Texto João Barbosa
O Dão está em fase ascendente. A região acordou e está a mexer-se. Como seria de esperar, haverá erros, nada é perfeito, mas só o facto de reagir já é um dado a aplaudir. Está a acordar e a marcar pontos, caminhando para o estatuto que teve outrora. Mérito da Comissão Vitivinícola Regional, mas só possível por haver produtores determinados em fazer bem e a conseguir retorno financeiro.
Carlos Lucas é um dos homens que encabeçaram a ascensão, com a sua passagem pela Dão Sul, hoje Global Wines, empresa hoje presente também no Alentejo, Bairrada, Douro, Lisboa e Vinho Verde, além do Brasil (Vale do São Francisco).
A Dão Sul surgiu em 1990. As marcas Quinta de Cabriz e a Quinta dos Grilos apresentaram-se com preços convidativos e com características de fácil agrado do consumidor. O sucesso levou a que extravasassem o berço.
Os vinhos da Quinta de Ribeiro Santo, situada em Carregal do Sal, confirmaram o acerto de mão de Carlos Lucas. O Dão de hoje seria diferente, talvez muito diferente, sem o trabalho deste enólogo.
A Quinta da Alameda é uma parceria entre Carlos Lucas e o empresário Luís Abrantes, com actividade na indústria de mobiliário (Movecho). A parte de viticultura está a cargo de Amândio Cruz. Situa-se em Santar, no concelho de Nelas. A área é pequena para os padrões europeus, mas acima da média da região. O domínio tem 50 hectares, dos quais 15 são de vinha.
Para os mais curiosos por números, em 2009, do total de 305.266 empresas agrícolas, 283.071 tinham menos de 20 hectares – número que tem vindo a diminuir desde 1979 (é 2,6 vezes inferior). A superfície agrícola utilizada também tem decrescido, embora em menor ritmo (1,4 vezes inferior). A região Centro, onde se situa o Dão, é das que têm dimensão mais reduzida.
Passo dos números para o que mais interessa. Os dois sócios mantiveram uma parte de vinha velha, onde estão várias castas misturadas, como era a tradição, e reconverteram outra parte, plantando alfrocheiro, baga, jaen, tinta roriz, tinto cão e touriga nacional.
Está situada numa zona onde a altitude vai dos 400 aos 700 metros, nas imediações da Serra da Estrela e do rio Dão. Traduzindo numa só palavra: frescura. A escolha das novas castas teve em conta a produção de espumantes.
A valorização da vinha velha, pela constatação da qualidade dos vinhos obtidos, criou uma moda. Quem tem vinhas com 30 anos diz que são velhas… para mim, vale o que vale, não são. Na Quinta da Alameda, a idade dessas plantas é de mais de 80 anos.
Carlos Lucas confessou não ser fã da casta jaen. Porém, na Quinta da Alameda mudou de opinião, em 2012. No ano seguinte vinificou-a separadamente. Estreou-se agora e já conto dele mais adiante.
A região do Dão tem uma categoria de classificação especial, que pode ser comparada com a de Vintage, no Vinho do Porto. Carlos Lucas diz desconhecer se alguma vez foi atribuída a «Dão Nobre» e prevê que dificilmente o poderá ser… mistérios que os vinhateiros guardam.
O Quinta da Alameda Tinto Reserva Especial 2012 foi apresentado a exame e não mereceu a distinção, como o leitor deve ter depreendido do parágrafo anterior. Ficou como Reserva Especial, o que, de alguma maneira, vai dar ao mesmo. Se o topo é inacessível, o patamar imediatamente abaixo ocupa-lhe o lugar.
A classificação recebida é justa! É um grande vinho e tem o que se espera do Dão. A região vive nestas garrafas, onde se guarda a memória vinda das vinhas velhas e a categoria reconhecida desde sempre.
O Quinta da Alameda Tinto Reserva Especial 2012 fez-se com uvas de alfrocheiro, tinta roriz, tinto cão e touriga nacional… uma pitada de baga, casta proscrita, pese a sua antiga presença no passado por aqueles lados. O vinho conviveu um ano com a madeira de carvalho francês e estagiou outros 12 meses em garrafa. É um vinho de enorme frescura, suavidade e elegância. Uma frescura que encobre os 14 graus de álcool – nem se dá por isso.
O Quinta da Alameda Tinto Jaen 2013 é uma boa expressão da casta. É um vinho didáctico em dois níveis: o que é a casta jaen e o que é um vinho do Dão – apesar de a tradição ser a de vinhos de mistura de castas. O estágio em barricas de carvalho francês durou um ano. É igualmente um tinto com frescura e que dá bom prazer, com a elegância pela qual a região era/é conhecida.
Como é de esperar, não mando nada na região do Dão, tal como acontece com as outras todas. Porém, penso que ao não validar vinhos como Dão Nobre, o painel de provadores não está a beneficiar ninguém. Seria uma boa ajuda para os consumidores mais antigos se reencontrarem e os novos apreciadores se aventurarem nas maravilhas que, de facto, existem na região.
Outras regiões poderão chegar primeiro a uma nova designação de superior classificação, beneficiando da primazia. Cada um sabe de si e dos seus negócios. Fica a minha opinião, que vale o que o leitor quiser que valha.
Lembremo-nos que em Bordéus, Borgonha ou Champanhe «nunca» há anos maus… ou são excelentes ou clássicos. As classificações de topo são usadas e França é o que é.
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