunto respeita a dois vinhos icónicos, provenientes de locais «improvável» e «impossível».

Um fez-se com uva de um local absolutamente mágico, que não fica em lado nenhum. Foz de Arouce não tem o direito ao uso de qualquer denominação de origem controlada. Coisas parvas dos portugueses, que são capazes de aceitar a unificação de locais numa só região, apesar de nada os aparentarem e de nem ficarem contíguos…

Se fosse em França, referência incontornável no reconhecimento de qualidade e diferenciação, Foz de Arouce teria o estatuto das microrregiões da Borgonha. Seria provavelmente um «monopólio». Porém, o Rio Arouce situa-se em Portugal, tal como o Ceira, que o recebe.

Já o outro vinho remete para um local concreto, mas que não é sítio de vinho. O Bussaco (com dois «S») é lindo e tem um dos hotéis mais bonitos e históricos de Portugal. Contudo, as uvas que fazem os seus vinhos são provenientes da Bairrada e do Dão. Ora, isto faz com que um mais um seja igual a zero – sem direito ao uso de denominação de origem controlada.

Apesar de se fazer com uvas baga, provenientes da Bairrada, e touriga nacional, oriundas do Dão, os Buçaco (com «Ç» para que não conflitue com os ditames burocráticos) são vinhos a que se pode dizer que espelham o seu território, porque as vinhas têm sido as mesmas ao longo dos anos. É como se viessem duma só quinta, dividida por duas regiões demarcadas. Autenticidade e carisma não faltam.

Permitindo-me empurrar o conceito para fora do estabelecido, digo que Bussaco é um terroir de adega e garrafa. Vou assumir como verdadeira a localização geográfica do hotel. Tratam-se pois de dois lugares vínicos que estão numa dimensão de plasma – nem sólida nem líquida.

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Bussaco in wikimedia.org

Olhando para o mapa, Bussaco e Foz de Arouce não ficam longe, a apenas a 36 quilómetros. O caminho é bonito e a estrada exige atenção. O computador estabelece que a viagem entre os dois pontos dura 50 minutos. Contudo, demorei mais de uma hora quando visitei os dois lugares, em 2011.

Referi que os vinhos tintos do Buçaco são feitos com baga e touriga nacional. Pois, essa é a nova formação da vinha de Foz de Arouce. O enólogo e empresário vitivinícola João Portugal Ramos é genro dos Condes de Foz de Arouce e há poucos anos acrescentou a touriga nacional ao encepamento que era só de baga. O Quinta de Foz de Arouce Vinhas Velhas de Santa Maria mantém-se igual, enquanto o Quinta de Foz de Arouce é já resultado da junção das duas castas.

Já tenho aqui elogiado os vinhos de Foz de Arouce. O que hoje apresento é uma edição especial e comemorativa. Trata-se dum vinho de 2007 produzido para celebrar os 200 anos da Batalha de Foz de Arouce, em que se destacou um familiar do actual Conde.

A Batalha de Foz de Arouce não foi um momento de importância transcendente, no âmbito da Guerra Peninsular (III Invasão Francesa). Há mesmo quem a designe apenas por Combate de Foz de Arouce. Aconteceu a 15 de Março de 1811, quando o exército napoleónico se retirava, pressionado pelas forças anglo-portuguesas. À frente dos aliados estava Arthur Wellesley (futuro Duque de Wellington) e dos invasores encontrava-se Michel Ney.

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Arthur Wellesley by George Dawe

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Andrè Massèna by Edme-Adolphe Fontaine

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Monument à 3ª Invasão Francesa in panoramio.com

Bussaco deu também o nome a um confronto da Guerra Peninsular, com maior importância. Aconteceu em 27 de Setembro de 1810 e à frente do lado anglo-luso esteve Arthur Wellesley e do francês o próprio comandante da III Invasão Francesa, Andrè Massèna.

Os aliados saíram vencedores em ambos os confrontos. Quanto aos vinhos, quem tiver oportunidade de os ter que não hesite. Enfrente-os e deixe-se conquistar. Vão vencer e os enófilos vão merece-los.

Noto que estou a evocar um vinho concreto e de um ano concreto e outro que nem referi o ano. Acrescento «todos» os Foz de Arouce e «todos» os Buçaco. E porquê? Porque são vinhos que merecem ser todos conhecidos, que mantém (obviamente que não bebi todas as colheitas, mas conheci muitas) as características identitárias físicas e a diferenciação dos anos. Néctares capazes de evoluir com o tempo e de viver longamente. A generalização é consciente e voluntária.

Sou avesso à enumeração de descritores que, quanto a mim, resumem o vinho a «coisa», porque se torna redutor. Os «pequenos vinhos» não surpreendem nas definições e os «grandes vinhos» ultrapassam essa contagem de características.

O Quinta de Foz de Arouce – Batalha de Foz de Arouce 200 anos (2007) tem o que se reconhece nos irmãos Quinta de Foz de Arouce e Quinta de Foz de Arouce Vinhas Velhas de Santa Maria. É mais do que as uvas, é «aquele lugar». Felizmente não é igual, pois não valeria a pena ter outro nome, seria apenas a diferença de rótulo. Bebi-o e continuaria por mais tempo se a garrafa não tivesse apenas 0,75 litro. Tem muitos anos pela frente.

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Quinta de Foz de Arouce Batalha de Foz de Arouce 200 years

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Buçaco L2004 Reservado

O Buçaco L2004 Reservado tem a grandeza que se espera. Grande em todos os aspectos, vivo e elegante e com muitos anos por diante. A garrafa tinha o mesmo problema que a anterior: apenas 0,75 litro.

Já agora explico a referência «L2004 Reservado»: por se tratar de vinho de mesa, a categoria supostamente mais baixa da escala, o Buçaco não podia trazer a indicação do ano. Porém, a designação do lote podia ser a que o produtor entendesse. Assim, os lotes destes néctares têm a mesma numeração do ano da vindima a que correspondem. A burocracia não é uma ciência exacta, muitas vezes é apenas estúpida. A inteligência vence. Porque é vinho de mesa não pode ser «reserva». Mas mais uma vez o burocrata foi fintado, a designação «reservado» não está contemplada nas objecções.

E assim se contou um pouquinho da História de Portugal.

Arundel, pelas terras de Pavia com Joaquim Arnaud

Texto João Pedro de Carvalho

Joaquim Arnaud, é um nome que existe desde 1883 e que tem vindo por tradição, a passar de geração em geração. É descendente de uma família Alentejana, de Pavia, ligada à Terra, e aí documentada desde 1515. A referida família, desde sempre se dedicou, ao montado, olival, vinha, cultivo de cereais e criação de gado (porcos, vacas, ovelhas e cavalar). As suas herdades situam-se nos concelhos de Mora e Arraiolos, distrito de Évora. Em 2010, como forma de potenciar estes recursos, Joaquim Arnaud, decide criar a sua marca personalizada, à qual atribui o seu próprio nome. O seu objectivo de negócio, assenta em apresentar ao mercado produtos seleccionados e de pequenas tiragens, em que se conjuga o artesanal com o sofisticado. É desta maneira que se apresenta o produtor Joaquim Arnaud, os vinhos que cria na sua adega falam por si, numa prova onde apenas me centrei nos exemplares oriundos do Alentejo, mais propriamente de Pavia.

Os seus vinhos exprimem uma vontade e um ideal, são ao seu gosto o que o levou a afastar-se do crivo da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana. Desta maneira não se sente apertado nem julgado, cria de forma livre os seus vinhos oriundos do terroir de Pavia. A sua gama de vinhos tem vindo a ser ampliada, nota-se que por ali não há pressa de lançar novidades nem novas colheitas, os vinhos apenas são dados a conhecer quando Joaquim Arnaud entende que é o momento. Por isso mesmo durante a prova oscilamos entre a força da juventude e os exemplares com os taninos já educados. Dos cinco vinhos apresentados decidi separar em três grupos:

Arundel Young 2013 e Arundel Petit 2012 são o exemplo da juventude e da força da fruta, ambos com aquela dose de austeridade a conferir muito boa energia ao conjunto. Ambos partilham o mesmo lote composto por Aragonez, Syrah, Trincadeira e Alicante Bouschet sendo que depois apenas varia o estágio em barrica, sendo de 6 meses para o Young e de 9 meses para o Petit. Vinho de perfil carnudo, denso, Alentejo bem presente com bouquet de qualidade a apresentar notas ameixa, amoras, especiarias, compota, boa frescura e pureza de aromas num conjunto que conquista e arrebata facilmente ao primeiro contacto. Vinhos que pedem comida por perto, carnes grelhadas são no momento o par ideal.

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Os Vinhos – Foto de João Pedro de Carvalho | Todos os Direitos Reservados

Mais recentes são as edições resultantes da parceria com a Trienal do Alentejo, a primeira edição é o Arundel 36 2009 que resulta de um vinho que ficou literalmente esquecido na adega, muito pouca quantidade da qual apenas resultaram cerca de 500 garrafas e cujo estágio total foi de 36 meses. Conjunto sério que mostra um misto de fruta doce com notas de mirtilo vermelho com morango e amoras, tudo fresco, perfume floral ligeiro com especiaria de fundo. Grande harmonia de conjunto, com uma boa passagem de boca, aqui num perfil mais aberto e menos concentrado mas a vincar todo o palato com sabores de fruta e especiarias. Termina amplo com ligeira secura na faceta gastronómica que é apanágio desta casa.

A segunda edição dá por nome de Arundel T&T 2012 de lote com base nas castas dos dois vinhos anteriores, apenas o estágio passa para 12 meses de barrica. O T&T para os mais curiosos são as iniciais da Trienal e da Terranagro (empresa produtora dos vinhos de Joaquim Arnaud). Mais um exemplar que conjuga finesse, frescura com a fruta neste caso menos presente dando lugar a um lado mais floral e especiado. A fruta vermelha e ácida, em tons de framboesas e mirtilos, surgem em segundo plano ao lado de um ligeiro terroso/grafite. Boca cheia de sabor, ligeira secura no fundo, muito cacau, folha de tabaco e fruta.

O culminar é o Arundel Great 2008, 400 garrafas com direito a um estágio de 12 meses em barricas mais 24 meses em garrafas num lote 100% Alicante Bouschet. Um tinto arrebatador ao primeiro contacto tal a finesse e lascividade com que se mostra. Pura classe, muita harmonia num vinho adulto e pronto a dar prazer, muito perfumado com a fruta sumarenta e fresca, inserida num bouquet de enorme qualidade onde tudo se mostra bem definido, nada beliscado pelo tempo apenas a mostrar que tem sabido evoluir para o melhor dos lados. Tal como todos os vinhos do produtor mostra um carácter bem Alentejano, a pedir mesa por perto, brilhando muito alto com umas perdizes albardadas.

Escondido 2012 – um cavalheiro lisboeta

Texto João Barbosa

Há pessoas que precisam de várias vidas. Uma delas é Aníbal Coutinho, que não se satisfaz com uma só tarefa. Canta no Coro Gulbenkian, é vitivinicultor, enólogo, consultor na área dos vinhos do Continente, crítico e autor de roteiros enogastronómicos, além de ter trabalhado como escanção, no restaurante Jacinto, em Lisboa. Todas estas actividades permitem-lhe uma visão ampla sobre o vinho.

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Aníbal Coutinho – Foto Cedida por Aníbal Coutinho | Todos os Direitos Reservados

Agora importa o seu vinho mais pessoal. Mais pessoal, porque as videiras que dão a fruta estão na propriedade familiar onde passa as férias. O primeiro Escondido a ser revelado foi o da colheita de 2006. Este é o quarto a mostrar-se ao mundo.

A razão de em dez anos só terem sido mostradas quatro edições prende-se com o facto deste vinho ser um projecto que, não sendo uma brincadeira, vive em torno da família e do tempo possível para os trabalhos agrícolas.

Não é uma brincadeira! Aníbal Coutinho leva-o muito a sério, em investimento pessoal, profissional e obviamente financeiro. Por outro lado, trata-se de um vinho de grande qualidade. Se a agricultura, a meteorologia e o dia-a-dia laboral não cooperarem, o Escondido fica em casa.

Além da família, há dois outros contribuidores importantes: Vera Moreira e António Ventura, enólogos do Grupo Parras. Aqui tenho de pôr um sinal! António Ventura é dos enólogos portugueses por quem tenho maior respeito. É um Senhor que lida com muitos milhões de litros. A enologia de ourives impressiona sempre, mas o trabalho de grande volume exige um rigor e concentração que nem todos saberão fazer.

A vinha, com 15 anos, situa-se no campo da bola usado nas brincadeiras familiares… um campo de futebol que não tem as dimensões máximas, que rondam um hectare. Tem as mínimas, 0,4 hectares. Mas Aníbal Coutinho garante que nem chega para futebol de salão.

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As vinhas – Foto Cedida por Aníbal Coutinho | Todos os Direitos Reservados

Não cabem 22 jogadores e quatro árbitros, mas encaixam-se as castas cabernet sauvignon, merlot, syrah e touriga nacional. A escolha das castas relaciona-se com as características atlânticas do clima da propriedade. Aníbal Coutinho inspirou-se em Bordéus e na sua viticultura, conta. A penúltima casta citada, oriunda das Côtes du Rhône, está plantada no interior da vinha, de modo a conseguir abrigo.

O terreno, com solo argilo-calcário, situa-se em Olelas, entre Sabugo e Almargem do Bispo, no Concelho de Sintra, na região de Lisboa. Em linha recta, o mar fica entre dez e 15 quilómetros, diz Aníbal Coutinho. Esta proximidade oceânica tem causado dissabores… uma desatenção e fica sem uvas. Acresce que não são feitos tratamentos, o que a torna ainda mais vulnerável. Eis a razão de em dez anos só terem vindo a público quatro colheitas.

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As vinhas – Foto Cedida por Aníbal Coutinho | Todos os Direitos Reservados

O Escondido 2012 estagiou 24 meses em madeira, divididos numa barrica usada de carvalho francês, uma barrica usada de carvalho americano, durante 15 meses, e uma barrica nova de carvalho americano, nos nove meses restantes do segundo ano.

Por razões históricas e, certamente também, por influência religiosa, os portugueses têm medo da palavra luxo. Mas as coisas são o que são. O Escondido é um vinho de luxo! Recebe todos os cuidados para que o seja, tem grande qualidade obrigatória e a quantidade é diminuta. Se o ano agrícola se perdeu ou se a qualidade não atinge o patamar que o produtor deseja, o vinho fica para ser bebido apenas pela família e amigos. O Escondido 2012 teve uma produção de 500 garrafas de 0,75 litros e 100 garrafas magnum.

A frescura do local sente-se no copo. É um vinho que quer que nos sentemos com ele à mesa, à volta de um prato substancial. É para ser bebido muito lentamente. O Escondido 2012 foi-me apresentando, no restaurante Jacinto, acompanhado por um cozido à portuguesa. Uma combinação muito feliz, pois trata-se duma refeição vasta em diversidade de carnes e de vegetais, que se não deixa comer em cinco minutos.

Um aspecto de notar é que, embora se bata na perfeição com um prato pesado, o Escondido 2012 não é um vinho de Inverno. Não o beberia com uma salada, mas não obriga a que tenha de ser servido quando a comida gorda reina nas mesas. É um vinho fresco e complexo, com grande elegância e com um final longo. Evolui muito bem com o passar do tempo em que decorre a refeição.

Tem tempo para viver, tem tudo o que é necessário para uma longa vida em garrafa. Não arrisco prazos, mas quanto a longevidade, Aníbal Coutinho pensa que poderá crescer até aos 20 anos.

Quintas de Melgaço – QM Homenagem Reserva 2014

Texto João Pedro de Carvalho

Rumamos à belíssima região dos Vinhos Verdes onde a casta rainha é a Alvarinho.

Video by QM – Todos os Direitos Reservados

É no terroir de Monção e Melgaço que nascem os melhores exemplares de Alvarinho e muito recentemente pela mão das Quintas de Melgaço foi lançado um desses exemplares de se tirar o chapéu. Por ali tudo começou há cerca de 20 anos pelo amor à terra natal (Melgaço) de um minhoto de gema de seu nome, Amadeu Abílio Lopes, fundador da Quintas de Melgaço e que foi recentemente homenageado com o lançamento deste QM Homenagem Reserva 2014. A Quintas de Melgaço junta paixão e tradição, são mais de 500 produtores da região que fazem chegar as suas uvas à adega. Das melhores uvas de Alvarinho do ano 2014 nasceu este precioso e raro vinho, que teve direito a passagem por madeira, com produção final a rondar as mil unidades.

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A Quinta – Foto Cedida por Quintas de Melgaço | Todos os Direitos Reservados

Correndo o risco de me repetir, há que chamar a atenção dos consumidores para a qualidade actual dos vinhos brancos criados nesta região de excelência. As provas no que diz respeito à qualidade e mesmo longevidade estão mais que dadas ano após ano. Um aviso que serve para os vinhos de todas as gamas, porque até nos vinhos ditos mais baratos as surpresas estão ao virar da esquina. A verdade é que a virtuosidade com que os brancos minhotos brilham à mesa é fantástica, mais ainda se tivermos em conta como acompanhamento de tudo o que é peixe ou marisco. Têm como que o toque de midas e há que salientar o facto de que a região não se ter deixado canibalizar por castas vindas de fora face às suas nativas Alvarinho, Loureiro, Trajadura, Avesso… pois souberam entender que é ali que elas brilham e nos sabem conquistar com toda a sua energia e perfume.

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QM Homenagem Reserva – Foto Cedida por Quintas de Melgaço | Todos os Direitos Reservados

Façamos pois a vontade a um vinho tão especial como este QM Homenagem Reserva 2014, que goza de uma fantástica energia e frescura. A casta faz-se mostrar com garbo e alguma ousadia, acutilante na acidez com uma boa austeridade mineral em pano de fundo. A madeira por onde passou confere aquele extra de complexidade, serena-lhe ligeiramente o espírito, de resto é daqueles brancos que precisa de tempo no copo mas essencialmente na garrafa para crescer ainda mais. Foi acompanhado por uma cataplana de cherne com amêijoas e mexilhões, de beber e chorar por mais.