Texto Sarah Ahmed | Tradução Teresa Calisto
O lema na Fita Preta é “why spend a lifetime trying to blend in, when you were born to stand out.” (porquê passar uma vida a tentar misturar-se, quando nasceu para se destacar). E assim é com os vinhos.
Veja-se a gama Sexy range – branding ousado (de mau gosto, alguns poderão dizer) num país que foi descrito como a nação Católica Romana mais socialmente conservadora.
Ou o tema deste post, os excitantes e desafiadores vinhos Signature Series, sobre os quais escrevo de seguida. Maioritariamente monocasta, estes vinhos desafiam directamente a tradição Portuguesa de misturar diferentes castas e, no entanto, noutros aspectos são absolutamente reverentes à tradição.
O homem por detrás da assinatura é António Maçanita, co-fundador da Fita Preta e produtor de vinhos. Perguntei-lhe sobre os desafios de ser diferente, o que aprendeu pelo caminho e o que vem a seguir. Naturalmente, também provei o mais recente lançamento da Fita Preta Signature Series que analiso abaixo.
A entrevista
Sexy mas não Kiss: o António tem reputação de ser um marketeer astuto, no entanto, com um portfolio de marcas tão diverso – Sexy e os quatro rótulos diferentes Fita Preta – parece que ignorou a mais antiga regra do livro – Keep it simple, stupid (K.I.S.S. – mantém as coisas simples, estúpido)
Como bem sabe, em Portugal é sempre com um ou dois beijos, depende de quem encontrar. E nós não somos diferentes. O nosso K.I.S.S. é só visto de um ângulo diferente, não “o mercado vai gostar daquilo em que acreditamos”, mas do ponto de vista que aquilo que acreditamos ser bonito, estético, divertido, que vale o esforço, desafiador, esperamos que depois o consumidor goste e partilhe do mesmo entusiasmo. Às vezes é como diz “não é simples”, e nós sabemos disso. Mas mais importante, é autêntico e nós só engarrafamos e rotulamos aquilo que podemos apoiar.
Dito isto, conforme fomos crescendo e lançando novos vinhos, tivemos que tentar organizar a nossa mensagem para o público, o melhor possível. Por exemplo, temos estado a separar a comunicação (website e redes sociais) para a marca Sexy do restante portfolio, porque é uma marca tão forte e um vinho tão vocacionado para festas que precisa do seu próprio mundo.
Finalmente, obrigada pelo elogio “marketeer astuto”. Adorei – para um produtor de vinhos que vem de uma família de professores anti comerciais e que nunca tinha vendido nada na sua vida antes do vinho, nem mesmo as suas velhas pranchas de surf, isso é óptimo.
A importância de um nome: voltando-nos para a marca Signature Series da Fita Preta, não é fácil cortejar o mercado das exportações com castas e regiões de vinho inéditas e impronunciáveis. O que o motivou a criar esta gama e a colocar o seu nome?
A Signature Series by António Maçanita é onde dei mais espaço a mim próprio para o teste e erro, para sonhar mais alto, para ir fora da caixa. Eu questiono os porque sins e porque nãos. É aqui que eu mudo o Mundo, mesmo que apenas um bocadinho, e assumo responsabilidade por isso.
A minha primeira signature foi Branco de Tintas 2008 (um vinho branco a partir de uvas tintas) feito de Trincadeira e Alfrocheiro. Fi-lo durante uma fase em que não havia suficientes uvas brancas no Alentejo para as necessidades do mercado. Então pensei, porquê entrar novamente na loucura de arrancar as tintas e plantar as brancas e porque não fazer brancos com uvas tintas? Fizemo-lo e o vinho foi muito bom. Acabou na lista de melhores vinhos do ano da nossa revista de vinhos local e foi um dos primeiros brancos a partir de tintas em Portugal. Agora há mais de uma mão cheia de produtores que o fazem. Mas o mais engraçado (ou não) é que não foi certificado como vinho Alentejano, porque era um vinho branco feito a partir de uvas de vinho tinto e no entanto, nesse ano, a região permitiu que os produtores usassem 20% de vinho branco de fora da região, sendo, mesmo assim, certificado como Alentejano… veja lá.
A partir daí, fiquei entusiasmado com as “talhas” (ânforas de argila). A ideia surgiu durante uma viagem de avião de regresso, depois de visitar uns amigos na Califórnia que estão a fazer um fantástico Sauvignon Blanc em ovos de cimento. Disse para mim mesmo, porque não usar as nossas “Talhas” que fazem parte do nosso património – um símbolo do Alentejo? Então quando cheguei, compramos uma “Talha” de 1940 de 1000 litros (a qual pagamos com 300 garrafas de vinho espumante). No entanto, decidimos fazer o processo de vinificação moderno (prensagem de cachos inteiros, fermentação a frio) em vez do tradicional “método Talha” que é com o contacto da pele. O resultado depois da fermentação foi simplesmente impossível de beber – “cera de abelhas” e “químico”. Engarrafamo-lo de qualquer forma dizendo “é o que é” e depois de 6 meses na garrafa, tornou-se incrível. A parte “química” ficou por trás do nariz dando ao vinho camadas do estilo Riesling e a fruta veio para a frente do palato – muito fresco e limpo. Ainda é um dos meus preferidos e um hino à história Alentejana.
A partir daqui o papel da Signature passou a ser o de salvar uma casta quase extinta, “Terrantez do Pico”. Está agora em boa forma, a ser replantada por todos os Açores. Também estou a testar outra uva açoriana “Arinto dos Açores”, fazendo um “Branco de Indígenas” puro (um branco sem fermento inoculado, nem controle de temperatura) e finalmente, trazendo de volta o Castelão.
A completar um ciclo? Recordar a tradição (seja de castas, do processo vinícola ou do estilo do vinho) é um dos cunhos da Signature Series da Fita Preta. O que aprendeu ao investigar o passado e em que aspectos, se algum, adaptou a tradição aos gostos contemporâneos?
Enquanto país do velho mundo produtor de vinhos, nós introduzimos muitas novas técnicas – aço inoxidável, fermentos seleccionados, castas estrangeiras, vinhas completamente varietais, vinhos direccionados para o consumidor, etc. Isto levou a uma melhoria geral dos nossos vinhos, tanto tintos como brancos, mas também retirou um pouco da “alma” dos nossos vinhos – o que dava aos vinhos um sentido de lugar quando os provamos. O desafio é complexo. Está entre escolher o que trazer de volta, que pode acrescentar complexidade e tipicidade e que novas técnicas aplicar, mantendo sempre em mente que também somos parte da história.
O Potencial do Pico: eu visitei recentemente os Açores e fiquei surpreendida pela qualidade e carácter distintivo, mineral e salgado dos seus brancos secos, e também ao aprender sobre o Arinto dos Açores e o Terrantez do Pico, quando pensava que o Verdelho (em estilos mais doces/fortificados) era o pilar principal da produção.
O potencial dos Açores é incrível. As castas Verdelho (a verdadeira), Arinto dos Açores ou Terrantez do Pico são de um potencial enológico incrível. São minerais e salgadas e, com boa acidez, têm excelente potencial de envelhecimento. O terroir é único, com rocha vulcânica, proximidade ao oceano e tempo frio a moderado. Esta combinação é explosiva para grandes vinhos brancos. E concordo que este novo lote de 2013 mostra precisamente isso.
Acredito também que os vinhos fortificados sérios, que forjaram a reputação do Pico no passado, verão um renascimento. Como as listas e até os menus de banquetes reais mostram, rivalizou com o melhor Madeira em mercados como Reino Unido, Holanda, Estados Unidos e Rússia. Era conhecido em alguns mercados como Pico-Madeira por causa desta semelhança.
E a seguir?
Muita coisa! A nossa marca Sexy tem visto um grande crescimento no vinho espumante de “método tradicional” na França e nos Estados Unidos. Para Fitapreta, Palpite e Preta, um quarto das nossas vinhas estão agora em conversão para a certificação orgânica. Nos Açores, estou a trabalhar de perto com outros produtores e com o departamento agrícola, ao mesmo tempo que desenvolvemos o nosso projecto de produção própria nas ilhas. E depois há os meus projectos de consultoria nas Quinta de Sant’Ana, Cem Reis e Arrepiado Velho entre outros.
The wines
Fita Preta Signature Series Branco de Talha by Anónio Maçanita 2012 (Vinho Regional Alentejano)
Talha é uma referência a uma tradição de produção vinícola muito tradicional, que data da presença Romana no Alentejo há muitos anos atrás. Talha significa que o vinho foi fermentado numa ânfora – só uma neste caso – uma ânfora de 1000 litros de 1946. E mantendo a tradição, este vinho fica-se pelas castas brancas clássicas da região – Roupeiro (70%) e Antão Vaz (30%). Ou pelo menos estas dominam o vinho onde (invulgarmente) a fruta provém de uma mistura de vinhas de 25-30 anos, das castas locais. Fui surpreendida pela palidez do vinho e pelo seu nariz tenso, até que me apercebi que tinha sido transferido para tanques de aço inoxidável depois de 28 dias (as ânforas são mais porosas que um tanque, o que resulta numa maior oxidação). Então a que sabe este vinho invulgar – um blend das técnicas tradicionais e modernas? É sofisticado, com bastante aldeído o que poderia ser um desastre, mas neste caso é positivo, fazendo um vinho vivo e mercúrico, de uma complexidade e frescura semelhantes ao xerez, com noz fresca, verde. Uma textura almofadada acrescenta à sua sensação de leveza, trazendo ao mesmo tempo peso. Um final longo revela as notas a terra que o atravessam. Muito interesse aqui, um vinho de ying e yang, que afasta e puxa. Gosto da sua energia, complexidade e persistência. 1300 garrafas produzidas. 13.5%
Fita Preta Signature Series Branco de Indígenas by Anónio Maçanita 2010 (Vinho Regional Alentejano)
Branco de Indígenas é uma referência ao facto de que este monocasta Arinto, foi fermentado em barrica (carvalho Francês) com fermentos 100% naturais/indígenas. Com a sua acidez limpa e revigorante, o seu palato cítrico focalizado, penso no Arinto como no Riesling de Portugal. Mas a vinificação traz outra dimensão à uva. Ou mais precisamente, traz uma maior dimensão, alargando o palato, tornando-o menos sumo de citrino, mais casca de limão e, como a casca de limão, tem uma qualidade textural – uma qualidade cremosa que associo aos fermentos naturais, talvez também uma função das borras/agitação das borras? O vinho é mais salgado também, com massa azeda e torrefacção de carvalho (gosto a noz). Pessoalmente gosto de ver um pouco mais de fruta e energia, mas para quem gosta de textura, tem um langor atractivo e sedoso. 800 garrafas produzidas. 12.5%
Fita Preta Signature Series Arinto do Açores 2013 (Vinho Regional Açores)
O Master Sommelier João Pires seleccionou este branco tenso para uma prova no 10 Fest Azores – uma mostra brilhante dos produtos da ilha e do talento dos chefes locais e internacionais. É um exemplo super intenso e revigorante, com um nervosismo fantástico e a textura subtil das borras que associo aos seus vinhos. Firmemente enrolada, a sua fruta “limonada” é disparada com minerais e sal, tão enérgico e picante que correu muito bem com o primeiro prato de cracas polvilhadas com paprika e sapateira com vichyssoise do Head Chef do hotel The Yeatman, Ricardo Costa. Tinha o peso e a intensidade para igualar este prato, apesar da sua pronunciada linearidade. 13.5%
Fita Preta Signature Series Terrantez do Pico by Anónio Maçanita 2013 (Vinho Regional Açores)
Palha pálida com noz doce, ligeiramente “axerezado” (aldeído), nariz salgado, um toque de iodo e casca de toranja também, todas estas notas transportadas num palato texturado, encerado e completamente seco, juntamente com notas de maçã castanha/pisada. A acidez relativamente firme traz enfoque e extensão. Menos consensual que o Arinto dos Açores, mas com qualidades que me lembraram o Loire Chenin, mais especificamente o mais muscular Chenins from Anjou (apesar de não ser tão frutado), não lhe falta estrutura nem carácter. Muito bom. 25% deste vinho foi fermentado em barricas de carvalho (presumo que barricas antigas) durante 9 meses com battonage semanal. Produzidas apenas 646 garrafas numeradas – a minha amostra foi a garrafa número 534. Ainda mais raro quando consideramos que estas 646 garrafas são as únicas garrafas de Terrantez do Pico varietal que existem (exceptuando a colheita anterior de Maçanita). E para explicar isto um pouco mais, menos de 100 vinhas desta casta praticamente extinta, existem fora da colecção dos serviços agrários. 13%
Fita Preta Signature Series Tinto de Castelão by Anónio Maçanita 2010 (Vinho Regional Alentejano)
A casta Castelão pode ter sido colocada no mapa pela marca Periquita de José Maria Fonseca, da Península de Setúbal mas, de acordo com Maçanita, Castelão teve origem no Alentejo, onde permanece a terceira casta mais plantada. Tendo em atenção o antigo ditado que Castelão “precisa de tempo”, Maçanita deu à uva isso mesmo – este vinho foi macerado durante 30 dias após a fermentação, estagiou em barrica durante 24 meses e em garrafa durante 20 meses, antes de ser lançado. É um tom de rubi translúcido, com um nariz doce de cinco especiarias e frutas vermelhas de Verão. Na boca é impressionantemente fresco, com um palato de Pinot Noir de cereja vermelha e groselha crocante e precisa, e taninos firmes de fruta picante (tão mais tensos e secos que o carvalho) e uma baforada de charuto. Um final muito longo e persistente, revela notas atractivas e complexas de campari e chocolate de leite. Com tempo no copo e à medida que vai aquecendo, torna-se rico, mais encorpado, mais achocolatado. Pessoalmente servi-lo-ia um pouco fresco para manter a tónica na fruta vermelha e a frescura que tanto admirei. 2636 garrafas, a minha, a garrafa 28. 14%
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