Texto José Silva
A compra da Quinta da Boavista, em 2013, foi o segundo grande investimento de Marcelo Lima e Tony Smith no mundo dos vinhos em Portugal. Agora foi tempo de apresentar os seus primeiros vinhos do Douro.
Aconteceu no “Yeatman” e foi uma prova comentada pelos responsáveis da viticultura e da enologia da empresa: o Gonçalo Lopes, o Rui Cunha e o consultor francês Jean Claude Berrouet, com mais de 50 anos de experiência a produzir grandes vinhos no mundo, acompanhado pelo seu filho Jeff Berrouet. Esta junção entre portugueses e franceses revelou-se muito acertada, pois há como que uma complementaridade de opiniões e de experiências. A Quinta da Boavista tem uma história notável ligada ao vinho do Porto e foi local de refúgio do Barão de Forrester, que ali viveu algum tempo.
Com patamares muito altos, as vinhas são muito velhas e de acesso muito difícil, sendo ainda trabalhadas com recurso a machos e mulas, como se faz há centenas de anos. Um “terroir” incrível, que dá a tipicidade que tanto apreciamos nos tintos durienses, associado ás castas mais tradicionais da região: touriga nacional, touriga franca, tinta roriz, sousão, tinto cão, tinta barroca e alicante bouschet, a colocar estes vinhos tintos num patamar muito elevado. Berrouet diz que o vinho é um produto mágico, delicado, que transmite a história duma região e que a sua missão é transmitir-nos prazer quando o bebemos. É o que pretendem com os vinhos que ali estão a ser produzidos, transmitir as sensações que nos levem a interpretar aquele região e em particular aquela quinta. Todos os anos vão engarrafar um vinho de uma casta só.
Nesta primeira colheita, foi o Boavista Touriga Nacional 2013, um vinho cheio de elegância, souplesse, com personalidade e uma grande expressão aromática. Ao mesmo tempo é sóbrio, com estrutura, muito fresco e com óptima acidez, vai ser interessante acompanhar a sua evolução. Foram engarrafadas 2.000 garrafas que vão custar em prateleira cerca de 22€.
O vinho de combate vai ser certamente o Boavista Reserva 2013, um Douro típico no copo, um lote cheio de elegância, intenso, bom volume, com tudo no sítio. Bela acidez, levemente seco, guloso, um vinho gastronómico ainda jovem mas que promete, e de que foram engarrafadas 5.000 garrafas que vão custar cerca de 40€. Depois foram feitos dois vinhos extraordinários, de duas vinhas muito velhas, quase filigranas, a Vinha do Oratório e a Vinha do Ujo.
O Quinta da Boavista Vinha do Oratório 2013 é feito de uvas desta vinha que data dos anos 30 do século passado, plantada entre os 70 e os 160 metros de altitude com várias exposições solares. Apresenta muita complexidade, elegância, muita fruta madura, acidez concentrada e frescura, é intenso, ainda a evoluir, de que se engarrafaram menos de 1.000 garrafas, que vão custar cerca de 100€.
Finalmente outro vinho fantástico, o Quinta da Boavista Vinha do Ujo 2013, esta vinha plantada entre os 150 e os 200 metros, a proporcionar um vinho sedoso mas autoritário, sempre elegante e com alguma fruta no nariz. Belo volume de boca, óptima acidez, grande estrutura, sempre com muita elegância, fruta muito madura, longo e com imenso final. Um vinho de meditação, de que também só há cerca de 1.000 garrafas a menos de 100€ cada. Vinhos que nos transmitem o que é o terroir da Quinta da Boavista e que, como disse Jean Claude Berrouet, se resume a quatro palavras: os solos, o clima, as plantas e o homem.
Para apreciar os vinhos foi servido um jantar no “Yeatman” que teve um amuse bouche composto por quatro petiscos, depois um conjunto de crustáceos e sua espuma com caril e rebentos de cacau.
Seguiu-se o John Dory, um conjunto de sabores do mar, entre os quais percebes e polvo, com salicórnia. E finalmente a carne Marinhoa, grelhada, na companhia de creme de batata e especiarias.
Para sobremesa o creme de ruibarbo, com lima kafir, merengue de ruibarbo e gelado de queijo mascarpone. Um belo combate entre vinhos e pratos bem elaborados.
O dia seguinte…
No dia seguinte fomos convocados para o restaurante/marisqueira “Gaveto”, em Matosinhos. Apresentar as novas colheitas dos vinhos da Covela ao balcão duma marisqueira?! É verdade, foi mesmo assim.
Foi diferente e foi divertido. E dentro do balcão, quais empregados de luxo, estiveram o Gonçalo Lopes, o Vítor Mendes e o Rui Cunha, liderados pelo Tony Smith, nem mais. Porque os vinhos também devem ser servidos com humor. O primeiro foi o Covela Rosé 2015, feito só de Touriga Nacional, mantém o perfil aromático, a extraordinária acidez, a elegância e o requinte.
É fresco e seco, um rosé gastronómico. O Avesso de 2015 é extraordinariamente fresco, aveludado no nariz, algo exótico. Na boca mantém-se a frescura a que se junta uma acidez vibrante, incrível, o que faz dele um vinho guloso. O Covela Arinto 2015 tem a frescura da casta bem evidente, é persistente, muito elegante, tem alguma mineralidade, intenso, saboroso, com bom volume, um vinho íntegro.
As zamburinhas, na chapa, estavam soberbas, cheias de ovas. Veio então o Covela Escolha de 2014, com Avesso e Chardonnay, com requinte e elegância no nariz, sedoso, exótico, complexo.
Grande frescura e muita acidez a dar-lhe equilíbrio, um vinho especial, que fez óptima companhia ao soberbo arroz de lavagante, que é uma tradição deste “Gaveto”. Queijo da serra e pão-de-ló de Ovar fecharam as hostilidades, na companhia dum tinto da Covela de 2007 muito especial, já uma raridade. Com o café, ou com mais queijo e pão-de-ló, vieram duas aguardentes bagaceiras da Covela muito saborosas. Uma, feita a partir só de castas brancas, é mais aromática, mais floral e tem 40% de álcool. A outra, preparada a partir de castas tintas, é mais poderosa, mais encorpada e tem 50% de teor alcoólico. Potentes!!
Ao balcão do “Gaveto”, a conversa continuava animada…
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