Texto João Barbosa
Ler nomes não portugueses em rótulos de Vinho do Porto é tão banal quanto um português chamar-se Silva ou Santos. Os van Zeller vivem há tantos anos em Portugal que o apelido se tornou tão português quanto o meu.
Contrariamente à maioria das famílias «estrangeiras», os van Zeller não eram comerciantes, mas nobres. O registo mais antigo dos Zeller data de 1215, na Guéldria (Países Baixos). O primeiro de que há registo em Portugal é João van Zeller, cônsul da Prússia em Lisboa e que se casou no Porto, em 1687.
Em 1780 foi fundada a Van Zeller’s & Co para negociar Vinho do Porto, sendo vendida no século XIX. A história dá muitas voltas e as marcas foram oferecidas, em 2006, a Cristiano van Zeller, o chefe.
O factor mais importante, a quinta pertencia à família de Joana van Zeller, tendo um seu trisavô feito registo em 1868, mas a posse é mais antiga – ligada à muito antiga nobreza rural, com vínculos que chegam a ser anteriores à independência de Portugal (século XII). O «modelo» português de uso de apelidos é tão rebuscado, que teria de escrever 20 parágrafos para explicar.
Isto vem a propósito porque vinho sem história é uma coisa e com história é outra, muitas gerações de nobres e plebeus que construíram identidades únicas. Como dizem os vinhateiros Rothschild, no negócio do vinho, o mais difícil são os primeiros 150 anos.
São 12 referências, escolho cinco. Os CV (topo-de-gama), os VVV (novidade) e a Francisca. Situada em Sarzedinho, a propriedade chegou aos actuais proprietárias com apenas 19 hectares, dos quais dez com vinha, com 41 castas. Hoje são 45 hectares com Vitis vinífera, virados de Oeste a Este, passando por Sudoeste, Sul e Sueste. A enologia está a cargo de Cristiano van Zeller, Joana Pinhão e Sandra Tavares da Silva.
O CV Branco 2014 fez-se com umas duma só parcela, vinha velha situada a 600 metros de altitude, composta principalmente por rabigato, códega, donzelinho branco, gouveio, samarrinho e viosinho. É uma interessante junção de citrinos, algum anis, farmácia e terra, sendo volumoso e longo na boca.
O CV Tinto 2013 é um lote de 25 castas, onde se destacam donzelinho tinto, rufete, sousão, tinta amarela, tinta francisca, tinta roriz, touriga franca e touriga nacional, de vinhas com mais de 80 anos. É muito complexo de aromas e paladares; desde flores, a frutos do bosque, menta, especiarias, fumo de lenha de azinheira, terra… um paladar repleto de subtilezas, fresco, com «carne», volumoso, denso, elegante – até contraditório nos perfumes e sabores. Majestoso.
Quinta Vale D. Maria Vinha da Francisca Tinto 2013 é o vinho da herdeira, saído da parcela plantada quando fez 18 anos, em 2004. São 4,5 hectares com tinta francisca, sousão, touriga franca, rufete e touriga nacional. Elegante como uma princesa – qualificação já atribuída à «morgada».
Os triplo V: Vale do Rio Torto, Vale do Rio Pinhão e Vale do Rio Douro. Os três V, do numeral romano cinco, ilustram as 15 gerações de vinhateiros. O V que sempre identificou os melhores vinhos da família.
O Vale D. Maria VVV Valleys Branco 2014, castas não reveladas, é fresco e guloso, da fruta e da baunilha, na avaliação olfactiva. Longo e fundo na boca.
O Vale D. Maria VVV Valleys Tinto 2013, castas não reveladas, tem a gulodice da fruta vermelha e notas terrosas. É muito «fino», elegante e fundo.
V de vitórias!
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