Posts By : João Barbosa

Grão Vasco Prova Mestra 2013

Texto João Barbosa

A região vitivinícola do Dão foi, durante muitos anos, um referencial de qualidade e onde nasceram marcas que garantiam qualidade, quando o país bebia sobretudo vinhos indiferenciados, a granel nas tabernas, do que vinha da aldeia quando o migrante interno lá ia matar saudades do berço.

O Dão não fugia à regra, mas puxando um bocadinho pela memória ocorrem-me alguns: Aliança, Caves Velhas, Constantino, Dão Pipas, Grão Vasco, Porta de Cavaleiros, São Domingos, Terras Altas, UDACA…

Em Nelas situa-se o Centro de Estudos Vitivinícolas do Dão, na Quinta da Cale. A designação, só por si pode parecer vazia de significado, mas é uma casa importante, instituída em 1946. Trata-se dum organismo dependente do Ministério da Agricultura, criado durante a ditadura do Estado Novo que muito promoveu o consumo de vinho. Ficou célebre a frase publicitária: Beber vinho é dar o pão a um milhão de portugueses.

O ditador António Oliveira Salazar, como homem de origens rurais, visitava a sua aldeia de Vimieiro, no Concelho de Santa Comba Dão. Gostava do vinho da sua terra e há imagens em que o serve a camponeses – apesar de tudo, penso que nisso era genuíno e não pose para as fotografias de propaganda.

O país era pobre – foi-o de facto até ao final da ditadura, em 1974 – e o vinho era uma fácil e acessível fonte de calorias. A agricultura tinha um peso enorme nas contas públicas e, dentro dela, o trigo e o vinho.

Quanto à pobreza, por vezes relativizada ou menorizada, cito que, em 1979, na Fonte da Telha – terra partilhada por Almada e Sesimbra, na Área Metropolitana de Lisboa – muitas crianças eram alimentadas a sopas-de-cavalo-cansado… vinho e pão. Não é mito, está documentado, incluindo em filme. Muito antes, possivelmente até talvez após o final da Segunda Guerra Mundial, era enorme o número de crianças descalças. E até adultos.

Assim se pode enquadrar a importância que o sector tinha no Dão neste departamento público. Quem teve oportunidade de provar e/ou beber vinho do Centro de Estudo de Nelas comprovou a excelência destes néctares, com uma notável capacidade de envelhecimento, tanto tintos como brancos.

Andando para a frente, a região do Dão decaiu muito nas preferências dos consumidores. O ressurgimento tem sido progressivo e, durante anos, motorizado pela Dão Sul (Global Wines). Hoje, ninguém nega a qualidade dos vinhos desta demarcação e têm surgido novos vitivinicultores.

A marca Grão Vasco é icónica e a Sogrape tem vindo a promove-la. Julgo que com bom resultado. Recentemente foi apresentado o Grão Vasco Prova Mestra 2013, um tinto feito com uvas da Quinta dos Carvalhais (mais de 50%), com 105 hectares, dos quais 50 são de vinha, sendo a parte restante comprada.

Grão Vasco Prova Mestra 2013 é um lote touriga nacional (36%), tinta roriz (31%) e alfrocheiro (33%). A fruta foi prensada em cubas de inox, onde ocorreu a fermentação alcoólica. Fez a fermentação maloláctica em barricas de carvalho francês, tendo estagiado durante 12 meses. Antes de sair para venda, estagiou três meses em garrafa. Foi aprovado como «Reserva», mas essa indicação não faz parte da marca, embora venha a indicação num selo à parte.

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Grão Vasco Prova Mestra 2013 – Foto Cedida por Sogrape SA | All Rights Reserved

É um vinho fácil, onde as violetas – típicas da touriga nacional neste que é o seu berço – e as amoras e framboesas se «juntam». Menos óbvias, notas de mentol e de caruma de pinheiro. Na boca é suave, com taninos domesticados e com final não muito longo.

Já que escrevo acerca do Dão, não posso esquecer dois factos importantes. Um, mais conhecido do público, é o Queijo da Serra – o mais afamado cincho português. A outra referência é a obra do pintor Grão Vasco.

Portugal, pela sua situação periférica, as artes chegaram com atraso. Quando a Europa construía catedrais góticas, por cá ainda se erguiam igrejas em românico ou num género híbrido. Contudo, o caso de Vasco Fernandes, conhecido por Grão Vasco e que muitas vezes assinava como Velasco, é diferente.

Nasceu provavelmente em 1475, talvez em Viseu, e faleceu em 1542. Foi discípulo de Francisco Henriques, pintor flamengo, oriundo de Bruges. O facto de, à época, se traduzirem os nomes, ficou o registo dado nesse tempo.

A pintura de Vasco Fernandes pode ser considerada ainda como gótica, mas num período muito tardio, em que os avanços técnicos e «o gosto» do Renascentismo já se mostram.

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Retábulo de São Pedro in wikipédia

Quem se passeie pelo Dão não perca uma visita ao Museu Nacional Grão Vasco, em Viseu, onde está um magnífico retábulo de São Pedro, originalmente colocado na Sé. Em Coimbra existe uma obra acerca do Pentecostes, no Mosteiro de Santa Cruz – onde está também o túmulo do primeiro Rei de Portugal, Dom Afonso Henriques. Em Lisboa, há que ver no Museu Nacional de Arte Antiga.

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Obra acerca do Pentacostes, no Mosteiro de Santa Cruz in wikipédia

Quanto ao vinho, causa primária do texto, é uma aposta segura para quem aprecia o Dão. Não é estratosférico, mas também não é meramente mediano. A mediania cansa-me, mas este deu-me um prazer superior a esse patamar.

Quinta Vale D. Maria VVV Valleys e muita história

Texto João Barbosa

Ler nomes não portugueses em rótulos de Vinho do Porto é tão banal quanto um português chamar-se Silva ou Santos. Os van Zeller vivem há tantos anos em Portugal que o apelido se tornou tão português quanto o meu.

Contrariamente à maioria das famílias «estrangeiras», os van Zeller não eram comerciantes, mas nobres. O registo mais antigo dos Zeller data de 1215, na Guéldria (Países Baixos). O primeiro de que há registo em Portugal é João van Zeller, cônsul da Prússia em Lisboa e que se casou no Porto, em 1687.

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Quinta Vale D. Maria – Foto Cedida por Quinta Vale D. Maria | Todos os Direitos Reservados

Em 1780 foi fundada a Van Zeller’s & Co para negociar Vinho do Porto, sendo vendida no século XIX. A história dá muitas voltas e as marcas foram oferecidas, em 2006, a Cristiano van Zeller, o chefe.

O factor mais importante, a quinta pertencia à família de Joana van Zeller, tendo um seu trisavô feito registo em 1868, mas a posse é mais antiga – ligada à muito antiga nobreza rural, com vínculos que chegam a ser anteriores à independência de Portugal (século XII). O «modelo» português de uso de apelidos é tão rebuscado, que teria de escrever 20 parágrafos para explicar.

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Joana van Zeller – Foto Cedida por Quinta Vale D. Maria | Todos os Direitos Reservados

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Francisca van Zeller – Foto Cedida por Quinta Vale D. Maria | Todos os Direitos Reservados

Isto vem a propósito porque vinho sem história é uma coisa e com história é outra, muitas gerações de nobres e plebeus que construíram identidades únicas. Como dizem os vinhateiros Rothschild, no negócio do vinho, o mais difícil são os primeiros 150 anos.

São 12 referências, escolho cinco. Os CV (topo-de-gama), os VVV (novidade) e a Francisca. Situada em Sarzedinho, a propriedade chegou aos actuais proprietárias com apenas 19 hectares, dos quais dez com vinha, com 41 castas. Hoje são 45 hectares com Vitis vinífera, virados de Oeste a Este, passando por Sudoeste, Sul e Sueste. A enologia está a cargo de Cristiano van Zeller, Joana Pinhão e Sandra Tavares da Silva.

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Cristiano van Zeller – Foto Cedida por Quinta Vale D. Maria | Todos os Direitos Reservados

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Joana Pinhão – Foto Cedida por Quinta Vale D. Maria | Todos os Direitos Reservados

O CV Branco 2014 fez-se com umas duma só parcela, vinha velha situada a 600 metros de altitude, composta principalmente por rabigato, códega, donzelinho branco, gouveio, samarrinho e viosinho. É uma interessante junção de citrinos, algum anis, farmácia e terra, sendo volumoso e longo na boca.

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CV branco 2014 – Foto Cedida por Quinta Vale D. Maria | Todos os Direitos Reservados

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CV tinto 2014 – Foto Cedida por Quinta Vale D. Maria | Todos os Direitos Reservados

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Quinta Vale D. Maria Vinha da Francisca tinto 2013 – Foto Cedida por Quinta Vale D. Maria | Todos os Direitos Reservados

O CV Tinto 2013 é um lote de 25 castas, onde se destacam donzelinho tinto, rufete, sousão, tinta amarela, tinta francisca, tinta roriz, touriga franca e touriga nacional, de vinhas com mais de 80 anos. É muito complexo de aromas e paladares; desde flores, a frutos do bosque, menta, especiarias, fumo de lenha de azinheira, terra… um paladar repleto de subtilezas, fresco, com «carne», volumoso, denso, elegante – até contraditório nos perfumes e sabores. Majestoso.

Quinta Vale D. Maria Vinha da Francisca Tinto 2013 é o vinho da herdeira, saído da parcela plantada quando fez 18 anos, em 2004. São 4,5 hectares com tinta francisca, sousão, touriga franca, rufete e touriga nacional. Elegante como uma princesa – qualificação já atribuída à «morgada».

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Vale D. Maria VVV branco 2014 – Foto Cedida por Quinta Vale D. Maria | Todos os Direitos Reservados

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Vale D. Maria VVV tinto 2013 – Foto Cedida por Quinta Vale D. Maria | Todos os Direitos Reservados

Os triplo V: Vale do Rio Torto, Vale do Rio Pinhão e Vale do Rio Douro. Os três V, do numeral romano cinco, ilustram as 15 gerações de vinhateiros. O V que sempre identificou os melhores vinhos da família.

O Vale D. Maria VVV Valleys Branco 2014, castas não reveladas, é fresco e guloso, da fruta e da baunilha, na avaliação olfactiva. Longo e fundo na boca.

O Vale D. Maria VVV Valleys Tinto 2013, castas não reveladas, tem a gulodice da fruta vermelha e notas terrosas. É muito «fino», elegante e fundo.

V de vitórias!

Vinhos Foz Torto – tortos como os rios e as vides

Texto João Barbosa

Linhas direitas ou linhas tortas? Arquitectura modernista ou barroca? No que respeita a vinho, gosto deles tortos, porque complexos. Acontece nos vinhos Foz Torto, de Abílio Tavares da Silva, cuja enologia é de Sandra Tavares da Silva (não são familiares).

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Abílio Tavares da Silva e Sandra Tavares da Silva – Foto Cedida por Foz Torto | Todos os Direitos Reservados

Abílio Tavares da Silva, em 2004, deixou as suas empresas de informática, sediadas em Lisboa, e instalou-se no Douro. No ano seguinte comprou a Quinta de Foz Torto, junto à aldeia de Pinhão (sub-região de Cima Corgo), com 14 hectares. O Rio Torto é um pequeno curso fluvial, que nasce em Trancoso e desagua a pouco mais de 47,5 quilómetros, na margem esquerda do Douro.

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Quinta de Foz Torto – Foto Cedida por Foz Torto | Todos os Direitos Reservados

É na foz dessa serpente de água onde está a quinta, que desde 2012 se mostra aos enófilos. Naturalmente, o ponto-de-fuga da perspectiva está próximo, mas os sinais são positivos: a vontade de Abílio Tavares da Silva revela o objectivo de alcançar um patamar de grande qualidade, a boa localização da propriedade e a competência de Sandra Tavares da Silva.

Bem, nasceram direitos, os Foz Torto. As mais recentes novidades reveladas são Foz Torto Tinto 2013, Foz Torto Vinhas Velhas Tinto 2013 e Foz Torto Vinhas Velhas Branco 2014. Há um traço identitário e as obrigatórias diferenças, reflexos da vontade e da natureza.

As uvas para o vinho branco vêm doutra propriedade, a montante no Douro, situada em Porrais (Murça), nos limites da delimitação da região. São provenientes de vinhas, com castas misturadas, onde se destacam a códega de larinho e a rabigato.

As uvas brancas foram esmagadas em prensa pneumática. A fermentação realizou-se, durante quatro semanas, em barricas de carvalho francês, onde estagiou por seis meses. É fino, elegante, sedutor, com falsa doçura. Tem força, mas não brutalidade.

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Foz Torto Vinhas Velhas branco 2014 – Foto Cedida por Foz Torto | Todos os Direitos Reservados

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Foz Torto tinto 2013 – Foto Cedida por Foz Torto | Todos os Direitos Reservados

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Foz Torto Vinhas Velhas tinto 2013 – Foto Cedida por Foz Torto | Todos os Direitos Reservados

O Foz Torto Tinto 2013 resulta dum lote de touriga nacional (40%), touriga franca (30%), tinta francisca (10%), tinta roriz (5%), alicante bouschet (5%), sousão (5%) e tinta barroca (5%). A fermentação fez-se em cuba durante oito dias. Depois, o vinho esteve 16 meses em barricas de carvalho, de segundo e terceiros anos, onde fez a fermentação maloláctica e o estágio. É um vinho que enche a boca, com gulodice que não sacia nem enjoa, onde sobressaem aromas e sabores frutados temperados pela madeira.

O Foz Torto Tinto Vinhas Velhas Tinto 2013 está no grupo dos melhores do Douro, onde o termo «vinhas velhas» significa umas boas décadas e o número de castas é de difícil contagem. Aqui, estão mais de 30 variedades. A fermentação demorou oito dias em cuba. O vinho fez a fermentação malolactica e estagiou em barricas de carvalho novo (30%) e antigo (70%).

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Quinta de Foz Torto – Foto Cedida por Foz Torto | Todos os Direitos Reservados

A ficha técnica não diz, mas afirmo-o… reina a touriga franca e não a nacional. É a grande casta tinta do Douro, quiçá portuguesa, que só (ou quase) está bem quando acompanhada por outras. Este tinto tem a terra de xisto e o xisto, a secura da esteva e o perfume da cinza de madeira de azinheira. É volumoso na boca, longo e fundo, persistente. Para agora e para depois de amanhã. É o Douro dentro dum frasco.

Vinho novo ou vinho velho? Venha Deus ou o Diabo e escolham

Texto João Barbosa

Oiço com grande regularidade o elogio ao vinho com idade. Laudes que compreendo, pois sou dos que o apreciam com anos de vida. No entanto, o que me faz escrever é o ar pedante com que muitos enófilos assumem, dividindo o mundo em duas castas. Reconheço que muitos apreciadores têm agrado com néctares novos e antigos.

A verdade é que os vinhos antigos têm para mostrar o que os novos não conseguem… até porque os outros são bebidos novos. Não é uma injustiça, é a vida. Um dia disseram-me: «os vinhos são como as pessoas, uns evoluem e outros continuam estúpidos».

Um aforismo anedótico que tem o seu «quê» de acertado. Olhando para gente das artes cénicas – porque é mais fácil citar – podemos reparar como Lauren Bacall ou Sean Connery «melhoraram» com a idade.

A beleza arrebatadora desta actriz evoluiu para um charme e uma aura de Rainha. O caso de Sean Connery é mais óbvio. Achava-o um bocado canastrão, sem ser nem bonito nem feio, e hoje é um lorde.

Que podemos dizer de James Dean ou de Mia Zapata? Nunca saberemos, embora existam programas de computador que fazem antevisões. Não quero estar só a elogiar a idade mais avançada, apenas a enumerar situações.

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Vinho in wall.alphacoders.com

Há uma outra situação que é a do homicídio vínico. Abrem-se garrafas de vinho que poderia ganhar com os anos. Se o enófilo conseguir guardar algumas, não existe problema. Mas… mas, e se amanhã não estiver vivo? Ou o síndrome da criança no Natal. Ou a velocidade dos dias e a espécie de ejaculação precoce.

Falando com apreciadores não militantes, reparo que a maioria, a enorme maioria, afirma que gosta de beber o vinho enquanto é novo. Porquê? A maior facilidade é, provavelmente, a principal razão.

Outro motivo será o do gosto por educar. Mas quem me dá o direito de afirmar que alguém não tem o gosto educado? Gostos são gostos, discutem-se, mas têm de se respeitar. Conheço gente, com anos de prazer enófilo, que prefere incondicionalmente o vinho jovem.

George Bernard Shaw sentenciou: «A juventude é uma coisa maravilhosa, que pena ser desperdiçada pelos jovens».

Pelo que escrevi, nota-se que não irei até onde chega a deliciosa arrogância deste grande escritor. Gosto de vinho com idade e com juventude… mas…

Há sempre um mas! O vinho que não é jovem, mas criança –  aproveitando o chamado Verão de São Martinho, em Novembro. Há muitos adágios populares que elogiam os vinhos na infância:

– No São Martinho vai-se à adega e prova-se o vinho.

– Pão com olhos, queijo sem olhos e vinho que salte aos olhos.

– No dia de São Martinho, lume, castanhas e vinho.

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Vinho guardado in standardmarket.com

Estas certezas podem explicar-se pela antiga dificuldade, de antigamente, em guardar o vinho por muitos meses. Em novo estava «óptimo» e em Março ou em Abril, sabe-se lá. Essa realidade pode ter sido transmitida pelo ADN dos portugueses… sei lá!

Além de apreciar a juventude e a antiguidade, mais do que uma garantia acerca do que é correcto ou está errado, prefiro outro aforismo popular:

– Não se vai de smoking para a praia.

Ninguém me tira o «Anjo Azul», dirigido por Josef von Sternberg em 1930, com Marlene Dietrich. Nem as gargalhadas que dei com as «Manobras na Casa Branca», de 1997 e hoje é comédia, de Barry Levinson, com Robert De Niro e Dustin Hoffman.

Vinhos Passagem – para lá do rio

Texto João Barbosa

Portugal tem a sorte de ter duas regiões vinícolas de excelência! Madeira e Douro/Porto, de grande classe mundial. O que é notável num país com 92.000 quilómetros quadrados. O Douro é maravilhoso porque nele se consegue fazer «tudo».

Atravessar um rio não é coisa pouca.

As fronteiras são linhas imaginadas, são fabricadas. Não é absoluto, pois montanhas e rios teimam na «imperfeição geométrica» – sobretudo nos «velhos mundos». Não é por acaso que muitas cidades, regiões ou países têm nome de rios, ou deles derivados ou ligados.

Na mitologia grega clássica, os mortos iam para o Hades (Inferno) através do rio Aquaronte. Os rios (água) são sagrados em muitas culturas ancestrais. É disso que se trata.

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Quinta das Bandeiras – Foto Cedida por Passagem Wines | Todos os Direitos Reservados

A Quinta das Bandeiras situa-se no Douro Superior, junto à aldeia de Pocinho, na margem direita do segundo maior rio a passar em Portugal. Do outro lado fica a Quinta do Vale Meão. Provem-se os vinhos e perceber-se-á como uma linha de água (nem muito larga) pode ser uma fronteira, é facto.

Claro que existe diferente exposição solar e etcetera-e-tal, em que a características do solo são cruciais. A questão da enologia: quem os faz teima (ainda bem) em tirar partido dos factores diferenciadores. Há a Quinta de La Rosa, a Real Companhia Velha e os vinhos Passagem sãoPassagem. Pretendo que seja lido como um grande elogio.

O enólogo Jorge Moreira partilha, em parte igual, a Quinta das Bandeiras com Sophia Bergqvist, que encabeça a Quinta de La Rosa, junto ao Pinhão. Gente irrequieta, que não está satisfeita com o que tem e que não quer mais do mesmo.

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Quinta das Bandeiras – Foto Cedida por Passagem Wines | Todos os Direitos Reservados

Para mim, o factor «homem» integra o terroir. Posto isto, digo que a aposta foi ganha. Acrescento que existe uma outra fronteira (clara, para mim) entre «qualidade» e «gosto». Enquanto cronista de vinho tenho a obrigação da imparcialidade – não confundir com ausência de opinião. Como enófilo, não são vinhos que me preencham. Por nenhuma razão em especial, apenas «gosto».

Cada qual com seu nariz e boca e não recuso recomendação. Quem gosta de vinho e quem gosta do Douro tem a «obrigação» de conhecer os vinhos Passagem. Ora vamos a eles:

Passagem Vinho Branco Reserva 2014 fez-se com «muitas uvas», sobretudo viosinho, gouveio, rabigato e códega do larinho, numa altitude de 400 metros. Com boa acidez, pede comida.

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Passagem Vinho Branco Reserva 2014 – Foto Cedida por Passagem Wines | Todos os Direitos Reservados

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Passagem Vinho Tinto Reserva 2013 – Foto Cedida por Passagem Wines | Todos os Direitos Reservados

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Passagem Porto Vintage 2011 – Foto Cedida por Passagem Wines | Todos os Direitos Reservados

O Passagem Vinho Tinto Reserva 2013 alinha na frescura do seu irmão branco, tendo vivido 18 meses em barricas de carvalho francês. As castas são touriga nacional (70%), touriga franca (25%) e sousão (5%). Reportando-me ao «meu gosto»: Não sou enólogo, mas às vezes arrisco umas coisas de alquimia: tem demasiada touriga nacional, falta-lhe touriga franca e o sousão é casta que não aprecio.

Mais prazenteiro (meu gosto) é o Passagem Porto Vintage 2011, feito à base das duas tourigas, a percentagem não foi revelada. Sendo objectivo: é um vintage com identidade e que «não é mais um do frasco», citando José Mourinho. O fantástico ano de 2011 foi bem surfado.

Acrescento um «vale a pena»: está fora da banda espectral duriense, mas continua a ter em si o Douro. É diferente, mas é Douro.

Contactos
Passagem Wines
Tel: (+351) 254 732 254
Email: mail@passagemwines.com
Website: passagemwines.com

Real Companhia Velha – Velhos são os trapos…

Texto João Barbosa

Cumpri e terminei com a palavra terroir. Agora prometo finalizar com um brinde. Tanta coisa acontece 250 anos. Por várias vezes mudou a lei, aumentou a área da região vitivinícola, surgiram e morreram grandes figuras… a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro há muito que mudou de natureza, é um operador comercial e produtor.

Ganhou a alcunha de Real Companhia Velha e para que dúvidas não restassem ainda comprou a Real Vinícola, empresa cuja designação baralhava. Todavia, uma boa aquisição, que abriu negócios à casa e acrescentou marcas hoje históricas.

Em 1960, Manuel Silva Reis comprou a companhia, que se mantém na família. Pertencem-lhe cinco quintas (Arciprestes, Carvalhas, Casal da Granja, Cidrô e Síbio) que totalizam 540 hectares de vinha. Embora seja uma das maiores empresas portuguesas do sector, a Real Companhia Velha ainda não saiu de casa, produzindo vinhos Douro, Porto, Moscatel do Douro e Regional Duriense.

Sou conservador e de engenhocas gosto pouco. Parar é morrer e uma coisa é a tradição e outra a «invenção» – o que não é antagónico ou contraditório. O Douro está bem e tão bem e seguro que não vejo as experiências como sendo uma ameaça. Eu, conservador que não gosta de engenhocas, rendi-me a essa inovação do colheita tardia feito no Douro!… O primeiro foi em 1912, pela Real Vinícola.

Em Cidrô plantaram-se castas estrangeiras e estuda-se, é uma quinta de ensaios. Um dia foi chamado um técnico para certificar uma vinha nova, plantas compradas em França da casta semillon. Mas deu-lhe o nome de boal. Como boal?! Ali à volta, naquelas aldeias, o povo até lhe chama semilhão…

Por que é que não me indigno? Com o Grandjó Late Harvest ou com as maquinações que se realizam na Quinta de Cidrô? Porque sinto a segurança de quem está para construir e não para fazer só por fazer. Porque os Grandjó Late Harvest são – sou peremptório – os melhores vinhos de colheita tardia feitos em Portugal.

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Grandjó Late Harvest in realcompanhiavelha.pt

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Real Companhia Velha Logo in realcompanhiavelha.pt

Quem conhece os técnicos da Real Companhia Velha sente segurança e respeito pela região. Como se estivesse a viajar numa autoestrada a 400 quilómetros por hora, num Bugatti Veyron conduzido por Niki Lauda.

Este conjunto de artigos acerca da Real Companhia Velha foram pensados para saírem em Setembro, para assinalar o aniversário… 259 anos! Porém, tenho mais vinho do que dias, que gostaria tivessem 48 horas.

Three texts have many words (you can read part 1 here and part 2 here),

Três textos têm muitas palavras (pode ler a parte 1 aqui e a parte 2 aqui), mas tudo começou com uma ideia retorcida de ironia… a disputa pela maior antiguidade da demarcação… Tokaji (Tokay) dos magníficos vinhos com Botrytis cinerea – garantem que aí foram criados pela primeira vez – e o Douro, com o seu Grandjó.

O marquês de Pombal nunca o deve ter tido em mente, nem mesmo no tédio das viagens desde a Panónia até à Lusitânia, onde cogitou acerca de vinho da Galécia. Brindo a esses dois vinhos e também ao homem que não queria ter como inimigo. À saúde e que venham mais 259 anos!

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Real Companhia Velha – Como o Douro chegou ao Tejo

Texto João Barbosa

Não poderei ser político! Cumpri o prometido… Escrevi «terroir». E porquê? Porque ingleses e franceses andavam novamente às cabeçadas e o vinho do Douro tinha a qualidade que as gargantas insulares exigiam. Sebastião de Carvalho e Melo sabia da qualidade dos vinhos com uma origem específica, por isso demarcou o sítio.

Ainda é preciso recorrer à história e mais uma vez prometo terminar um texto com «terroir». Este conceito é normalmente atribuído a França. Mas isso é uma ilusão, derivada da criação do vocábulo. Ao longo da história sempre se identificaram locais especiais para a produção de vinho. Um dia, alguém lembrou-se de escrever uma lei para que tal ficasse defendido.

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Douro © Blend All About Wine, Lda

Dizem os portugueses que a primeira região demarcada do mundo é a do Douro, através do alvará régio de 10 de Setembro de 1756, redigido por Sebastião de Carvalho e Melo.

Os italianos argumentam que Chianti é que foi a primeira delimitação, datando de 1716. Por seu lado, húngaros e eslovacos contrapõem que foi Tokaji (Tokay), em 1730. Há argumentos para tudo e os portugueses defendem-se com a especificação pormenorizada e colocação de marcos de pedra.

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Chianti Region in wikipédia.com

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Tokaj Region in wikipédia.com

Ainda assim, a ideia deve ter-lhe ocorrido por causa do tempo em que foi embaixador em Viena. O Sacro Império Romano-Germânico foi um Estado sui generis, formado por uma multiplicidade de países, com graus variados de independência e de monarcas. À data da sua extinção, em 1806, era formado por mais de 400! A Toscânia pertencia ao imperador e fazia parte do «Consórcio». A imperatriz era arquiduquesa de Áustria, país integrante do império, e rainha da Hungria, que ficava de fora desse organismo político.

A Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro (Real Companhia Velha) tinha várias funções, desde a instituição, regulamentação, policiamento, exercício de justiça, monopolista da venda… Para defender a região e a autenticidade dos seus vinhos, Sebastião de Carvalho e Melo mandou arrancar vinhas de várias zonas do país.

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Real Companhia Velha logo in realcompanhiavelha.pt

Como tudo o que tem valor é imitado (falsificado), houve cedo a tentação de inventar vinho que não existia. Nas adulterações recorriam a bagas de sabugueiro para tingir o líquido. Assim, o governante decretou que fossem arrancados todos os arbustos que ficassem a menos de cinco léguas (portuguesas) da demarcação.

Curiosamente, existem ainda hoje arbustos a cerca de 33 quilómetros da região – porém, não há vinha. Estavam na fronteira, no limite da legalidade. Quer isto dizer que o vinho do Douro continuou a ser pintado, apesar da proibição. Há pouco tempo escrevi, para a Vida Rural, um artigo sobre Sambucus nigra, planta com inúmeras utilizações, mas que não se dá atenção merecida; os 700 hectares que existem no país representam cerca de 2,2 milhões de euros.

Sebastião de Carvalho e Melo foi um homem do seu tempo. Esclarecido e déspota. Perseguiu e quase exterminou a família dos marqueses de Távora, seus adversários. Citação ilustre acabada de inventar:

– Se serves o Estado e não te serves, não mereces tal estado!

O homem que seria agraciado com o título de conde de Oeiras, em 1759, e marquês de Pombal, em 1769, não deixou de ganhar dinheiro duma forma à época vista com benevolência. Da sua quinta em Oeiras saíram muitas pipas de «vinho do Douro», tal como doutras suas propriedades.

Quando o terroir do Douro tinha características da luz forte do mar próximo de Lisboa, de salinidade e de terra calcária ou barrenta. Terroir…

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Real Companhia Velha, tão velha que há tanto… – Parte 1

Texto João Barbosa

Há empresas que têm tanta história que lhe parecem faltar anos para encaixar tanto que há para saber. É o caso da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro (Real Companhia Velha), criada em 1756. Muito por causa de quem a instituiu. Antes do vinho, vem a história.

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Real Companhia Velha logo in realcompanhiavelha.pt

Há pessoas à frente do seu tempo e, dentre elas, algumas tornam-se maiores do que o tempo. Este privilégio é concedido aos heróis – há também canalhas, mas não são celebrados. É o caso de Sebastião José de Carvalho e Melo.

Calma! Tem mesmo de ser! Prometo terminar o texto com a palavra terroir. Para já, faz de conta que é Setembro – no terceiro capítulo explico.

Nasceu em Lisboa a 13 de Maio de 1699, no seio duma família da baixa nobreza. Nem sequer é claro se chegava a ser morgado ou se o brasão era, de facto, o da sua família – consta que se extinguira e o nosso homem aproveitou a oportunidade para dar uso ao apelido, que era o mesmo e até trocou as suas armas heráldicas. Porém, assumiu em vida esse título e respectivo escudo de Carvalho. Não tinha direito ao uso de «Dom» antes do nome… nem mesmo quando subiu na hierarquia social se refere tal privilégio.

Em 1723 casou-se com Teresa de Noronha e Bourbon Mendonça e Almada. Deu um salto na escala social… mas teve de raptar a noiva, pois à família da senhora parecia-lhe de muito baixa condição… embora fidalgo.

Peripécias importantes na vida dum homem comum, mas quase indiferentes na dum dos maiores estadistas portugueses e europeus. Sebastião de Carvalho e Melo foi soldado e diplomata.

Sebastião de Carvalho e Melo ascendeu a embaixador em 1738, em Londres. Terá sido por aí que terá começado a conhecer a alta-roda europeia. A 14 de Setembro de 1744 «comprou o bilhete premiado do Euromilhões» – tomou posse como embaixador em Viena.

O prémio traduziu-se no casamento, a 13 de Dezembro de 1745, com a condessa Maria Leonor Ernestina Daun. Através dela chegou à arquiduquesa de Áustria, Maria Teresa, chefe da Casa de Habsburgo, casada com Francisco de Lorena, Imperador do Sacro Império Romano-Germânico.

Maria Teresa de Áustria é uma das grandes figuras do Despotismo Esclarecido e era sobrinha-neta da Rainha de Portugal… Com a morte de Dom João V e a ascensão de Dom José, Sebastião de Carvalho e Melo sobe até onde podia alguém: secretário de Estado, correspondente ao actual cargo de primeiro-ministro.

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Dom João V, pintado por Miguel António do Amaral

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Dom José, pintado por Miguel António do Amaral

Por volta das 9h30 da manhã de 1 de Novembro de 1755 a terra tremeu. Com epicentro Sudoeste do Cabo de São Vicente, um terramoto de grau nove na Escala aberta de Richter (cálculo) devassou o Sul do país e arrasou Lisboa. Como se não bastasse, e além das réplicas, ergueu-se um maremoto, com ondas que talvez tenham chegado aos 20 metros, e um incêndio que durou dias.

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Terramoto de 1755, Lisboa

A Lisboa vieram grandes figuras do iluminismo. Voltaire muito se impressionou com o estado da outrora rica e orgulhosa capital portuguesa, das maiores e imponentes do seu tempo.

O Paço da Ribeira veio abaixo, tal como o novíssimo teatro da ópera, logo ao lado e inaugurado seis meses antes. Decretou o secretário de Estado:

– Enterrai os mortos e cuidai dos vivos!

Sebastião de Carvalho decidiu-se pela modernidade, desde o modo construtivo dos edifícios, à largura das ruas e do seu traçado ortogonal. Mas não se ficou por Lisboa, pois um ano depois fundou uma empresa emblemática e assente num conceito inovador: terroir.

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Quinta do Monte Xisto, vinho de poucas palavras… aliás, muitas

Texto João Barbosa

Quando se escreve acerca de famílias como a Nicolau de Almeida o que se pode fazer? Redigir um texto como as do ensino básico, onde está tudo e certinho? Afirmar que «não há palavras»… e se não as há, não existe que se leia. Ou… ultrapassar a dimensão convencional? Nesta última, para comprimir, podem suprimir-se as vogais ou tirarem-se as consoantes.

Fora de brincadeira, porque o assunto é sério. A família Nicolau de Almeida é tradicional do Douro e do Porto. António Nicolau de Almeida foi o primeiro presidente do Futebol Clube do Porto (Foot-Ball Club do Porto), em 1893, quando o desporto era praticado por sportmen, como na época se dizia. Cavalheiros e operários jogavam em pé de igualdade, verdadeiro desportivismo.

O pai de João Nicolau de Almeida foi o criador do Barca Velha. É uma família ligada à firma Ramos Pinto, que cedo apostou em publicidade, recorrendo aos mais consagrados artistas gráficos do seu tempo, como René Vincent.

Mais recentemente, na década de 70, José Pinto Rosas, com o sobrinho João Nicolau de Almeida, procurou uma propriedade com características especiais e encontrou a Ervamoira. Os dois fizeram também um estudo acerca das melhores castas da região.

Feito o enquadramento, o que se pode dizer do Monte Xisto? O tempo avança e João Nicolau de Almeida reformou-se da Ramos Pinto, que é hoje pertença à Roederer. Procurou uma terra óptima para cultivar a vinha.

Em 1993 encontrou o sítio, no Douro Superior. Um monte sem nada, mas com vários donos. Foi comprando a colina e tomou-a toda. Será perfeita? Um cerro tem vantagens: diferentes altitudes, diversas exposições solares, várias climatologias, dando espaço ao plantio de castas diferentes – ajudas preciosas para a produção de vinhos complexos.

Que nome dar ao domínio? Monte Xisto – xisto a pedra do Douro, parte fundamental do carácter, e monte, porque é um monte. A solução mais simples tende a ser a melhor.

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Quinta do Monte Xisto tinto 2013

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Maria Sottomayor – Quinta Monte Xisto

Toda a família está envolvida e na enologia há três técnicos reconhecidos: o patriarca e os filhos João e Mateus. Recentemente juntou-se a nora Maria Sottomayor, artista plástica e que trabalhou «às cegas», tendo apenas o vinho pela frente, na ilustração do material da empresa.

Veio agora o Quinta do Monte Xisto 2013, feito com uvas de touriga nacional (60%), touriga francesa (touriga franca – 35%) e sousão (5%), colhidas no início de Setembro e que juntas somam 14 graus de álcool – perigosíssimos, porque a natureza deu a acidez que os refresca.

O cultivo é em modo biológico e as leveduras são autóctones, que trabalharam durante seis dias. Fruta pisada a pé em lagares, como manda a tradição. O vinho estagiou 18 meses em barricas de carvalho francês, de 600 litros.

Qual o resultado? Um vinho para poucas palavras ou para muitas. Aroma guloso, complexo, que cresce e evolui com o tempo. Taninos com raça e sem agressividade, volume de boca de aplaudir, longo, fundo… «escuro», fresco e quente. Totalmente Douro, sem margem para equívoco.

O Monte Xisto nasceu grande em 2011, ano para celebrar. Confirmou a qualidade do sítio e a competência da família. Como no poker: arrisco tudo, fico na cave. É já uma grande referência do Douro.

Fonseca Guimaraens Vintage 2013 e 200 anos de história

Texto João Barbosa

A paz chegou à Europa a 18 de Junho de 1815, após Napoleão ter sido derrotado, na Batalha de Waterloo, por Arthur Wellesley. O imperador foi mandado para a ilha de Santa Helena, a meio do Atlântico Sul… ali não gozou das facilidades do cativeiro da ilha de Elba, donde se evadira para retomar a guerra.

O imperador viveu apavorado com a hipótese de ser envenenado…  sempre ouvi dizer que a cozinha francesa é sublime e que a inglesa é defeituosa – não tomo partido. Tanto receio que nem tocou no Vinho da Madeira que o cônsul britânico lhe ofereceu, quando o navio do presidiário escalou o Funchal… mas acho que foi por chauvinismo que não o bebeu.

Como no fim de todas as guerras, a sociedade encontrava-se desarrumada, muitas incertezas e oportunidades. A 8 de Abril de 1815, João dos Santos Fonseca comprou 32 pipas de vinho. Para celebrar o bicentenário, foi lançado um Porto Crusted, vinho de lote de diferentes vintages.

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Bicentenary Edition Crusted Port – Foto Cedida por Fonseca Port Wine | Todos os Direitos Reservados

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The Fladgate Partnership – Foto Cedida por Fonseca Port Wine | Todos os Direitos Reservados

O risco foi grande, pois ainda se combatia além Pirinéus. O senhor Fonseca foi financiado pela família Monteiro. Mais tarde entraram os Guimaraens e os Yeatman. Este agregado geriu a casa chegou até hoje, sendo Alistair Robertson o chefe da casa, descendente Yeatman.

Há «coisas» que evocam esse tempo, como o Monumento à Guerra Peninsular, na Avenida da Boavista, no Porto, em que o leão inglês subjuga a águia imperial francesa – mas trata-se duma peça pensada em 1909 e só concretizada em 1951.

Os exércitos francês e espanhol invadiram Portugal em 1807. Os franceses regressaram em 1808 e 1810. O conflito na Península Ibérica terminou em 1814, após a Guerra da Independência Espanhola.

Em Lisboa, a invasão teve consequências de longo prazo. O Terramoto de 1755 destruíra o palácio real. Na colina da Ajuda ergueu-se uma casa temporária, a Real Barraca ou Paço de Madeira. A chegada dos franceses levou à fuga da família real para o Brasil, a 29 de Novembro de 1807. Quando retornou, em 1821, o mundo tinha mudado.

O rei Dom João VI, embora não tenha vivido o Terramoto de 1755, nasceu em 1767, vivia apavorado com abalos sísmicos, pelo que continuou a viver na barraca. Após um incêndio, o Palácio da Ajuda foi começado em 1795, mas nunca se completou (cerca de um quarto está construído), porque a independência do Brasil, em 1822, fechou a torneira donde brotava ouro como água; já não havia como pagar para acabar a casa.

Voltando aos Fonseca… o primeiro Vintage foi em 1840, década doutros néctares com o mesmo estatuto. A casa da família situava-se no Pinhão e é hoje o Vintage House Hotel. Em Outubro deste ano, a The Fladgate Partnership (Fonseca, Taylor’s, CroftWiese & Krohn) comprou o hotel. A casa regressa a casa.

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Vintage House Hotel – Foto Cedida por Fonseca Port Wine | Todos os Direitos Reservados

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Fonseca Guimaraens Vintage Port 2013 – Foto Cedida por Fonseca Port Wine | Todos os Direitos Reservados

Este ano foi lançado o Fonseca Guimaraens Vintage 2013. Esta designação surge em anos que não são considerados clássicos. Produzido à base de uvas da Quinta do Panascal, está guloso, complexo de frutas em geleias, mirtilos e amoras assaltam, e muito suave.

Pede uma musse de chocolate com dois dias, um deles guardado no congelador. Bebê-lo agora contenta-me o coração, mas pica-me na mente. Guarda-lo e esperar… o meu coração pode não aguentar.

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