Posts By : João Barbosa

Herdade de Rio Frio Branco 2013 e Herdade de Rio Frio Tinto 2013

Texto João Barbosa

Sou um nostálgico, ou não tivesse seguido o estudo de História. Não há futuro sem presente, nem presente sem passado. O tempo não retrocede, mas de trás podem colher-se conhecimentos úteis.

Não foi apenas a proximidade de Lisboa, capital e maior centro de consumo do país, que ditou que a margem esquerda do Tejo fosse farta em vinho. Quando uma vinha atinge 4.000 hectares não há acaso. Quem gosta de história que espreite o sítio na internet, que tem para ler.

A Herdade de Rio Frio – certamente uma das maiores propriedades rurais portuguesas (possivelmente já foi mais vasta), com 5.200 hectares – teve a maior vinha do mundo. Hoje são 118 hectares de vinha nova.

O negócio de outrora – décadas – é muito diferente do que o de hoje; o mundo mudou. Antigamente, a quantidade era o objectivo primeiro. Hoje, a empresa aposta no segmento «premium» e na exportação. A enologia está a cargo de Mário Andrade.

A estreia fez-se com um branco e um tinto, ambos classificados como Regionais Península de Setúbal e da colheita de 2013. Mais tarde virão néctares com Denominação de Origem Controlada Palmela e – ainda bem – Moscatel de Setúbal e Moscatel Roxo de Setúbal.

A prova dos dois vinhos deu-me juízos diferentes. Não me refiro a qualidade, mas ao monstro totalitário da subjectividade que me ataca quando escrevo opinião. Tem a ver com o branco, e já explico.

O Herdade de Rio Frio Tinto 2013 dá prazer a quem gosta de vinhos com calor – não estou a dizer nem sopa nem compota – no carácter, mas frescura na boca. As uvas que tem no lote são conhecidas, ainda que uma delas comece agora a dar muitos mais sinais de vida fora do Douro: a touriga franca.

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Herdade de Rio Frio tinto 2013 in www.rio-frio.eu

Quanto a mim, a touriga franca é a melhor casta tinta portuguesa e que explica o «fenómeno» do Douro. Não é uma variedade solista, é «a equipa», que faz jogo, puxa pela equipa, recupera bolas, recua para defender e lança o contra-ataque. Aqui representa 30%. A syrah deu muito boas provas no Alentejo e a localização da Herdade de Rio Frio é também ela quente, representa outros 30%. A merlot surpreendeu-me e os seus 40% dão brilho.

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Herdade de Rio Frio branco 2013 in www.rio-frio.eu

Já o Herdade de Rio Frio Branco 2013 sofre do «elemento patogénico» designado por antão vaz. Se a casta tem tantos adeptos e vinhos tão elogiados, quem estará a ver mal serei eu, mas estou aqui para dizer o que penso.

Os enólogos têm percebido que «abominável» melhora com a arinto – para mim a melhor uva branca portuguesa – que dá vida e boas maneiras «à coisa». Fez-se com antão vaz (30%), arinto (30%), fernão pires (20%) e verdelho (20%) – uma equipa de calor e frescura. Um vinho equilibrado.

Tenho um amigo que garante que o melhor Vodka-Vermute se faz da seguinte forma: deita-se o vermute no copo e despeja-se todo. Depois coloca-se o vodka e bebe-se. É o que penso da antão vaz… talvez mais ainda. Reconheço que tenho bebido bons vinhos com antão vaz, em todos eles um factor comum: não se sente «a famigerada».

Foi calor enjoativo da antão vaz o que me entristeceu neste vinho, que globalmente apreciei. Sou provavelmente hiper-sensível… e reconheço que o problema deve ser meu e não do mundo. Quem gostar desta casta terá aqui prazer.

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Sociedade Agrícola de Rio Frio S.A.
Herdade de Rio Frio
2955-014 Pinhal Novo
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Fax: (+351) 212 319 629
E-mail: riofrio@rio-frio.eu
Website: www.rio-frio.eu

O vinho é amigo e o psicólogo é psicólogo

Texto João Barbosa

Por motivos de saúde, que não vou partilhar a razão, fiz análise face-a-face e psicanálise. A minha experiência não cabe na piada, certamente com muitos exemplos de verdade, de que o paciente fala e o analista adormece, boceja ou pensa que ainda tem de ir ao supermercado.

Garanto que não. A minha analista, que vou manter em recato, é a melhor do mundo! Não que eu tenha feito análise com todos os analistas do planeta, mas porque é verdade. E uma verdade é uma verdade. Uma verdade nunca se irá desmentir ainda que elementos da investigação possam indicar um outro caminho… é como as mães: «melhor do mundo»!

Quem fez análise, com um bom profissional, percebe o que estou a afirmar. Ajuda muito ter alguém que, não sendo família nem amigo nem colega de trabalho, nos ajuda, com conselhos não vinculativos, fazendo de espelho, colocando questões, obrigando-nos a pensar.

Dizer que as depressões, os esgotamentos ou os vícios não se curam, no todo ou em parte, com apoio de especialistas não sabe o que diz. Há quem diga que são males dos ricos, dos ociosos e preguiçosos, dos tolos, etc.

Não! Não! E não! Mas uma coisa é certa; a análise não se realiza em cinco sessões e depois recebe-se alta. É cara. O caro é sempre relativo. Se temos uma qualquer doença e se o tratamento custa muitos euros, esse dinheiro acaba por não contar. Todavia é uma soma considerável, cada um sabe da sua algibeira e cada psicólogo tem o seu preço por consulta.

Os psicólogos não fazem a vez da família nem dos amigos. Embora se criem relações emocionais e afectivas, o psicólogo é um profissional especializado.

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in pt.forwallpaper.com

Os amigos são como o vinho – em toda a crónica escrevo «vinho», porque é essa a bebida a que estou ligado na Blend, mas o correcto é afirmar «álcool». Dão apoio, mas não ajudam a curar. Com o vinho é quase a mesma coisa. Uma festa sem vinho promete ser uma chatice – claro que há os abusadores e aqueles que, devido a alcoolismo, têm de se abster.

O vinho dá alegria, solta-nos, desbloqueia conversas, faz rir. Que bom ter uma conversa a quatro: «eu, o amigo e dois copos». Penso que um pifo, de vez em quando, pode ser positivo. Desde que seja de vez em quando e a seguir não se tente conduzir o automóvel ou trabalhar com máquinas ou cirandar na sua proximidade.

Podemos ter amigos ou compinchas no local de trabalho, mas trabalho é trabalho e conhaque é conhaque. No serviço estamos a cumprir uma missão, que será remunerada no final do mês.

O que escrevi acima acerca do pifo «higiénico» é absolutamente questionável e condenável para muitos. Não é um dogma. O amigo que nos dá o ombro para chorar ou o abraço de alegria pode ser tão desastrado quanto o excesso de álcool, apesar da generosidade.

O vinho ajuda a esquecer? Tirará algum peso, mas não apaga a memória. O vinho faz uma festa? Certamente que, sozinho, não a faz. O vinho, para um enófilo como eu, é um amigo. Não é o cônjuge, com quem se partilha a cama, a mesa, as tarefas domésticas e as contas.

Dizem muitos médicos que beber um copo de vinho às refeições (ou só numa), faz bem. Dizem sempre tinto, pelo que suponho ser por essa substância válida esteja na película. Se assim é, talvez comer uvas seja mais saudável.

Uma outra situação, essa muito grave e porta larga para o alcoolismo, é matar a sede com vinho. O álcool, além de poder criar estados alterados de consciência, em excesso é nocivo, de curto a longo prazo, além de desidratar.

A água é o melhor líquido para matar a sede. Não há melhor. A água é a melhor bebida do mundo. O vinho pode ser um bom amigo ou uma má companhia. É amigo, não resolve. Para resolver há a água e o psicólogo.

Viva a Crise!

Texto João Barbosa

A quem andam os bons produtores a vender o seu vinho? Ponto prévio: o que é isso de ser um bom produtor? Englobo neste universo aqueles que têm esmero, empenho e brio. Que têm um enólogo, residente ou não, consultor, ou não, que controla a produção, que tem equipamentos necessários.

Neste universo cabe muita gente, que faz vinho em todas as regiões, com diferentes estilos, com diversos preços. Oiço dizer, inúmeras vezes, que hoje não há vinho mau em Portugal… é mentira!

Se 95% do vinho vendido em Portugal custa abaixo de cinco euros, só por acaso inexplicável pode ter qualidade. Preço não traduz falta de qualidade, mas também não o seu oposto. O dilema com as médias é o dos frangos: comi um frango e tu não comeste. Entre os dois, comemos meio galináceo cada.

Os vinhos de um euro e picos desequilibram a média. É impossível ter rentabilidade com um produto feito com preceitos e vendê-lo a cêntimos – o euro e picos custa nas lojas. O país está carregado de gente, desde produtores individuais, empresas e cooperativas que fazem zurrapas. Algum desse vinho vai para destilação, não é chamado para as contas, outro é exportado para mercados da saudade e onde o padrão de exigência é baixo.

Coloco, exagerando, o limiar da qualidade nos três euros. Peço ao leitor enófilo que não vá a uma garrafeira, mas que dê uma volta pelas mercearias de bairro, por supermercados como o Minipreço, Pingo Doce ou Lidl e veja o que por lá se vende. Há muita oferta e, se perguntar ao um funcionário acerca de quantidade vendida e rotação, verá um mundo que pensa não existir.

Os portugueses não gostam de gastar dinheiro em vinho. É um produto menor, alimento dispensável… é como as mães: os miúdos gostam sempre mais do cão do que da mãe! Porquê? Porque a mãe está garantida. Tantas e tantas vezes só lhe damos valor quando é muito velhinha ou se libertou do corpo.

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Vinho © Blend All About Wine, Lda.

O enófilo questione os amigos, aqueles que bebem do vinho que leva para os convívios, quanto estão dispostos a gastar por uma garrafa. Refiro-me ao universo português e não ao grupo restrito de enófilos, beneficiários de enófilos e de quem tem euros disponíveis.

Mau vinho é o que há mais por aí. Infelizmente, o bag in box transformou-se no bad in box. A imagem não descola e quem se atrever a encher um saco com vinho razoável pode ter a certeza que dá cabo da reputação. As caixas vieram substituir o garrafão.

O enófilo que passeie não se fique pelas casas com enoturismo ou loja catita e minimamente cuidada. Procure o «vinho do produtor», aquele «purinho», talvez intoxicado com fitofármacos. Compre e beba! Faz bem, é educativo «calibrar o gosto».

Exemplos? O Vinho do Porto do Minipreço custa três euros e picos… acredita que é bom? Porém foi aprovado – uma vergonha absoluta. Ou marcas brancas do Lidl ou do Pingo Doce. À parte, o Continente tem vinho sem cadastro criminal.

Muitas zurrapas são fabricadas por produtores sérios. Porém, um contrato de muitos milhares e a cêntimos só se pode traduzir em sobras de sobras, refugo que poderia ir para queimar. Não se pode ter tudo! Se a cadeia de distribuição quer baratezas não pode esperar qualidade.

Num país que não valoriza o seu vinho – apesar de um vox pop concluir que temos o melhor do mundo – e não está disposto a pagar com justiça, a porta da rua é serventia da casa. Afirmo, categoricamente, que o melhor que aconteceu aos bons produtores foi a crise.

Se por cá, quem produz bem (muitíssimos) andava aos caídos, a roubar clientela em carrossel – levas-me o negócio e eu apanho o do outro –, a ser vigarizado por quem não paga, desde distribuidores a donos de restaurantes, a crise foi um Joker da Santa Casa, para alguns foi a taluda.

Pagam mais e pagam. Dá mais trabalho, tira horas de sono, mas há reconhecimento e gente disposta a pagar, e com justiça.

Para a mesa com Pouca Roupa

Texto João Barbosa

Há expressões engraçadas, que, de tão usadas, nem reparamos nem pensamos no que querem dizer… «Foi resvés Campo de Ourique» – o maremoto de 1755 quase chegou à colina de Campo de Ourique. Basta esta, pois não quero escrever um texto para almanaque.

No mundo da gastronomia – em que me centro apenas na componente vínica ou de outras bebidas – há igualmente expressões que dão jeito e, na pressa de se dizer o que se quer, o maremoto leva-lhe parte.

A minha expressão favorita é a do «vinho de piscina». A imagem é maravilhosa – mesmo não pensando num tanque cheio de vinho. Calor, sol, família e amigos. Tudo jóia! Mas… quantos de nós têm piscina ou conhecem alguém com piscina?

Infelizmente não tenho piscina. Azaruncho privado. Outra imagem é do vinho para depois da praia, quando as senhoras se enrolam nuns panos coloridamente desbotados e os homens enfiam os pólos tronco abaixo, contorcendo-se com a canção desagradável do sal, algodão e pelo.

Estiraçados nas cadeiras da esplanada – nas férias tudo é permitido – a ver o mar e o sol a pôr-se, bebendo um «vinho para depois da praia». Tudo jóia! Mas… quantos de nós tem arcaboiço para beber um copo de vinho entre a areia e a casa? Além da questão do volante… Ao jantar, é diferente. Mas, «vinho para depois da praia»?!

Não importa! «Vinho de piscina» e «vinho para depois da praia» são expressões fantásticas. E vêm a propósito de quê? Da nova marca de vinhos de João Portugal Ramos. É um achado!

«Pouca Roupa»! Duas palavras que sintetizam o que já era sintético: «vinho de piscina» e «vinho para depois da praia». Confesso que ao saber do «Pouca Roupa» lembrei-me de toda uma gama: Biquíni (bivarietal), Monoquini (monocasta), Triquini (três, claro)… já Tanga e Sunga… Nudismo, depois de esvaziada.

O que conta esta marca, que se veste de «negro, branco e rosa»? Desde logo um prazer fácil, directo ao assunto. Todos eles, mas uns mais felizes do que outros, o que é normal. São os três Regional Alentejano e referentes à vindima de 2014

Pouca Roupa tinto 2014

O Pouca Roupa Tinto 2014 é um alentejano temperado com Dão… ok, touriga nacional. A touriga nacional é do mundo, pelo que também do Alentejo, onde ocupa áreas significativas. O lote é composto ainda por alfrocheiro e alicante bouschet.

Ora o que tenho a dizer: 14% de álcool é demasiado. Sendo que tem acidez que o aguenta, o organismo não quer saber. A graduação é elevada se pensarmos em «pouca roupa». Só lhe aponto a graduação, é prazenteiro.

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Pouca Roupa branco 2014

O Pouca Roupa Branco 2014 é um alentejano diferente, em que viosinho, sauvignon blanc e verdelho se orquestram nos sentidos. Mais uma vez, boa acidez e a pedir comida leve. Aplaudo os seus 12,5% de álcool.

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Pouca Roupa Rosé 2014

O Pouca Roupa Rosé 2014 fez-se com uvas touriga nacional, aragonês e cabernet sauvignon. Guloso! A acidez mais do que aguenta os 13% de álcool. Porém, parece-me uma percentagem excessiva, quando penso em «pouca roupa».

Agora resta esperar que a Primavera seja simpática e o Verão seja amigo. Que o tempo de prazer não signifique maldade para as lavouras. Fiz a primeira recomendação a um amigo que tem piscina.

Contactos
João Portugal Ramos Vinhos S.A.
Vila Santa
7100-149 Estremoz
Portugal
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Mais generosos do que os outros

Texto João Barbosa

Confesso que não entendo a diferenciação de vinhos em generosos e licorosos, quando são basicamente o mesmo. A diferença nem é subtil, pois os termos diferenciam a nobreza da plebe. Os generosos produzem-se em regiões demarcadas e os licorosos têm direito a Indicação de Proveniência Regulamentada ou apenas de mesa.

Nem é bem assim! Generosos são os Porto, Madeira, Setúbal e Carcavelos. Obviamente, há simples licorosos melhores que alguns generosos.

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Vinho da Península de Setúbal

Ignorando a questão semântica – e «generoso» é «todo» o vinho – importa notar a capacidade dos portugueses para fazerem estes néctares. O processo é «simples», por isso há múltiplas imitações – quase todas com dolo – mas não é como cozer ovos. O Vinho do Porto é a vítima óbvia. Uma sina que só lhe reforça a importância.

Há quem classifique os vinhos de colheita tardia – exemplos máximos são os Tokaji (Tokay, na antiga nomenclatura) e os Sauternes – como generoso. Penso que erradamente, pois os métodos são distintos. Não sou nem académico nem enólogo, pelo que nessa discussão abstenho-me e até reconheço que é uma niquice.

Cada boca, sua sentença! Nariz, idem. No mundo maravilhoso do vinho cabem castas e regiões, às vezes quase a mesma coisa. Do branco deslavado ao retinto, há néctares que preferimos.

De todos, fascinam-me os generosos (licorosos incluídos), são capazes de tudo. Do aperitivo à sobremesa, passando por entrada ou companhia de conversa. Neste rectângulo de continente e nos dois arquipélagos autónomos há uma multiplicidade de géneros.

As personalidades vêm das uvas, dos locais, das práticas do homem. Alguém escreveu, no século XIX, que há tantas variedades de Vinho do Porto como fitas num retroseiro. O próprio sítio na internet do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto não referencia todas as variantes… já quanto ao Madeira, penso que o seu estudo é como uma licenciatura.

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Vinho Madeira

Tenho um carinho especial pelo Vinho de Carcavelos, um monumento que a cidade de Lisboa – na sua dimensão metropolitana – tratou de corroer, deixando pouco para se fazer. A demarcação abrange partes do Concelho de Oeiras e do Concelho de Cascais. Haverá cinco quintas com vinhas aptas a fazer este vinho de perto do mar. Uma está a cargo de poderes públicos – Câmara Municipal de Oeiras e Ministério da Agricultura – e as outras vivem numa obscuridade muda.

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Vinho de Carcavelos

Disse-me o enólogo do município que, quando se avançou com a ideia de fabricar Carcavelos, não se conseguiu encontrar um fio condutor. Provadas muitas garrafas, cada produtor tinha o seu estilo.

Por um lado é bom, porque abre a janela à fantasia: «o que terá sido? Que bom seria se… Ah! Se eu pudesse…». Por outro deprime, porque é um espólio impossível de recuperar. Cinco ou seis quintas não desenham o retrato.

O Vinho de Carcavelos é uma espécie de lince ibérico ou de urso pardo. Só o poder político, através de acções de entidades públicas, pode intervir na sua preservação. O Ministério da Agricultura cede a terra e o Município de Oeiras faz o trabalho.

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Vinho do Porto

Não há um «melhor vinho do mundo»… mas em modos genéricos, temos dois dos maiores vinhos do mundo: Porto e Madeira. Lamentavelmente desconhecidos pela generalidade dos portugueses. Uma das muitas idiossincrasias…

É tão sensual – Taça vs Flute

Texto João Barbosa

Vinho é festa! Seja com o néctar mais plebeu ao estratosférico, no Ocidente costumamos festejar e brindar com vinho. Nem toda a gente gosta, nem todos têm um gosto sofisticado, instruído, esclarecido. Muitos não têm dinheiro para cumprir o desejo.

Além do vinho, da sua qualidade e preço, há a questão dos copos; um problema no universo dos meus amigos, pois nem todos têm uma relação tão profunda com o vinho, desconhecendo a importância que têm os vasos. Há os renitentes, por teimosia ou incredulidade ou por ignorância ou inexperiência, mas quem bebeu vinho por bons copos…

É um bocado como os talheres. Até muito tarde, os europeus comeram à mão. Um espeto com lâmina era comum nas mesas, fazendo as vezes de garfo e de faca. Apesar de o garfo ser um instrumento muito antigo, de muito antes do nascimento de Cristo.

Hoje, o garfo é tão comum e tão logicamente útil que pode parecer estranho como andaram os europeus a comer à mão até ao século XVI… XIX… XX. Consta que terá entrada na mesa do Rei de França através de Catarina de Medicis, casada com Henrique II.

O garfo substituiu o espeto de lâmina, mas não se lhe juntou a faca. Documentação fiável não há, não lhe deram importância à época, mas reza a lenda que foi no restaurante parisiense La Tour d’Argent que o par se fez.

A data da fundação não é certa, mas esta casa – ainda hoje existe, apesar da mudança de local – é tida como estabelecida em 1582. Terá sido aí que Henrique IV, consorte de França e Rei de Navarra, aprendeu a usar os talheres, o primeiro monarca a utilizá-los.

Luís XIV, seu neto, frequentava o La Tour d’Argent e já seria comum o uso dos talheres na corte. Porém, os faqueiros só começaram a surgir, nas casas abastadas, a partir de meados do século XIX.

Diz-se que o Rei Sol disse do Champanhe que era o «Rei dos Vinhos e o vinho dos Reis», um néctar nascido, em 1670, pela mão de Dom Pérignon. Este espumante não mais saiu de ao pé dos monarcas, que o bebiam por copos indiferenciados e obviamente disfuncionais.

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Taça de Champanhe

 

Há duas versões para o nascimento do primeiro copo lhe dedicado. A primeira taça de Champanhe terá sido moldada num seio da Rainha Maria Antonieta ou de Josefina de Beauharnais, mulher de Napoleão Bonaparte.

A ciência e o engenho provaram que a taça é inadequada para um vinho espumante. Como qualquer instrumento, a função é mais importante que a forma. Assim se criou a flute, flauta.

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Flauta de Champanhe

 

Se a flauta, com o seu timbre cristalino, combina com a delicadeza dos espumantes e mantém viva a alma do vinho… a taça, nascida na intimidade da realeza, é muito mais bela.

Com snobismo – assumida provocação, sem vontade de ofender – a flauta é burguesa, tem de se mostrar. A taça é fidalga, o ouro-velho da nobreza, discreto e recatado.

Se não convenci, volto aos talheres. A prata – com seu odor característico, requerendo cuidado no preparo para a mesa – nunca será derrotada pelo christofle, um material que ganhou o nome do joalheiro que o criou.

Uma taça é muito mais sensual do que uma flauta… e quem consegue manter num copo, por largo tempo, um delicado vinho espumante?

Sangue na Adega

Texto João Barbosa

Alguém disse – um famoso… político, escritor ou militar… – que um homem sem inimigos não tem préstimo, mais coisa menos coisa. Que saiba, não tenho inimigos, pelo que vou tentar arranjar alguns com esta crónica. O mote tem a cor do sangue!

O Vinho Verde tinto é um «produto» – detesto o termo aplicado a coisas bonitas como o vinho, pelo que aqui é mero recurso e não ofensa – vínico que muitos apreciam, muitos julgam que apreciam (provavelmente não beberam), outros afirmam gostar para serem simpáticos e outros abominam.

Estou no grupo dos que abominam o Vinho Verde tinto!

Atenção a este aspecto: a tradição merece-me todo o respeito, tal como a vertente étnica, verdade regional e carácter. O Vinho Verde tinto consegue todos estes pontos.Carácter é coisa que não falta a este vinho do Entre Douro e Minho. Enquanto enófilo, espero que perdure por muitos e longos anos, guardando as características que os seus amantes apreciam. Mas dispenso-o.

O pior que poderia acontecer – a este «produto» como a qualquer outro com autenticidade – é a perda de identidade, para se moldar ao gosto da moda ou da multidão. Peço aos vitivinicultores que deixem o Vinho Verde tinto continuar como até aqui, não cedendo nessa virtude que é a «verdade».

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Uvas de Vinho Verde na Vinha – Foto de Feliciano Guimarães | Todos os Direitos Reservados

 

Tenho 45 anos e faço parte duma geração, talvez na última urbana, que teve vinho à mesa: o copo ao almoço (durante a semana de trabalho e no fim-de-semana), o copo ao jantar, nas festas… Em criança não bebia, obviamente. Porém, as pândegas faziam-se com vinho e não com shots ou destilados – que apenas se bebiam nas discotecas.

Alexandre Dumas (Pai) foi, além de romancista de excepção, um gastrónomo de renome, com trabalho publicado, e ainda hoje o deve ser lido por quem gosta dos assuntos da comida, e defendeu que a comida dum local deve ser acompanhada com vinho da mesma proveniência.

A gastronomia é cultura, como as artes ou como os hábitos de trabalho ou os trajes. Para mim faz todo o sentido. Por isso, compreendo que alguns pratos do Entre Douro e Minho devam ser acertados com o seu vinho.

Outra coisa é gostar ou considerar como bom. Mesmo o «bom» é às vezes discutível. O Vinho Verde tinto tem uma grande acidez, é pujante e marca a boca. Este é um daqueles casos em que «bom» se traduz numa grande personalidade, que leva a paralaxes de entendimento. Heterodoxia não é só virtude nem só defeito. Não é consensual: há apaixonados, quem aprecie como acompanhamento preciso e lógico da comida da sua região de origem, e quem não lhe dê afecto, como é o meu caso… não gosto da casta vinhão e mesmo no Douro, onde lhe chamam sousão, a sua presença não me é simpática. Porém, defendo que se mantenha como é, porque autêntico. Bebe quem gosta e/ou percebe, dispensa quem sente comichões.

A tradição é o que é e também as características do que a natureza dá. Um dia queixei-me, a um amigo gastrónomo, dum café célebre que se serve numa, não menos famosa, «cafetaria» de Lisboa. Fui repreendido, porque aquele é «o melhor» café de montanha que há. Ora, ora… de que me serve ser «o melhor» se é desagradável?

O que é isso de «o melhor»? O que diz a «academia» ou o saber ancestral do povo ou o gosto pessoal? É tudo relativo. O meu amigo tem razão, num determinado ponto de vista: é preciso saber o que é para se poder compreender.

O Vinho da Madeira sofre todos os castigos que se podem infligir a um vinho. Quem o prova, desportivamente ou num concurso, deve saber que é um Madeira, pois o padrão tem de ser esse. Não se lhe pode exigir o que não é!

Um carro de Fórmula 1 é melhor do que um de WRC ou doutro que corre o Dakar? Cada um é melhor na sua categoria, são incomparáveis. Porém, há bons e maus Fórmula 1, WRC ou Dakar. Como no vinho. Há bons vinhos jovens e cheios de garra, como o Vinho Verde Tinto.

Nos últimos tempos, têm surgido vitivinicultores de referência a dedicarem-se à produção de Vinho Verde tinto. No entanto, mantenho o «desgosto». Nada a fazer! Serei sempre um herege, para os apreciadores.

As afirmações peremptórias – sempre, nunca, tudo, nada, etc. – são perigosas para quem as profere, pois há-de surgir uma, duas ou 20 excepções só para chatear a sentença. Pode ser o caso.

Escangalharam a cara da Uma Thurman – O Factor Fruta

Texto João Barbosa

Neste Fevereiro brotou, com brutalidade, um retrato da actriz norte-americana que lhe rouba toda a sensualidade intensa e felina. Meu Deus! Quem foi o carniceiro que se tomou por cirurgião plástico?

A abominável figura resultou de efeitos especiais, um misto de luz, pouca sombra e uma maquilhagem de deplorável gosto. Uma Thurman, nascida nesse belíssimo ano de 1970 (!), com metro e 81, serve-me de muleta para o tema do vinho.

Ouvi a um enólogo espanhol que na sua profissão há os fruteiros e os carpinteiros. Ou seja, os que privilegiam a fruta e os preferem o trabalho com madeiras. Provavelmente, haverá mais famílias, mas estas duas categorias servem-me.

Tenho notado haver – entre enófilos, críticos e escritores de gastronomia – uma grande valorização da fruta. Em parte, parece-me bem, uma vez que o vinho não se faz doutra coisa que não de fruta.

Vários procedimentos podem esbater, maquilhar, mascarar ou esconder uma verdade. Estragar é sempre mais fácil do que consertar, sendo que os remendos nunca serão exactidão. Há desastres nas adegas – que esfrangalham o vinho como a maquilhagem da Uma Thurman – e há bóias salva-vidas; se tiver um vinho mau e tiver de o vender, possivelmente o enólogo terá de recorrer a base e rímel para criarem efeito especial. Enganará principiantes e tolos, mas não gente com currículo e sabedoria.

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Fruit in cutcaster.com

É fácil gostar-se de fruta – o que não é bom nem mau – e às vezes só não chega. Entram artifícios para que se realcem notas de produtos industriais de fácil gosto. Não digo que seja bom ou mau, depende de como se apresente e onde se apresente – se é para fruição pueril, em fato de banho ou menos do que isso num jacuzzi, tudo bem. Se é para valsar, calça de ganga não é vestimenta que se queira.

A defesa da fruta parece-me bem em parte, porque resumir vinho a fruta é uma chatice. O aborrecimento decorre abundantemente da vontade e necessidade do produtor fazer negócio. Nada a opor.

O que me custa é quando essa naturalidade da fruta, ou das flores, se transforma numa caricatura. A demanda torna-se insana (!) repetidamente. Reparei que vários produtores do Dão estão a apostar na touriga nacional e evidenciando-lhe os aromas de violeta.

Um caso concreto: tenho bebido caricaturas de vinho do Dão. Caricaturas de touriga nacional. Os vinhos não têm nada de errado, estão bem-feitos e honestos. Mas a ânsia de alcançar um Graal e o trabalho para realçar as características do que a natureza dá criam coisinhas muitíssimo feias.

É como o maquilhador de Uma Thurman: o técnico não estragou nada, está lá tudo e não acrescentou nada que não se pudesse retirar. Porém, a actriz ficou horrorosa!

Sinceramente, a fruta – a frutinha – cansa-me. Ouvir elogios à fruta é para mim tão emocionante como o resultado dum jogo de futebol-americano – que, na verdade, deveria chamar-se andebol-americano.

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Oak barrels in en.wikipedia.org

Fruta significa fruta e muitas vezes é tão aborrecida como um barrote de carvalho dentro dum copo. Não sou caruncho, não me alimento de madeira. Todavia, a madeira faz-me falta nos tintos. Só entendo os «unoaked» como princípio «filosófico» ou «ético» – exagerando – pois o prazer é fraco.

Apesar de tudo, branco e tinto não são a mesma coisa. Como resumiu uma amiga:

– Se é para cheirar e saber a maracujá, prefiro um sumo de maracujá.

Se eu produzisse vinho, contrataria um enólogo carpinteiro… mas dava-lhe pouco dinheiro para não poder comprar muitas barricas.

Manual Técnico de Vinhos – Bom e útil, por isso feliz

Texto João Barbosa

Diz-se que o português é pessimista, fatalista… o fado e a saudade. Sabemos também que somos os melhores do mundo e que na festarola só não ganhámos aos espanhóis – escrevo isto sussurrando, não vá um «vecino» ouvir estas letras e começar a tirar proveito em risota.

Ouvi há uns tempos que somos um povo bipolar. Penso que há muita verdade nisso, pois oscilamos entre esse oito e oitenta. Porém, ao longo da história, o português tem demonstrado saber adaptar-se à realidade e ao mundo.

Como diz o povo: Tristezas não pagam dívidas! Nestes anos difíceis – que começaram ainda antes de 2011 e da Troika – o português mostra a sua fibra. A crise e a austeridade causaram e causam mossas, mas entre falências e desilusões, a verdade é que não quebrámos.

Coisas simples fazem maravilhas. Quando se está na mó de baixo, se atentarmos podemos encontrar ferramentas para consertar dificuldades. Coisas simples dão trabalho.

Há dias, foi publicado um livro de enorme utilidade para os empresários da restauração, da hotelaria e enófilos. De que vale haver conhecimento se não for transmitido? Ninguém nasce ensinado e temos a vida toda para aprender.

O Turismo de Portugal publicou o «Manual Técnico de Vinhos», com a finalidade de manual. É pena serem apenas 2.500 exemplares… espero que o sucesso seja grande, para que venham muitas edições e com muitos mais livros. E que sucedam novas obras, com mais ideias.

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Manual Técnico de Vinhos in turismodeportugal.pt | Todos os Direitos Reservados

O custo? É caro? É barato? Não sei das algibeiras dos outros, mas penso que uma ferramenta de trabalho não tem propriamente um custo. São dez euros para a comunidade escolar – suponho que de hotelaria – e 15 euros para o público em geral.

Posso argumentar com o preço que se paga por um combinado económico… uma simples refeição – sopa, meia dose, bebida e café – custa metade disso num desinteressante snack bar, que vende vinho – a preço acima do valor do conhecimento. Bom, deixo em paz as algibeiras e não tenho ordenados para pagar.

Como disse, é simples – o simples dá trabalho. A obra foi feita a cinco mão, quatro (oito) ligadas a escolas de hotelaria e turismo: João Covêlo (Porto), Luciano Rosa (Algarve), Luís Lima (Estoril) e Paulo Pechorro (Coimbra). Juntaram-se as do enólogo Carlos Freire Correia.

O simples dá trabalho. Este tem ainda o mérito de ter vários níveis de leitura. Penso que auxilia quem começa, relembra alguns pontos apagados, faz pensar a quem anda mais traquejado. Como os livros do Tintim: dos 7 aos 77 anos.

Ninguém pensará que existe uma árvore das garrafas e que algumas cultivares dão sumo de limão e outras vinho. Porém, quantos conhecem o processo desde a génese ao desarrolhar ou os diferentes procedimentos?

Logo as primeiras informações do «Manual Técnico de Vinhos» arejam algumas certezas, contextualizando a situação portuguesa no mundo. Depois, nele cabe desde a videira à percepção dos aromas e sabores. Termina com um útil glossário.

É coisa pouca? Não é. É simples? Só de ler. Além de meritória iniciativa, é um trabalho bem feito, em que «as coisas não são assim porque são assim», mas antes «são assim, porque…». Defeitos? Terá. Li-o célere e só notei que faltou um acento agudo em Francónia – região da Alemanha integrada no Estado Federado da Baviera.

Quando dei por mim estava a pensar em Oscar Wilde

Texto João Barbosa

Os portugueses desvalorizam o vinho e essa desconsideração é transversal a classes sociais e económicas. Indaguemos professores catedráticos, de ciências várias, acerca da hipótese de o vinho ser arte…

Já coloquei a questão diversas vezes e somei: o vinho pode ser alimento, negócio, produto indutor de alteração de estado de consciência e daí derivando para finalidade de dependência tóxica e doença aditiva, flagelo social e problema de saúde pública… arte, é que não – quase sempre.

Como só faz falta quem cá está e só é sábio quem pensa e se permite pensar, deixo-os na paz das academias. Dedico-me à afirmação de que o vinho é uma peça de teatro!

Todas as representações têm o mesmo texto de base, o elenco, o cenário e… nunca é o mesmo. E se acrescentarmos mais elementos – época, sociedade, companhia dramática – maiores serão as disparidades.

Vou contar uma experiência – extrema – que certamente a maioria dos enófilos já experimentou: abrir garrafas iguais duma colheita antiga. Lembro-me duma em que se desrolharam cinco garrafas «iguais», em que três estavam magníficas e diferenciadas, outra cansada e a quinta estragada. Desde esse ano de 1955 que a sua vida foi igual… todavia… porém… contudo… no entanto… mas…

Gosto muito de Camões e das suas sabedorias!

Os marinheiros que presenciaram um fenómeno eléctrico e meteorológico eram desmentidos por quem nunca sentira a água salgada na pele, agarrados aos calhamaços das certezas. Luís de Camões, na sua descrição da viagem de Vasco da Gama para a Índia, presencia o fogo-de-santelmo, descreve-o e desafia:

“– Vejam agora os sábios de escritura, que fenómenos são estes de natura.”

Envelhecer é uma arte, garante o cantautor Sérgio Godinho. É válido para os homens e para o vinho – uma peça de teatro em que os actores são bio-seres.

Há o encanto da juventude e o charme da experiência – como há também adolescentes alarves e idosos caquécticos e mal-humorados. Outro dia entristeci-me quando vi uma «amiga», com 46 anos, mais «jovem» do que quando tinha 17. A plástica correu-lhe bem, a ideia de a fazer tornou-a patética.

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O retrato de Dorian Gray in wikipedia.pt

O romance homo-erótico «O retrato de Dorian Gray», de Oscar Wilde – editado com censura em 1890 e em versão integral no ano seguinte – ocorre-me frequentemente quando penso em vinho com idade.

A beleza do sempre-jovem Dorian – que fez um pacto para se tornar eternamente jovial – contrastava com o envelhecimento e degradação do quadro, reflectindo a idade, o vício e a corrupção moral.

Quando o desejo me assalta para um vinho com idade, olho para a garrafa e imagino o único romance de Oscar Wilde. Que vinho ali viverá? O rótulo envelheceu na vez do vinho?

Nesta pequena fantasia não entram mais personagens, além de Dorian e seu corruptor; nem mesmo Basil Hallward, o artista que lhe apreendeu a beleza e o «entregou» ao hedonista Lorde Henry Wotton, que – como Fausto – o leva a cair… o único modo de nos livrarmos duma tentação é a ela nos entregarmos. O poeta usou o mesmo pensamento noutra vez: «Consigo resistir a tudo, menos a uma tentação».

Assim se traça o destino da garrafa de vinho velho ou de vinho antigo, o Dorian ou o seu retrato. Uns envelhecem e outros ganham charme. Citando novamente Sérgio Godinho: «Pode alguém ser quem não é»?