Texto João Barbosa
Bom dia, nunca gostei de usar um espaço de escrita de assunto concreto para escrever acerca da profissão – tal como não gosto de poemas de teorização acerca da poesia e do «mundo» dos poetas. Faço-o agora, porque neste caso tem relevância para o leitor.
A razão do tema, que não versa directamente o vinho e a gastronomia, é para alertar ao bom-senso do leitor. Nem tudo o que está nos livros é verdade, tal como nos jornais ou nos blogues.
A internet não matou nem vai matar a imprensa em papel, que está a ser testada pela Lei de Darwin: o mundo não é dos mais fortes nem dos mais inteligentes, mas dos que melhor se adaptam às transformações da natureza. Não vejo nenhum mal em si mesmo, mas a relação entre jornalistas e bloguistas ou críticos de sites na internet não é pacífica: angústias, sentimento de traição, de perda de «privilégio» (perda ou diluição de influência). Do outro lado, angústia, sentimento de menorização, incorrecta procura de conquistar o que não é seu, pois jornalismo e bloguismo não são bem a mesma coisa.
Não vou tentar esmiuçar pontos de vista, apenas que reconheço vantagens em ambas e que são compatíveis. A internet deu voz ao cidadão, que anteriormente só se manifestava por carta ao director da publicação.
O universo todo por explorar, a liberdade da humanidade. Porém, nem sempre a responsabilidade acompanha, como deve sempre, a liberdade. Por isso, na troca de beijinhos entre jornalistas e bloguistas vem a questão da idoneidade, da equidistância, da competência, da natação em mares de perigosa proximidade com interesses privados.
Estou muito à vontade nisto, pois sou simultaneamente jornalistas (26 anos) e bloguista (10 anos) e escritor de vinho (um ano) – sendo este último filho dos anteriores. O que me faz escrever agora foi uma crítica no poderoso The Times acerca dos Açores, particularmente da transportadora aérea SATA. Fiquei feliz porque encontrei o substrato da base do debate e por não ser comida e bebida.
Os bloguistas são, em todo o mundo, frequentemente vistos com desconfiança: quem são? Respondem a quem? Quem os «policia» editorialmente? Que códigos de ética e deontologia seguem?
É verdade que X% não sabe do que escreve, tem horror a estudar, sabe tudo e, nem que seja involuntariamente, premeia os bens que lhe enviam para comentar… «digo bem, pois assim garanto que me vão continuar a mandar KYXZ para pedir opinião. Tenho do que gosto e grátis e ainda dou sentenças».
Mas também é verdade que o mesmo se passa com X% de jornalistas e críticos (de meios «convencionais»). Em 26 anos de jornalismo conheci críticos de gastronomia, automóveis, cinema… até de tourada. Nem todos sabiam/sabem do que estavam/estão a escrever. Um dia quis confirmar que Fulano era um bluff e todo o seu conhecimento tinha a consistência de claras batidas em castelo. Fiz-lhe duas perguntas muito básicas e às quais não soube responder – perguntas tão elementares que eu, que do assunto percebo quase nada, sabia, como mais gente o sabe e não exerce esse ofício.
Não se tratava de crítico de comida ou de vinho. Como conheço bloguistas de várias temáticas que abastecem o ego através dos seus blogues.
Onde entra o The Times? Não há vencedores absolutos, mas o The Times é um dos mais influentes e credíveis jornais do mundo, como o The New York Times, The Washington Post, Le Monde, The Financial Times, The Wall Street Journal, etc.
Num texto de crítica acerca de viagens, o crítico sentenciou que a SATA (Serviço Açoriano de Transporte Aéreo) é a pior companhia aérea do mundo. Dá-me igual, não tenho nacionalismo no transporte aéreo nem voei alguma vez nesta transportadora.
Perante esta afirmação, devo deduzir que o crítico (jornalista) já voou em todas as companhias aéreas e o faz com regularidade para sustentar a afirmação. Calma! Não é esse «saber absoluto», afirmação peremptória e inequívoca, um dos pontos em que os bloguistas são mais atacados?
Ainda antes de a internet estar generalizada, um jornalista espanhol, do insuspeito El País (Espanha), veio a Portugal fazer uma reportagem pelo país. O senhor descobriu que, em plena década de 90 (século XX), o transporte de tracção animal era muitíssimo comum, tal como viajar a cavalo, de burro ou de mula.
Espanha fica ao lado e milhões de espanhóis conheciam Portugal. O ridículo com que quis achincalhar o país e os portugueses tombou todo sobre ele – creio que perdeu o emprego devido a essa reportagem ao século XIX.
Repito o segundo parágrafo:
– A razão do tema, que não versa directamente o vinho e a gastronomia, é para alertar ao bom-senso do leitor. Nem tudo o que está nos livros é verdade, tal como nos jornais ou nos blogues.
Um dia circulou um vídeo no Facebook que mostrava uma cena curiosa, que deixou muita gente a acreditar ou na dúvida. Um amigo, montador de cinema, resumiu o assuntou genialmente:
– Também vi o dedo do ET acender uma luz.
Cuidado com as imitações e com as certezas. Esperem aí, deixem-se ficar, que já volto a escrever sobre vinho.
Nota final: Embora não tenha sido para ganhar ofertas (felizmente nunca precisei de esmolas ou presentes), escrevi e sentenciei acerca dum tema para o qual não estava preparado: comida, restaurantes. Tomei consciência e deixei-me disso. Todos os textos foram retirados. Escrevo quando a insistência no convite torna falta de educação não aceitar – e tudo preto no branco. Aconteceu/acontece no âmbito do meu blogue, onde assumo que toda a escrita é pessoal e baseada no gosto. Sou crítico amador no blogue e cronista fora dele. Não sou nem quero ser crítico profissional, quero contar estórias.
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