100 Anos de Moscatel de Setúbal by José Maria da Fonseca Cortes de Cima – Vidigueira

João Portugal Ramos – Vila Santa Reserva Tinto 2013 e Marquês de Borba Branco 2015

Texto João Barbosa

Estremoz é uma das minhas vilas favoritas – que me perdoem os seus habitantes, mas não me conformo com o facto de ter sido promovida a cidade. É que a palavra «vila» tem um encanto e um charme que cidade não tem.

Bem… Estremoz merece uma visita. Para mim, o Alentejo é a região portuguesa… o Douro dos socalcos iguala, mas quanto à paisagem das povoações tenho bastantes tristezas. O Além Tejo é completo e a melhor preservada região portuguesa, do Guadiana ao Atlântico, da fronteira com o Reino do Algarve até ao grande rio ibérico. Vale bem a pena tirar uns dias para conhecer este Sul.

A fundação deu-se durante o período da ocupação romana. O seu mais imponente monumento, o castelo, tem data incerta. A Direcção-Geral do Património Cultural aponta, sem certeza, para o período da crise dinástica, que levou ao trono Dom Afonso III, em 1248, filho segundo do Rei Dom Afonso II e Dona Urraca, filha de Dom Afonso VIII de Castela. É por via de Dom Afonso III que entraram os castelos no escudo heráldico de Portugal, derivado do brasão de seu avô materno.

Dom Afonso III foi quem completou a conquista do território continental português, em 1249, com a tomada de Faro. Foi o segundo monarca português a usar o título de Rei do Algarve, feudo meramente honorífico. Este soberano procedeu igualmente a uma importante reforma legislativa, as chamadas Ordenações Afonsinas.

Porém, a figura histórica mais apaixonante que se liga a este monumento é a de Dona Isabel de Aragão, Rainha consorte, casada com Dom Dinis, filho de Dom Afonso III. A Dom Dinis se deve a salvação dos Cavaleiros Templários, através da transformação da Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo Salomão na Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo, que iria levar, já na segunda dinastia, à criação do império português. Este monarca foi apelidado de «O Lavrador», pelo impulso que deu à agricultura.

À Rainha Isabel se atribuíram muitos milagres, tendo sido canonizada pelo Papa Leão X, em 1516. O seu mais famoso milagre foi o de transformar pão em rosas. Conta-se que distribuía secretamente pão pelos pobres e que o Rei intrigado com os rumores, que não lhe agradavam, a terá surpreendido quando levava o alimento aos desfavorecidos. Ao ser questionada acerca do que levava escondido no vestido, respondeu: «São Rosas, senho». Então, do seu regaço se deixaram cair bonitas flores. Maravilhas idênticas são atribuídas a Santa Isabel da Hungria, sua tia materna, a Santa Cecília e a Santa Zita.

O castelo de Estremoz foi uma das residências de Dom Dinis, tendo nele vindo a falecer a Rainha Santa Isabel. Hoje, o monumento é uma pousada, pelo que o visitante pode privar intimamente com um pouco da História de Portugal.

Vamos ao vinho, razão desta visitita escrita a Estremoz. Vem um branco e um tinto de João Portugal Ramos, enólogo e produtor que várias vezes tem sido sujeito de textos aqui na Blend – All About Wine.

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Vila Santa Reserva Tinto 2013 – Foto Cedida por João Portugal Ramos | Todos os Direitos Reservados

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Marquês de Borba Branco 2015 – Foto Cedida por João Portugal Ramos | Todos os Direitos Reservados

Vila Santa – Estremoz é terra de mármore e esta referência vínica bem a essa rocha pode ser comparada: beleza e solidez. Vila Santa Reserva Tinto 2013 é um dado seguro do Alentejo vinícola.

Digo seguro porque quem o compra sabe que leva um vinho que não o irá defraudar na qualidade. Tem aquilo que admiro no vinho: consistência de qualidade e de tradução do ano. Se existe uma fórmula, ela é a de escolher com critério as uvas, deixando à natureza contar a sua versão da vida. Elegante, fácil de nos perdermos nele e com uma acidez que nos desmente os 14% de álcool.

O Vila Santa Reserva Tinto 2013 resulta de um lote de aragonês, touriga nacional, syrah, cabernet sauvignon e alicante bouschet. A ficha técnica não indica a percentagem de cada casta. Deduzo que, por não estar em ordem alfabética, isso traduz o maior peso que cada cultivar tem no conjunto.

Uma parte das uvas foi pisada em lagares de mármore e outra em balseiros de madeira, seguida de maceração pós-fermentativa. O vinho estagiou nove meses em pipas de carvalhos americano e francês.

O segundo vinho é também um clássico que se renova. A marca Marquês de Borba é também uma garantia. Não oscila, é fiável. Pode gostar-se mais ou menos, mas o padrão não resvala. Agora escrevo sobre o branco, referente à vindima de 2015.

Ora, o vinho… É um lote das castas arinto, antão vaz e viognier. É um vinho que está mesmo a pedir que o Verão chegue depressa. Tem a virtude duma graduação alcoólica que, infelizmente, nem sempre existe: 12,5%. Assim, tem uma leveza que desafia as comidas mais frágeis e estivais, mas igualmente convívio de conversa e preguiça.

O baixo grau de álcool e a casta arinto fazem maravilhas. Penso que, tal como nas vindimas anteriores, se mostra ao gosto dos enófilos. Não é o «meu» vinho – reporto-me apenas ao factor «gosto», não critico a qualidade do néctar. A justificação é a «maldita».

Tenho um problema com a variedade antão vaz… pouco haverá a fazer. Não é um problema do vinho nem da cultivar, é a minha boca que não simpatiza com estas uvas. O meu elogio à arinto deve-se a senti-la como um antídoto à minha casta branca de embirração.

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